Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, setembro 20, 2006

O rastro do crime



editorial
Correio Braziliense
20/9/2006

Uma das principais obras da literatura mundial é Crime e castigo, do russo Fiódor Dostoiévski, cujo protagonista é um jovem estudante pobre e angustiado, que ambiciona ser alguém melhor e fazer algo importante na vida. Nesse afã, o personagem planeja a morte de uma agiota e, ao fugir da cena do crime, levado apenas pela surpresa, mata a irmã da velha usurária que havia testemunhado sua ação. Rouba jóias da vítima, mas, arrependido, enterra-as sob uma pedra. O romance mostra o drama psicológico do autor do homicídio, seu sofrimento e arrependimento.

A trajetória de alguns dirigentes e militantes do PT no poder, desde Santo André, parece um drama de Dostoéivski. É impressionante a sucessão de crimes em que o partido teve quadros envolvidos, inclusive um homicídio: o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel, coordenador do programa de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha de 2002. Desde então, esqueletos se acumulam nos armários do PT.

O caso da hora é o de Freud Godoy, assessor especial do presidente Lula, que, na segunda-feira, pediu afastamento temporário do cargo. Espécie de pau para toda obra, Godoy trabalhou como chefe da segurança pessoal de Lula em todas as campanhas eleitorais e freqüentava o gabinete presidencial no Palácio do Planalto, a Granja do Torto e o Palácio da Alvorada. É suspeito de ser o responsável pela operação de compra do dossiê Vedoin contra candidatos tucanos ao governo de São Paulo, José Serra, e à Presidência da República, Geraldo Alckmin.

Dois funcionários da campanha de reeleição de Lula foram presos em flagrante pela Polícia Federal com R$ 1,7 milhão, que seriam utilizados na compra do dossiê. Godoy admite que tenha se encontrado com um dos funcionários apanhados em flagrante, na sede da Executiva Nacional do PT, mas alega que discutiam a contratação de uma empresa de segurança para a campanha. Até agora, não se sabe exatamente qual foi o seu papel na montagem da operação. Porém, está comprovado que os demais participantes integravam um núcleo de segurança e informações da cúpula petista. O presidente Lula, que teme ser envolvido no caso, manifestou surpresa e descontentamento com o episódio. O presidente do PT, Ricardo Berzoini, desautorizou a ação dos subordinados.

O fato, porém, é grave. Atenta contra a democracia, pois revela que métodos criminosos estão sendo utilizados na campanha eleitoral. E dá a impressão de que o PT é partido para o qual os fins justificam os meios, quaisquer que sejam. No episódio em questão, a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça Eleitoral têm a obrigação republicana de desvendar o caso. Não constitui missão impossível. Basta refazer os passos dos envolvidos e descobrir a origem do dinheiro apreendido. Todo crime tem motivação e deixa rastro.

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