Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, julho 03, 2006

Sabor de aventura

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Sabor de aventura

Os Sem-Floresta, um desenho que
não é esterilizado nem desnatado


Isabela Boscov

 

Divulgação
O guaxinim e seus amigos bagunçam o condomínio: loucos por calorias vazias


Fanático pelo salgadinho Batatitas, um guaxinim arranja confusão com um urso grande e malvado, que lhe dá uma semana para repor todos os seus estoques roubados. R.J., o guaxinim, arruma então um jeito de cair nas graças de um grupo de amigos – um jabuti, alguns porcos-espinhos, uma gambá e assim por diante – cuja especialidade é juntar comida para a época da hibernação. Sua idéia é se valer do fato de que os amigos estão aturdidos: ao saírem do sono de inverno, encontraram sua floresta reduzida a um trecho minguado, fechada por uma cerca viva e rodeada de todos os lados por um imenso condomínio suburbano. R.J. vicia suas vítimas em junk food e então mostra a elas o paraíso que está além da cerca: centenas de quintais, cozinhas e despensas abarrotados de refrigerantes, biscoitos, frituras e tudo o mais que possa conter calorias vazias. R.J. vai ensiná-los a roubar esses tesouros e então entregá-los ao urso, salvando assim a sua pele. Ou esse é o plano – o que, no delicioso Os Sem-Floresta (Over the Hedge, Estados Unidos, 2006), que estréia nesta sexta-feira no país, não quer dizer muita coisa. Do lado de lá da cerca existem não só delícias, mas também um tipo peculiar de predador: seres humanos gigantescos e truculentos, que rodam em caminhonetes colossais, gritam em telefones celulares e dão vassouradas em toda forma de vida não aprovada pelo estatuto do condomínio. Como nos geniais desenhos que o veterano Chuck Jones fazia para a Warner ou nos primeiros curtas-metragens da Pixar, a graça da nova animação da DreamWorks está no pesadelo.

O humor caótico e irreverente de Os Sem-Floresta, porém, não é gratuito. Se há uma coisa que os diretores Tim Johnson (de Formigaz) e Karey Kirkpatrick (roteirista de O Pequeno Vampiro) parecem compreender é o medo dos pequenos diante dos grandes e a insegurança que suas regras misteriosas provocam. Este é genuinamente um desenho para crianças, que fala de forma direta às suas inquietações – o que só torna mais imediata também sua capacidade de falar aos espectadores adultos. Essa é, enfim, a melhor lição que se pode tirar de Os Sem-Floresta. Quanto mais os estúdios de animação procuram talhar seus produtos de acordo com fórmulas preconcebidas para a faixa etária-alvo, mais desnatados, esterilizados e homogêneos eles resultam. Nada como a originalidade e o espírito de aventura de Os Sem-Floresta para treinar o paladar a reconhecer, e apreciar, outros sabores.

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