Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 15, 2006

O que ninguém viu...


...na Copa que todo mundo viu

VEJA

Desfeito o sonho coletivo de ver a seleção brasileira jogar bola na Alemanha, vale a pena refletir sobre os avanços tecnológicos invisíveis que saltarão dos estádios para a vida cotidiana


Ethevaldo Siqueira, de Munique

 

Eckehard Schulz/AP
Telão gigante: hoje, de alta definição; no futuro, com imagens holográficas

Terminou a Copa Digital. Pela primeira vez, uma competição desse porte utilizou ingressos infalsificáveis, com chip embutido – infelizmente ainda não a salvo de cambistas. Suas imagens foram captadas por 25 câmeras digitais, para mostrar todos os ângulos possíveis do jogo, do ambiente e da torcida. Redes de banda larga interligaram celulares, câmeras fotográficas e laptops de milhares de jornalistas. Bolas especiais com chip embutido orientavam as câmeras-robôs suspensas nos pontos mais elevados. Pela primeira vez, a cobertura de um grande evento mundial utilizou a internet à velocidade de 10 gigabits/segundo (ou 10 bilhões de bits por segundo – dez vezes mais que as velocidades reais obtidas nas residências hoje). Essas redes interligaram as maiores cidades da Alemanha durante os jogos. Nas partidas noturnas, foram testados os primeiros holofotes de alta luminosidade de luz digital fria, de LED (diodos emissores de luz), que economizam 90% de energia. Em síntese, nunca se utilizou uma infra-estrutura tão complexa e avançada para a cobertura de um grande evento como na Copa de 2006. Incluía rede de 5 600 quilômetros de cabos de fibras ópticas, mais de 1 000 centrais telefônicas com tecnologia IP da internet, 450 centrais de telefonia celular, 1 200 estações radiobase e 5 000 computadores, conectando setenta locais, inclusive os doze estádios utilizados, seus centros de mídia e o quartel-general da Fifa em Berlim. Quando se admira a perfeição do planejamento da Copa, pouca gente se dá conta do papel dessa tecnologia. Ela foi vital para o sucesso dos jogos. Não apenas nos gramados.

A segurança foi uma obsessão nesta Copa, nos estádios e nas dezenas de hotéis em que se hospedaram as delegações de 32 países. Esses locais foram protegidos por centenas de radares e sistemas de vigilância espalhados em edifícios e por balões capazes de identificar com a maior rapidez qualquer ameaça ou tentativa de ataque terrorista. As pessoas que entravam em suas instalações de comunicação e de controle eram submetidas a uma revista mais rigorosa que a dos passageiros nos aeroportos, por meio de detectores de metal, explosivos e tóxicos. Os crachás de acesso a qualquer área interna podiam ser lidos a distância por sistemas de radiofreqüência RFID (Radio Frequency Identification Device). Tudo funcionou com perfeição e não se ouviu falar de nenhuma tentativa ou ameaça.

 

Valery Hache/AFP
Armando Franca/AP
Iluminação fria feita com diodos de efeito luminoso (à esq.) e robô vigia (à dir.): a Alemanha sediou a primeira Copa Digital

Se, por acidente ou por ação criminosa, um cabo ou uma fibra óptica se rompesse, a transmissão não seria afetada, pois os sinais passariam a circular automaticamente por fibras alternativas. Mesmo que um criminoso ou terrorista cortasse os dois cabos, nem assim o programa seria interrompido. Nessa trágica eventualidade, a transmissão passaria a ser feita via satélite. Tudo sem que o espectador percebesse qualquer mudança.

O arsenal da Copa do Mundo de 2006 tinha de estar à altura das dimensões desse evento – sem dúvida, o maior espetáculo de comunicação de massa da história da humanidade. Os jogos mais esperados foram vistos por uma platéia de mais de 3,5 bilhões de pessoas em todo o mundo. Mas um grande e decisivo espetáculo da Copa da Alemanha se desenvolveu longe dos olhos dos espectadores: a batalha da tecnologia, com o máximo de inovação em comunicação, em computação e em convergência digital. Essa tecnologia exigiu uma participação humana recorde de 5.000 técnicos e engenheiros. Eles trabalharam durante meses, antes e durante o evento. Tudo para que cada telespectador tivesse a melhor imagem e o melhor som de cada partida.

A Fifa começou a preparar a cobertura da Copa de 2006 há quatro anos, escolhendo uma entre as empresas que se julgavam aptas para um conjunto de tarefas, que incluía planejamento, projeto, preparação e operação da logística, coordenação, telecomunicações e segurança do evento. Num passado recente, o mundo não dispunha de nenhuma companhia que pudesse assumir a responsabilidade por uma megaoperação dessa natureza. Em um processo de licitação internacional, conduzido pela entidade, a Avaya foi escolhida como a empresa responsável por todas as telecomunicações e pela coordenação técnica da Copa, com o apoio da Toshiba, da T-Com/ T-Mobile (Deutsche Telekom) e da Yahoo!. Para ganhar visibilidade em todo o mundo, a Avaya decidiu ser também uma das patrocinadoras oficiais da Copa da Alemanha, com o pagamento de 100 milhões de dólares à Fifa.

À Yahoo! coube a tarefa de produzir e distribuir informações, pesquisas históricas e estatísticas completas dos jogos para a mídia e todos os participantes da Copa. Graças ao seu trabalho, os telespectadores ficavam sabendo, no meio da narração de uma partida, pormenores do retrospecto de cada seleção, treinador ou jogador, como por exemplo o número de gols, o desempenho em outras Copas e até a data e o local de nascimento de Juninho Pernambucano ou Deco, o brasileiro naturalizado da seleção de Portugal.

Essas novas tecnologias permitiram, por exemplo, que os fotógrafos enviassem suas fotos diretamente do campo de futebol às redações, localizadas em qualquer ponto do planeta, graças à rede local sem fio de banda larga com acesso à internet de alta velocidade. A quantidade de informações processadas e transmitidas ao longo desta Copa foi da ordem de 15 terabytes (15 trilhões de bytes), envolvendo voz, dados e imagens – o que equivale ao conteúdo de mais de 100 milhões de livros, ou ainda ao armazenamento de documentos que fariam uma pilha 240 vezes mais alta que o Empire State Building, de Nova York.

Nas regiões do mundo em que a TV digital já chegou – como Europa, Estados Unidos e Japão –, a recepção de imagens da Copa foi um espetáculo novo, com qualidade e recursos de interatividade que não existiam nas coberturas de TV do passado. Embora a televisão digital ainda não tenha chegado ao Brasil, centenas de pessoas viram em um projeto conjunto da Band, da TVA – que pertence ao Grupo Abril, que edita VEJA – e da Gradiente, em São Paulo, os jogos com imagens de alta definição, formadas por 1.080 linhas e 1,8 milhão de pixels, com a tecnologia digital européia (DVB). Foi um saboroso aperitivo para o que virá em 2010, 2014, 2018...

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