Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, julho 13, 2006

Míriam Leitão - Câmbio flexível

Panorama Econômico
O Globo
13/7/2006

O governo vai anunciar as medidas de mudança do câmbio na semana que
vem. A informação que se ouve no governo é que já estão superados
alguns dos obstáculos. Um deles é que a Receita Federal se opôs a
qualquer mudança que significasse perda de receita. Deixariam de ser
arrecadados de R$ 600 milhões a R$ 700 milhões em CPMF. Agora foi
encontrada uma fórmula para evitar esta perda.

O pacote está prometendo desobrigar as empresas de trazer todos os
dólares que arrecadam no exterior com suas atividades econômicas e
comerciais. Se o dinheiro não entra no país, não pagará CPMF, já que
não há a movimentação financeira. Mesmo assim, o governo está dizendo
que foi encontrada uma fórmula para compensar essa arrecadação. Isso
equivaleria a cobrar um imposto sem fato gerador. A explicação que se
ouve no governo é que a Receita é criativa e já encontrou uma fórmula
de manter a arrecadação.

O governo não adotará uma fórmula que privilegia um setor em relação
ao outro. As vantagens setoriais poderiam levar a distorções como as
que já ocorreram no passado com outras políticas que escolhem
beneficiados. Ela será geral e a grande preocupação é que não seja
benéfica apenas para as grandes empresas.

O governo chegou a anunciar, como se estivessem prontas, as medidas
de mudanças nas regras da entrada do câmbio no país. Isso quando o
dólar estava caindo muito. Ele voltou a subir e a conversa sobre
essas medidas parou. Agora voltou a cair e o governo está prometendo
o pacote para breve. A explicação para essas idas e vindas, anúncios
e atrasos, é que, como se diz no governo, é preciso muito cuidado
para mudar uma “legislação centenária”. Não chega a ser centenária,
mas é uma lei de 1933 e determinava que todas as receitas com
exportação fossem transformadas em moeda nacional para que o país
acumulasse divisas. Hoje o problema é o oposto: entrou dinheiro
demais de comércio e de investimento de curto prazo, pelos altos
juros que o país mantém, e isso levou a apreciação do real. Se as
medidas forem para facilitar, desburocratizar, desonerar a atividade
econômica, serão bem-sucedidas; se forem só uma forma de aumentar o
dólar para atender aos reclamos dos exportadores, não serão bem-
sucedidas. Não se muda uma política de mais de 70 anos por causa de
uma conjuntura cambial.

A maioria dos especialistas não acha que haverá mudança importante no
fluxo de dólares que produza um efeito de desvalorizar o real e
aumentar o valor do dólar, mas, no governo, a medida é tratada como o
início de uma nova tendência que levará à depreciação da moeda
brasileira.

No início, falava-se em acabar com a cobertura cambial, hoje é só a
idéia de flexibilizar a cobertura. Empresas serão autorizadas a
manter uma parte dos dólares no exterior, possivelmente para cobrir
os custos que têm também no exterior. Por exemplo, uma empresa que
exporta e importa não teria que trazer os dólares e reenviá-los. Mas
o que acontecerá com a empresa que gera receitas no exterior mas não
importa muito? Caso da Vale do Rio Doce, por exemplo. A Petrobras
exporta muito e importa muito, mas a Vale só exporta. Esses detalhes
estão ainda em discussão, mas, no governo, garante-se que o debate
está na reta final e que as medidas estão praticamente prontas.

Outro fator que pode melhorar o câmbio é a queda dos juros, mas eles
continuarão caindo tão lentamente que ainda não fizeram efeito. Ontem
o dólar subiu um pouco, mas como efeito de mais uma atuação do Banco
Central comprando moeda americana.

Problema de todos

O Brasil passará os próximos dias discutindo o problema da segurança.
As autoridades discutem o tema por espasmos, empurradas pelos ataques
dos criminosos. Quando há um momento de estresse, como o de ontem, o
tema volta à pauta.

E o que se verá, de novo, é a falta de um pensamento estratégico
sobre o tema que mais angustia a população brasileira. Na última
pesquisa CNT-Sensus, os entrevistados responderam que, se a eleição
para presidente da República fosse hoje, o que mais pesaria na
escolha seria “a capacidade de combater a criminalidade”. Isso é
apontado por 25% dos pesquisados. Mais até do que “levar o país a se
desenvolver”, que é indicado como o principal critério de escolha por
21%.

Mesmo assim, diante das crises, as autoridades se comportam com o
olho nas urnas. O governador de São Paulo, Cláudio Lembo, quer
mostrar auto-suficiência; o governo federal quer que o custo da crise
cole na oposição que governava São Paulo.

Ambos estão errados. O custo recairá sobre todos eles. Na oposição,
que achava que teria avanços em São Paulo a mostrar; no governo
federal, porque prometeu ter políticas efetivas para a segurança
saindo da postura de outros governos de jogar a responsabilidade
sobre os governos estaduais. Este governo tem resultados pífios a
mostrar.

Os 71 ataques de ontem a 27 cidades de São Paulo seguem o mesmo
padrão do ataque anterior há dois meses, mas mostraram a mesma
incapacidade do poder público em prevenir e reagir em defesa da ordem.

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