SILVIO NAVARRO
Folha de S. Paulo
17/7/2006
Vice de Alckmin diz que Lula é chefe de esquema de irregularidades e que, se for reeleito, haverá um novo mensalão porque "eles não se arrependeram de nada'
JOSÉ JORGE , 61, é candidato a vice na chapa de Geraldo Alckmin (PSDB) na disputa pela Presidência e tem a responsabilidade de desferir as críticas mais duras ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na entrevista abaixo, afirma que a diferença entre Lula e o ex-presidente Fernando Collor foi o apoio político que "o presidente Lula tinha e o Collor, não" e que, se Lula for reeleito, haverá um segundo mensalão.
Escolhido para disparar os ataques mais ácidos na campanha presidencial pelo lado da oposição, o senador José Jorge (PFL-PE), 61, vice na chapa do tucano Geraldo Alckmin, diz que aprendeu a fazer oposição com o PT e que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pela quantidade de escândalos, só pode ser comparado à gestão de Fernando Collor de Mello (1990-92), que terminou em impeachment. O pefelista acusa o presidente de ser o "chefe" do esquema de corrupção que desencadeou a crise política e diz acreditar que haverá um segundo mensalão caso Lula seja reeleito. "Eles não mudaram em nada os métodos, aparentemente não se arrependeram de nada." Leia a seguir trechos da entrevista com José Jorge.
Folha - Como o sr. caracteriza o governo Lula?
José Jorge - Um governo tem que se caracterizar por três fatores. Em primeiro lugar, por ser um governo que se comunica com a população dizendo a verdade. Segundo, tem que ser um governo que mostre competência na execução dos trabalhos. E terceiro, tem que ser honesto e usar o dinheiro público da melhor maneira possível. Um governo para ser reeleito teria que ter essas características e o governo Lula não tem.
Folha - Como a campanha vai vincular o presidente aos escândalos?
Jorge - Tenho convicção de que ele sabia e que era o chefe. O presidente Lula não é um simples qualquer, é uma pessoa que tem uma carreira no PT.
Folha - O sr. está preparado para ouvir que foi o "ministro do apagão"?
Jorge - Eu fui o ministro que apagou o apagão. Houve uma crise energética e, quando cheguei ao ministério, montamos um plano para que não houvesse apagão e não houve. Houve um racionamento que conduzimos num período de oito meses para que fosse superado.
Folha - O PFL critica os gastos do governo mas, na Câmara, insiste em votar uma MP que concede reajuste de 16,67% aos aposentados. Isso não é contraditório?
Jorge - Aquilo foi uma questão política. Existe uma certa contradição nisso se olhar simplesmente pelo lado administrativo. Mas o presidente Lula fez uma série de promessas que não está cumprindo, inclusive de atualizar os valores das aposentadorias. Ele concedeu aumentos mínimos e no último ano deu um aumento maior em função eleitoral. Os partidos de oposição geraram uma posição de que o presidente Lula não cumpriu suas promessas.
Folha - Em entrevista à Folha, o vice-presidente José Alencar disse que Alckmin partiu para uma "linha pefelista" e faz "apelações grosseiras". Como o sr. responde a isso?
Jorge - A primeira questão é a linha do PFL que, na oposição, é propositiva. Temos que propor aquilo que queremos para modificar a qualidade de vida das pessoas, tudo aquilo que o governo não fez, e criticar aquilo que foi feito. Isso não é radicalismo, é parte do papel da oposição. Quem deu uma lição, inclusive ao PFL, de fazer oposição, foi o PT, que fez oposição muito mais radical do que fizemos ao governo Lula.
Folha - Alencar disse que daria nota dez para o comportamento ético do governo Lula. E o sr. ?
Jorge - Infelizmente, dou nota zero. Nem no governo Collor, que o presidente foi colocado para fora por impeachment, houve tantos escândalos como o governo Lula, do mensalão, dos dólares na cueca, da quebra do sigilo do caseiro. Há dezenas de escândalos financeiros e éticos que o governo do presidente Lula e o PT realizaram durante apenas três anos.
Folha - Ao comparar o governo Lula ao governo Collor o sr. quer dizer que a oposição deveria ter se mobilizado pelo impeachment?
Jorge - A diferença do presidente Lula e do presidente Collor foi a questão do apoio político que o presidente Lula tinha e o Collor, não. O presidente Lula foi eleito por um partido grande, que tem uma estrutura de deputados, senadores e uma inserção social muito maior do que o partido do presidente Collor na época. Mas motivos para que houvesse um processo de responsabilização política e impeachment existiram, o que não existiram foram as condições políticas para isso.
Folha - O sr. foi muito criticado, até pelo PSDB, por ter dito que o presidente Lula abusa de bebidas alcóolicas. O sr. se arrependeu?
Jorge - Não me arrependo porque foi dito no contexto de um comício. Eu não fui o primeiro a dizer isso, uma semana antes o Ronaldo [jogador de futebol] falou não só ao Brasil, mas ao mundo inteiro. Porém esse não é um tema importante na campanha.
Folha - O sr. acha que se o presidente Lula for reeleito haverá um segundo mensalão?
Jorge - Acho que sim. Eles não mudaram em nada os métodos. Tanto que o PT não puniu nenhum dos parlamentares que a CPI acusou, que o Conselho de Ética também acusou e que foram absolvidos com o auxílio da base do governo na Câmara e do próprio presidente Lula. Não vejo arrependimento.
Folha - O episódio do mensalão não mudou a forma de relacionamento do governo com sua base?
Jorge - Agora mesmo os Correios, uma empresa que ficou muito marcada porque foi onde começaram as denúncias, foram entregues ao PMDB como moeda de troca para apoio eleitoral. Não houve nenhum arrependimento e não tenho dúvida que, se o presidente Lula for reeleito, se não houver o mensalão, vai ter algo parecido.
Folha - Como a campanha vai tratar da questão da segurança?
Jorge - O governo Lula não cumpriu as suas promessas na área da segurança, não liberou os recursos, não fez nada daquilo que poderia fazer. O presidente Alckmin vai assumir para ele a questão da segurança pública no Brasil e vai trabalhar em conjunto com o Estado.
Folha - O candidato Alckmin prestou contas à população sobre a crise na segurança no Estado?
Jorge - Claro que ele assumiu, mas a questão não pode ser assumida só pelo governo de São Paulo. Os índices de criminalidade no Estado foram reduzidos pela metade, mas o Estado aumentou muito o número de presos. O presidente Alckmin tem uma vantagem de que, como ex-governador, tem grande experiência e o sentimento daquilo que o governo federal deveria ter feito e não fez.
Folha - O que um governo Alckmin mudaria na política econômica?
Jorge - O país tem que crescer. Não só no governo Lula, mas mesmo antes, não teve a taxa de crescimento que deveria. É verdade que no governo Lula houve um grande movimento internacional e todos os países cresceram. Já o Brasil só cresceu mais que o Haiti. É a hora de se tomar as medidas efetivas para o país voltar a crescer.
Folha - O que sr. faria diferente do vice José Alencar?
Jorge - O maior acerto foi ocupar a posição de uma forma discreta, responsável e, apesar das críticas aos juros, sempre procurou colaborar, chegou a exercer o Ministério da Defesa. O maior defeito foi concordar com essas questões éticas do governo Lula e do PT. Acho que dizer que a ética no governo é nota dez é demais.