O Estado de S. Paulo
1/7/2006
Pesquisas mostram a Lula que será preciso esforço para manter a
dianteira
Os resultados das primeiras pesquisas pós-oficialização das
candidaturas presidenciais não revelam uma grande novidade ao
registrarem a elevação das intenções de voto em Geraldo Alckmin.
Apenas atestam o óbvio que, mesmo sendo tão óbvio, as pessoas em
geral, e o governo em particular, insistiam em ignorar: eleição não
se decide de véspera, muito menos meses antes.
A aliança PSDB-PFL entrou em cena naquele que é o instrumento
essencial da comunicação, a televisão, e aí evidenciou-se a
preservação dos sinais vitais da democracia, onde o exercício do
contraditório, e não a propaganda oficial, pauta a vontade do
eleitorado.
Se as notícias continuarão sendo boas para a oposição e se os motivos
de preocupação aumentarão para o governo, isso só o desempenho de
ambos daqui em diante dirá.
Como o presidente Luiz Inácio da Silva não joga sozinho, muito
natural que o adversário colhesse apoios ao apresentar suas
credenciais. Nada está definido: nem a consolidação da tendência de
subida de um e queda do outro, muito menos o resultado final ou a
decisão da parada em primeiro turno.
Aliás, é provável que essa mexida para cima nos índices de Alckmin
provoque uma mudança na estratégia governista de alimentar a
expectativa de vitória no primeiro turno, desde o início um cenário
muito pouco realista, incentivado pelo efeito manada comum no mercado
financeiro e que contamina as avaliações políticas quando estas
resolvem deixar de lado o exame de variantes da realidade e embarcar
nas impressões do senso comum.
O segundo turno se avizinha tanto por causa da presença da senadora
Heloísa Helena no páreo, que deverá carregar consigo o eleitorado de
esquerda órfão da utopia, quanto pelo patamar inicial de 20% com o
qual Alckmin entrou na disputa. Tampouco deve se desprezar o ambiente
de evidente insatisfação com o governo corroborado pelo índice de 31%
de rejeição de Lula.
Se não quiser fazer da realização do segundo turno uma derrota, a
campanha de Lula deverá, depressa, adotar um discurso mais cuidadoso
a respeito e assumir atitude mais discreta em relação às negociações
partidárias com vistas à composição, já, de um segundo mandato.
O complicador é que Lula precisa desde agora criar fatos capazes de
dissipar o temor de um novo período permeado pelo caos político e
pela tentação autoritária. Da mesma forma como em 2002 precisou
produzir uma carta a brasileiros e estrangeiros para neutralizar o
medo de extravagâncias na economia, agora ele precisa "provar"
capacidade de reunir apoio político e social, além de exibir
serenidade institucional.
Necessita também manter o clima de fatura liquidada, a fim de inibir
o crescimento da impressão de que sua derrota é possível. E isso a
campanha governista vem fazendo até agora: apressando a aliança com o
PMDB para sinalizar estabilidade parlamentar e incentivando o já
ganhou, movimentos que a redução da vantagem nas pesquisas torna
eleitoralmente imprudentes.
Se essa aproximação entre os principais oponentes se confirmar daqui
para a frente - a condicionante se justifica, pois há a possibilidade
de Alckmin ter sido beneficiado por uma mera "bolha inflacionária" de
preferência nas pesquisas -, Lula vai precisar lutar para manter a
dianteira até o final.
Isso significa necessariamente uma revisão de métodos de conduta, a
começar pelo contraproducente confronto com a Justiça Eleitoral e o
desafio aos ditames da lei, que vão criando uma imagem de gosto pela
transgressão muito prejudicial a quem precisa se distanciar de
referências a ilegalidades de um modo geral.
Perdendo terreno, Lula precisa arregaçar as mangas, não podendo se
dar ao luxo de ficar na defensiva. A premência de sustentar a
ofensiva é muito mais complicada para governos do que para candidatos
de oposição. Estes só precisam atacar, mas aqueles têm também de se
defender.
A pesquisa mostra que talvez seja insuficiente para Lula fazer sua
defesa atacando apenas o governo antecessor, de Fernando Henrique
Cardoso. Não poderá subestimar a possibilidade de Geraldo Alckmin
criar empatia com o eleitorado valendo-se do perfil de bom rapaz,
enquanto ao PFL fica reservado o papel de exibir as mazelas do atual
governo e patrocinar os atos mais agressivos.
Neste aspecto, o presidente Lula fica em desvantagem quando se
apresenta a hipótese de a reeleição não lhe cair no colo por
gravidade, pois terá de fazer sozinho todos os papéis - o "Lulinha
paz e amor", o pai dos pobres, o governante eficaz, a vítima do
preconceito das elites, o estadista fiador da democracia, o candidato
bom de briga - e nem sempre os personagens guardarão coerência entre si.
Modo de expressão
"Quando as pessoas vêm para o hospital e morrem na mão do Jatene,
mesmo que ele tenha feito um erro, todo mundo morre satisfeito." É o
que pensa e diz o presidente Lula.
Já ao doutor Adib Jatene cabe salvar vidas e não proporcionar
satisfação garantida na morte.