Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, julho 14, 2006

Celso Ming - Economia em transição

O Estado de S. Paulo
14/7/2006

Há um mês, Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (Fed, banco
central americano), declarou que a economia dos Estados Unidos "está
em fase de transição". Ficou entendido que não era apenas a economia
americana, mas toda a economia mundial está em transição.

Depois disso, os analistas econômicos têm repetido, quase
automaticamente, essa expressão sem nenhum aprofundamento, sem mesmo
explicar o que entendem por "fase de transição".

O que transita, transita de um ponto para outro. Se tanto a economia
americana como a mundial estão em transição, então pressupõe-se que
estejam perdendo algumas características e ganhando outras. Quais são
essas características?

A atual fase de vacas gordas tem cerca de 15 ou 20 anos. Foi (ou
ainda é) um período de impressionante redução da inflação, baixa dos
juros, crescimento econômico notável e rápida expansão do comércio.
Para não entendiar o leitor, dispensem-se as abundantes estatísticas
que comprovam a afirmação acima.

Três principais fatores derrubaram a inflação mundial: o efeito
China, a Tecnologia da Informação e o barateamento dos transportes. O
efeito China é mais do que a China. É a produção industrial em massa
com uso de uma mão-de-obra de baixo custo na China, na Índia, na
Coréia do Sul e em mais meia dúzia de países asiáticos. A Tecnologia
da Informação são os recursos eletrônicos que reduziram a distância
física entre produtor e consumidor, processou online pedidos e
fornecimentos, reduziu a necessidade de estoques, investimentos,
máquinas, instalações físicas, gente e capital de giro. O terceiro
fator foi a redução dos custos dos transportes.

Os bens de consumo chegaram ao consumidor por uma fração dos preços
reais do período anterior (década de 80) e a inflação mergulhou.
Assim, os juros caíram, sobrou dinheiro nos mercados, o crédito ficou
mais barato, o consumo saltou e a produção foi atrás. A onda
favoreceu o crescimento econômico de um punhado de países emergentes,
especialmente da Ásia. (Nesse ponto, o Brasil ficou para trás porque
deu prioridade ao controle da dívida, ao saneamento das finanças
públicas e à melhora das contas externas.)

Como tudo tem conseqüência, o aumento do consumo e da produção global
pressionou os preços das matérias-primas e, sobretudo, do petróleo.
Os custos aumentaram, a inflação voltou, os juros estão subindo no
mundo, o consumo deverá ser contido e a produção, também.

Isso é novo, ninguém sabe em que proporção virá o ajuste. Enfim, a
economia está em transição, como advertiu Bernanke. Transição traz
incertezas, que geram insegurança. E, na insegurança, as pessoas
exageram os efeitos sobre a economia mundial e sobre a administração
de patrimônio. É a hora em que as ameaças parecem mais altas do que
são de fato e o mercado financeiro reage também com nervosismo, como
ontem.

Em tempo de transição, tudo é pretexto para produção de ruídos, desde
o noviciado do novo presidente do Fed até a intensificação dos
bombardeios no Oriente Médio, o que não é propriamente novidade.

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