Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 03, 2005

VEJA Severino Cavalcanti virou ministro

Severino virou ministro

O ex-presidente da Câmara perdeu
o mandato, mas ganhou todo o resto:
pose, poder e mais verbas públicas


Julia Duailibi

 

Ed Ferreira/AE
Severino, o ministro informal: até agora, ele já conseguiu 1 milhão para emenda de sua autoria

Há dois meses e meio, o ex-deputado Severino Cavalcanti, então presidente da Câmara, chegou ao fundo do poço de sua carreira pública ao ter de renunciar ao mandato depois de ser pilhado cobrando propina do dono de um restaurante. O surpreendente, sabe-se agora, é que a tal renúncia do ex-deputado não foi propriamente um fundo de poço. Talvez tenha sido o contrário. Na prática, após largar o mandato para fugir da cassação, Severino Cavacanti tornou-se ministro das Cidades do governo do presidente Lula. É isso mesmo: Severino é o ministro das Cidades, um ministro informal, pois seu nome não saiu no Diário Oficial da União, mas mais poderoso que muito ministro formal. No Ministério das Cidades, Severino é tratado pelos funcionários como o que de fato é – ou seja, a maior autoridade do pedaço. Ele despacha rotineiramente no ministério, cujo orçamento para este ano chega a 2,7 bilhões de reais. Usa a garagem e o elevador privativos do ministro e recebe políticos na sala de reunião no 2º andar, bem ao lado do gabinete do titular oficial da pasta, Marcio Fortes, aquele cujo nome foi publicado no Diário Oficial da União. A rotina de Severino no ministério não deixa margem para dúvidas: ele é o verdadeiro sucessor do petista Olívio Dutra...

O ministro Severino tem agenda intensa. Nos fins de tarde, muitas vezes ele se instala dentro do próprio gabinete do ministro e, na sala ao lado, atende prefeitos e parlamentares em busca de recursos para suas bases eleitorais. Em média, recebe uns dez políticos por dia. Ouve com atenção as reivindicações, promete empenho pessoal na liberação das verbas e – o que é mais importante – tem sido altamente bem-sucedido. Como pretende voltar ao Congresso na eleição do ano que vem, Severino, é claro, prioriza os políticos de seu estado, Pernambuco. "Em pouco tempo, ele conseguiu liberar dinheiro para cisternas e construção de casas populares", comemora o prefeito de Cumaru, Roosevelt Gonçalves de Lima, do PP, o mesmo partido de Severino. "Por isso, acho que ele vai ter mais votos em 2006 do que teve em 2002. Só aqui vou conseguir mais de 5.000 votos para ele", promete o prefeito, agradecido. Na sexta-feira passada, Pernambuco voltou a reinar no ministério. Ao lado do ministro Fortes, o ministro Severino recebeu uma comitiva composta de treze políticos do estado. Outra prova do prestígio do ministro Severino: em apenas um mês, ele conseguiu mais de 1 milhão de reais para contemplar as emendas orçamentárias de sua própria autoria. É uma situação ideal: por não ser um ministro formal, talvez Severino nem possa sequer ser acusado de agir em causa própria...

Rodrigo Paiva/AE
Marcio Fortes, ministro formal: ele não parece se incomodar com o poder de Severino


O ministro Marcio Fortes, o formal, chegou ao cargo por indicação do ministro Severino Cavalcanti, o informal – e não parece se incomodar com a situação. Na semana passada, o formal viajou e, sem cerimônia, o informal voltou a instalar-se no gabinete ministerial. Além das questões de saneamento e habitação, próprias de sua pasta, o ministro Severino foi acionado pelo governo para dar uma mãozinha a José Dirceu na luta contra a cassação. A estratégia de ação foi combinada diretamente com seu colega de ministério, Jaques Wagner, com quem se reuniu dias antes. Não foi a primeira vez que o governo se socorreu da capacidade de articulação de Severino. Ele trabalhou muito para convencer seus antigos aliados a apoiar o comunista Aldo Rebelo para lhe suceder na presidência da Câmara. Na quarta-feira passada, dia da votação do processo de José Dirceu, Severino esteve no Congresso e fez um corpo-a-corpo com os parlamentares do baixo clero, pedindo votos contra a cassação do ex-ministro da Casa Civil.

"Estou falando com deputados do meu partido para se colocarem no lugar de Dirceu e dizerem se gostariam de ser cassados sem direito a ampla defesa", discursava Severino pelos corredores. A única dificuldade que o ministro Severino encontrou em seu périplo pela Câmara foi para se desvencilhar dos inúmeros pedidos de audiência que recebia. Severino não conseguiu livrar José Dirceu da cassação, mas também não se abateu. No dia seguinte, novamente instalado no gabinete do ministro das Cidades, soube que o governo nomeara o novo diretor do Departamento Nacional de Trânsito. O contemplado, Alfredo Peres da Silva, foi indicação sua. Que ninguém se surpreenda, portanto, se Severino voltar a aparecer em breve, desta vez na pele de chefe do Denatran.

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