Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, dezembro 30, 2005

Editorial da Folha de S Paulo

POLÍCIA NAS ELEIÇÕES
 
É no mínimo polêmica a intenção do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, de engajar a Polícia Federal (PF) num trabalho "preventivo" e "de fiscalização" para coibir o uso de caixa dois por partidos políticos nas eleições de 2006.
Em primeiro lugar, há controvérsia em relação à própria constitucionalidade da idéia. Ninguém nega à PF a atribuição de investigar indícios ou suspeitas de caixa dois. Mas o texto constitucional dá margem a interpretações segundo as quais atividades preventivas ou fiscalizatórias referentes à conduta dos partidos estariam fora da esfera do órgão. Atribuir essas funções à PF seria usurpar a autonomia da Justiça Eleitoral e avançar sobre seu escopo de atuação.
Por trás dessas objeções está a intenção -pautada pelos princípios republicanos da imparcialidade e da impessoalidade- de garantir que a condução do pleito e a fiscalização das legendas fiquem a cargo de instituições o mais possível neutras. Não há motivos para crer que a PF seja imune à instrumentalização política, mesmo que à revelia do Ministério da Justiça. O passado recente fornece pelo menos um exemplo sobre o qual pairam suspeitas de motivação política, o caso Lunus, que abalou a candidatura de Roseana Sarney à Presidência da República, em 2002. Isso para não mencionar os espetáculos de pirotecnia que, coincidência ou não, ajudaram a desviar a atenção de problemas vividos pelo governo.
Introduzir um organismo policial sob comando do Executivo no processo eleitoral pode se revelar uma boa maneira de colocar em perigo a liberdade política e a legitimidade dos ritos eleitorais, essenciais ao Estado democrático de Direito.
É mais do que evidente a urgência de combater os desvios praticados em campanhas eleitorais, mas para isso é preciso elaborar regras que confiram mais transparência à contabilidade dos partidos e endurecer a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral, de modo a cercear as prestações de contas fictícias.

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