Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 24, 2005

Além do Fato: A polarização PT e PSDB Bolívar Lamounier



 Jornal do Brasil (24/12/05)

Pelos dados disponíveis até o momento, as eleições de 2006 terão como principais contendores o presidente Lula e um candidato do PSDB – plausivelmente contando com o apoio do PFL. Embora em tese o PMDB tenha potencial para se apresentar como um terceiro protagonista, a referida polarização é o quadro mais provável e já suscita indagações sobre as respectivas bases de apoio no Congresso e, em geral, sobre o relacionamento entre PT e PSDB a partir de janeiro de 2007. Indagações mais agudas, é claro, na hipótese da reeleição de Lula, dado o desgaste eleitoral e político do petismo na esteira dos escândalos de corrupção.

As especulações a esse respeito são assaz contraditórias. Por um lado, o PSDB tem sido criticado por sua alegada "moleza" em relação a Lula, ao não capitanear a proposta de impeachment, por um suposto "acordo" para blindar o ministro Palocci e livrar "mensaleiros" . Segundo uma percepção mais antiga, tucanos e petistas teriam importantes "afinidades" ideológicas e de origem, o que tornaria eventualmente possível uma (re)aproximação entre eles. Essa hipótese foi aliás ressuscitada há poucos dias pelo ex-ministro Gushiken em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, como caminho para a governabilidade após as eleições de 2006, caso Lula consiga de fato se reeleger.

Por outro lado, existem diferenças históricas importantes entre os dois partidos, e não há como ignorar a dureza dos enfrentamentos ocorridos nos últimos meses e de outros que podem advir da própria campanha eleitoral .

Tratando aqui somente dos enfrentamentos recentes, cumpre inicialmente lembrar que os atuais partidos de oposição, PSDB e PFL, contribuíram decisivamente para a aprovação das principais propostas legislativas de Lula durante o ano de 2003. E nem poderia ser diferente, uma vez que tais propostas eram um prolongamento das políticas implementadas durante o governo Fernando Henrique.

Eram também decorrência do arcabouço político-administrativo e do acordo com o FMI arquitetados pelo governo anterior com vistas a facilitar a transição. Da mesma forma, no tocante ao projeto das Parcerias público-privadas (PPPs), o PSDB endureceu a discussão para melhorar o projeto, mas não se furtou a aprová-lo.

O divisor de águas no distanciamento entre governo e oposição foi na verdade o caso Waldomiro Diniz e os indícios de corrupção que se avolumaram já durante o ano de 2004 – e não apenas em 2005, após as revelações de Roberto Jefferson, como se tem feito crer.

No que se refere às bases de apoio do futuro governo, é óbvio que não dispomos ainda de elementos minimamente seguros, mas cabem aqui algumas especulações . Ocorrendo a reeleição de Lula, podemos presumir que o PT e seus aliados poderão eleger uma boa bancada. Mas certamente não uma bancada tão numerosa como a almejada pelos estrategistas petistas da era "pré-mensalão". Portanto esse hipotético novo governo petista não poderá dispensar a colaboração de partidos como o PP, o PL e o PTB, parceiros do atual mandato.

Se o presidente Lula for derrotado, a bancada petista no Congresso será naturalmente menor e seu comportamento dependerá muito da extensão da derrota, do grau de acirramento da campanha – e do papel que o próprio Lula vier a assumir como prócer da futura oposição.

Com uma bancada menor e tendo já feito o aprendizado do poder, dificilmente o partido poderá voltar a seu antigo hábito de oposição puramente ideológica e sistemática.

Será a campanha de 2006 notavelmente acirrada? Em comparação com a de 2002, certamente, até porque a de 2002 caracterizou-se por um inusitado cavalheirismo. Nos debates, por exemplo – talvez pela "novidade" de que então se revestia a provável chegada de Lula ao poder –, o tucano José Serra comportou-se quase como um debatedor acadêmico .

Em 2006, quer o candidato do PSDB seja ele mesmo ou Alckmin – ou ainda, para argumentar, Fernando Henrique, Aécio Neves ou Tasso Jereissatti –, não há por que imaginar um antagonismo desmedido e de caráter pessoal. A superposição existente entre parcelas expressivas dos eleitorados de classe média do PSDB e do PT será um incentivo adicional à moderação. Mas as diferenças serão também marcantes, pois entre os grandes temas da campanha estarão sem dúvida o saldo da Presidência Lula, a busca de novos rumos para o país e, naturalmente, a demanda por efetivo combate à corrupção.

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