FOLHA
Livros sobre a globalização ocuparam meu tempo neste fim de ano. Os autores são jornalistas, um do "New York Times", outro do "Le Monde". Se fôssemos aplicar aos dois o próprio critério jornalístico de esquentar as matérias, diríamos que um é favorável, outro é contrário. Mas isto não explicaria quase nada.
"O Mundo É Plano", de Thomas Friedman, já foi traduzido no Brasil e, sob muitos aspectos, é uma apologia daqueles países, ou mesmo setores, que conseguiram se inserir na globalização, aproveitando-se desta oportunidade para prosperar.
Nesse caso estão Índia e China, a primeira sobretudo por formar, desde os tempos de Nheru, grandes engenheiros que não tinham outra saída exceto buscar um emprego qualquer fora do país. Agora, com o processo de terceirização dos serviços dos grandes grupos internacionais, a Índia está tirando o maior proveito possível da inteligência e da formação técnica dos seus quadros.
Quem perde a mala numa viagem interna nos EUA e reclama pelo telefone pode estar falando com um "call center" em Bangalore, pois grande parte desses serviços é feito hoje na Índia.
Um dos bons momentos do livro de Thomas Friedman é quando conta uma fábula africana. Toda vez que um antílope acorda, ele sabe que tem de correr mais que o mais veloz dos leões para sobreviver. Quando o leão acorda, sabe, por sua vez, que tem de correr mais que o mais lento dos antílopes, também para sobreviver. Em suma, não importa se leão ou antílope, é preciso começar a correr cedo.
O processo competitivo acentuado pela globalização levou a inúmeras soluções geniais. Friedman, por exemplo, fala da capacidade do Wal-Mart de organizar seus fornecedores, em criar programas que racionalizem as entregas ou mesmo o rastreamento de cada pacote.
Como repórter nova-iorquino, atribui ao provincianismo do Wal-Mart sua política rígida com os funcionários, política que lhe ameaça o prestígio no mundo. Aliás, depois do livro publicado, a empresa teve de pagar, na semana passada, US$ 157 milhões em indenizações trabalhistas.
Friedman também tem uma visão crítica do processo de destruição ambiental, mas não o dramatiza. Em certos momentos, chega a admitir, numa hipótese, que o preço do petróleo baixe a US$ 10 o barril, algo bastante contraditório com a crise dessa fonte de energia.
Já o livro de Jean-Paul Besset, que foi redator-chefe do "Le Monde" durante dez anos, é um grande libelo contra o processo de globalização por causa dos seus efeitos, inclusive no meio ambiente. Besset acha que chegamos a um momento decisivo e que não se trata mais de luta de classe, muito menos de combates nacionais. Todos precisam se unir para evitar o descontrole que o progresso acarretou, ameaçando o futuro do planeta.
O título de seu livro -"Como Não Ser Mais Progressista, Sem se Transformar num Reacionário"- é bastante elucidativo. Ele começa dialogando com um suposto guardião celeste sobre seus fracassos na Terra, inclusive as idéias de esquerda trituradas pela história. E, a partir daí, procura demonstrar como a crise pode nos levar todos para o buraco, progressistas ou não.
As duas obras provocam no leitor a vontade de lutar. O de Friedman, lutar para que o próprio país entenda a globalização e tire proveito dela. Ele propõe que os americanos se deixem levar pelo espírito da queda do Muro de Berlim e atenuem o impacto do 11 de Setembro. Ele quer um espírito aberto do 9/11 contra a quase paranóia que os EUA viveram desde o 11/9.
No caso brasileiro, tanto as preocupações de Friedman, entusiasta da globalização, como as de Besset, crítico radical, ainda não parecem ter dominado nossa vida política. Se por um lado o país nem se prepara, acabando com excesso de burocracia, investindo na educação, estimulando a criatividade, por outro lado não se prepara também para a crise ambiental como seria necessário.
O resultado é que não somos nem bem apologéticos nem críticos. Apenas vamos tocando o barco, com um acerto aqui, um erro ali. O presidente Lula diz que não queria plantar para que outros colhessem. Isso não é verdade nem para ele -pois algumas vitórias do Brasil na OMC (algodão, aço) acabam ajudando as novas gerações aqui e em outros países do Terceiro Mundo- nem para líderes como Nehru e Mandela, cada um à sua maneira, plantando para muitas gerações posteriores.
Com toda a admiração que tenho por São Paulo, não deixa de ser estranho ver uma luta tão limitada entre suas grandes correntes políticas. Se mergulho no livro de Friedman, sinto uma grande necessidade de união para que se responda a esse processo impiedosamente competitivo no mercado internacional. Se me dedico ao texto de Besset, concluo que ainda estamos longe dos passos necessários para evitar o grande desastre ambiental.
Um presidente que não planta para que outros colham é uma peça difícil de integrar nesse quebra-cabeça. Ainda que os políticos brasileiros possam se consolar com as rivalidades internas. Tanto para um mundo plano como para o mundo em dissolução, elas são apenas uma nota no pé de página.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
dezembro
(535)
- Mariano Grondona Sobre el síndrome anárquico-autor...
- Vozes d’África REINALDO AZEVEDO
- Merval Pereira Estranha aliança
- FERNANDO GABEIRA Globalização e as sementes do equ...
- O que sobrou de 2005? GESNER OLIVEIRA
- FERNANDO RODRIGUES Perdas e danos em 2005
- CLÓVIS ROSSI Férias?
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial de O Estado de S Paulo
- CELSO MING Mudou o foco
- Rodovias - a crise anunciada por Josef Barat*
- A saúde que faz mal à economia Robert Fitch
- Villas-Bôas Corrêa Do alto o governo não vê
- Merval Pereira Os números do impasse
- Celso Ming - Bom momento
- Não contem ao presidente LUIZ CARLOS MENDONÇA DE B...
- As limitações da política econômica FERNANDO FERRA...
- NELSON MOTTA Barbas de molho
- ELIANE CANTANHÊDE Emergência
- CLÓVIS ROSSI Emprego e embuste
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Não na frente...
- Wagner faz da Viúva militante- claudio humberto
- Sharon, o homem do ano Por Reinaldo Azevedo
- Brasil - Idéias para tirar o Estado do buraco
- Editorial de O Estado de S Paulo
- Negócio da China? PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
- JANIO DE FREITAS Votar para quê?
- DEMÉTRIO MAGNOLI O fator BIC
- MARTA SALOMON Quem tem medo do caixa um?
- CLÓVIS ROSSI O risco-empulhação
- Editorial da Folha de S Paulo
- CELSO MING A âncora da economia
- Editorial de O GLOBO
- Merval Pereira Soy loco por ti, América
- Tiro no pé abriu o 'annus horribilis' Augusto Nunes
- Sem perder a pose - Blog do Noblat
- Zuenir Ventura Louvado seja o Pan
- Editorial de O GLOBO
- ALI KAMEL Feliz ano novo
- Merval Pereira A turma do mensalão
- ELIO GASPARI O Ano da Pizza começou no Ceará
- Ação brasileira gera importante avanço JOSEPH E. S...
- FERNANDO RODRIGUES Legado do "mensalão"
- CLÓVIS ROSSI A empulhação, em números
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo PÉSSIMA IMAGEM
- Editorial de O Estado de S Paulo
- Faltou o espetáculo Celso Ming
- O Banco Central e o paradoxo do dólar Sonia Racy
- Augusto Nunes - Essa candidatura parece provoção -
- Cuecão de ouro: absolvição cara - Claudio Humberto...
- Distorções Celso Ming
- Feliz ano novo ALI KAMEL
- RUBENS BARBOSA Crise de identidade
- ARNALDO JABOR Só nos restam as maldições
- Merval Pereira Símbolos e realidade
- O procurador procura toga AUGUSTO NUNES
- Sinais alarmantes ROBERTO BUSATO
- CLÓVIS ROSSI PT x PSDB, perde o Brasil
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Lula tentou abafar investigações, diz presidente d...
- FERNANDO RODRIGUES Ingenuidade ou farsa
- VINICIUS TORRES FREIRE Ano novo, vida velha
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Carlos Alberto Sardenberg A culpa é do governo
- dívida externa e risco Brasil
- AUGUSTO NUNES Nunca se viu nada parecido
- FERREIRA GULLAR Um Natal diferente
- LUÍS NASSIF O "príncipe" dos jornalistas
- História de Natal RUBENS RICUPERO
- Força de Lula deve definir candidato do PSDB
- ELIO GASPARI Um novo estilo: o minto-logo-desminto
- ELIANE CANTANHÊDE Enquanto março não vem
- CLÓVIS ROSSI O sinal e o bocejo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
- Desigualdade e transferência de renda
- Pobres se distanciam de ricos e dependem mais do g...
- Daniel Piza História da ilusão
- João Ubaldo Ribeiro A qualidade de vida ataca nova...
- CELSO MING De três em três
- Governo amplia Bolsa Família, mas não ajuda benefi...
- VEJA Mensalão:Marcos Valério processa o PT
- VEJA Eduardo Giannetti da Fonseca O fim do ciclo d...
- VEJA Tales Alvarenga O nosso Muro de Berlim
- VEJA MILLÔR
- VEJA Diogo Mainardi Uma anta na minha mira
- Além do Fato: A polarização PT e PSDB Bolívar Lamo...
- 2006 não será 2002 GESNER OLIVEIRA
- FERNANDO RODRIGUES Visão de dentro da crise
- CLÓVIS ROSSI A confissão
- Editorial da Folha de S Paulo
- Editorial da Folha de S Paulo
-
▼
dezembro
(535)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA