A política econômica viveu entre o céu e o inferno em questão de dias. Primeiro, veio a divulgação de dados auspiciosos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), do IBGE, com uma radiografia positiva do cenário social de 2004. Mas em seguida, também por meio do IBGE, revelou-se que o PIB do terceiro trimestre encolheu em 1,2% em comparação com os três meses anteriores. As duas notícias, embora referentes a períodos distintos, aumentaram a intensidade da queda-de-braço entre os defensores do relaxamento da seriedade fiscal e a equipe do ministro Antonio Palocci, da Fazenda.
De um lado, os antigos arautos do desenvolvimento como fruto de simples ato de vontade e de descuidado fiscal — e que encontraram na ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, uma porta-voz. De outro, Palocci e o Banco Central, alvo de alas da esquerda incrustadas no governo, eternas adversárias da austeridade fiscal e da política monetária — mesmo que tenham sido elas responsáveis por livrar o país e o governo Lula de grave crise em 2003.
O conflito é conhecido. A novidade é que, além da proximidade de um ano eleitoral, consolidou-se o diagnóstico da impossibilidade de o país continuar a inflar os gastos públicos correntes não-financeiros, por causa do esgotamento de um modelo fiscal baseado no aumento de impostos e no corte de investimentos para se obter um imprescindível superávit primário (sem considerar os juros da dívida). A carga tributária chegou ao limite dos 37% do PIB, e se esses gastos continuarem a crescer, como fazem há 11 anos, a tendência dos juros não se manterá de queda.
Não será por falta de alternativas técnicas que o governo Lula deixará de enfrentar esse decisivo problema. Já se debate a proposta em elaboração por Delfim Netto e Fabio Giambiagi, economista do Ipea, apoiados por Palocci e pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. São sugeridas formas de se conter essas despesas — única decisão sensata a se tomar.
Entre as várias medidas a serem aprovadas pelo Congresso, dentro desse programa de ajuste fiscal de longo prazo, estão a definição de tetos para os gastos e a flexibilização da execução do Orçamento, hoje engessado por uma série de verbas vinculadas. O tema, crucial, é um teste de estadista para Luiz Inácio Lula da Silva.