Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 03, 2005

DORA KRAMER Dura lex sed lex

OESP

dkramer@estadao.com.br


Partidos enfrentarão uma Justiça Eleitoral mais rigorosa do que nunca em 2006 A condenação, pelo Tribunal Superior Eleitoral, do presidente Luiz Inácio da Silva ao pagamento de multa por antecipação da propaganda eleitoral não é o único - embora seja o mais recente e eloqüente - sinal de que a Justiça não aguardará mudanças na lei para impor rigor a partidos e candidatos na eleição de 2006.

As manifestações do Judiciário a esse respeito, aliás, já têm sido no sentido da aplicação mais austera da legislação em vigor. O grupo especial que há meses estuda o tema a pedido do TSE já enviou propostas de adaptação de algumas normas ao Congresso e, por mais de uma vez, afirmou que as regras existentes, se observadas ao pé da letra, são suficientes para enquadrar os malfeitores eleitorais e desmoralizar o lema do "todo mundo faz".

Enquanto os políticos produzem mais palavras que atos na defesa vazia e defensiva da reforma política como a única maneira de corrigir ilícitos e deformações de condutas, a Justiça Eleitoral saiu na frente nas providências práticas.

Em condições habituais, muito provavelmente a sentença de pagamento de multa de R$ 31,9 mil para o presidente da República não seria aplicada. O resultado apertado da votação no TSE no dia seguinte à cassação de José Dirceu - 4 a 3 - mostra que o acatamento à ação do PSDB não é de tese de aceitação pacífica.

O presidente, por intermédio da Advocacia-Geral da União, pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal da decisão que aceitou a alegação de que a publicidade institucional veiculada pelo governo em abril, comparando as administrações Lula e Fernando Henrique é propaganda eleitoral fora de época (a lei permite apenas 90 dias antes da eleição).

Mas, o mais importante aí não é a decisão em si, mas a disposição subjacente a ela. E esta, pelo visto e ouvido ultimamente, deverá permear a campanha de 2006 que, em função dos efeitos da crise política, antecipa-se peculiar no tocante à austeridade legal.

Partidos de governo e oposição precisarão redobrar suas atenções sobre os aspectos legais não só da propaganda, mas também do financiamento, do uso da máquina administrativa e do abuso do poder econômico.

É claro que o governo leva desvantagem pois, tendo ele os instrumentos mais robustos à mão, tem também sobre si maior vigilância e risco de punição.

Mas, considerando que as eleições são gerais, a oposição também será alvo nos Estados onde for situação. A cassação dos registros das candidaturas será ao mesmo tempo a grande tormenta dos candidatos e uma arma de boa monta para seus adversários.

Na arbitragem, entrará a Justiça Eleitoral no foco das atenções principais.

Na atual conjuntura de suspeições, que tende a piorar bem durante a campanha, os candidatos vão transitar em ambiente de estreita fiscalização da sociedade e, evidentemente, a Justiça não vai querer ficar com o ônus da acusação de leniência ante a repetição de ilícitos perfeitamente passíveis de punição com a legislação já existente.

Portanto, suas excelências que se preparem, pois o argumento de que nada se pode fazer enquanto a reforma política não vier será confrontado dia-a-dia no embate dos tribunais e sem dúvida será um fator de orientação do voto popular.

Menos

O deputado Chico Alencar propõe uma leitura "desdramatizada" do discurso de José Dirceu sobre seu alegado "banimento" da vida política do País.

Alencar, ex-petista agora no PSOL, lembra que Dirceu está inelegível, mas continua de posse de suas prerrogativas de cidadão. "A Constituição veda, em seu artigo 15, a cassação dos direitos políticos", aponta.

Não está impedido de atuar politicamente, coisa que fez, aliás, quando já na condição de ex-deputado deu entrevista coletiva em plenário da Câmara "com inteira liberdade, até para reafirmar traços de sua personalidade que o desgastaram".

O deputado considera oportuna a abordagem do tema sobre a atribuição de cassação do mandato pertencer, ou não, ao Poder Legislativo. Só acha que a oportunidade do debate não é agora, e sim na próxima legislatura, "pois há um rito em pleno curso e ele não pode ser esvaziado".

Inatingível

É inerente às funções do Supremo Tribunal Federal que ele seja "imune a pressões", como diz o ministro Nelson Jobim. O que a Corte não pode ser é imune a críticas.

Aliás, vacinada contra pressões de toda sorte deveria ser a Justiça de um modo geral e, nisso, o presidente do Supremo, como figura maior do Conselho Nacional de Justiça, joga um papel fundamental.

Para tal, seria indispensável, porém, que descesse do pedestal e levasse em conta o princípio do contraditório também quando as divergências de opinião dissessem respeito às suas convicções.

Há, no arsenal de frase célebres de Nelson Rodrigues, outras tão, ou mais, apropriadas que a citada pelo ministro Jobim - "os idiotas perderam a modéstia" - para traduzir sua indiferença às críticas.

"Toda unanimidade é burra" é a mais conhecida delas.


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