A magnitude da indignação diante do recuo tão forte do PIB no terceiro trimestre mostra que a paciência nacional vai sendo duramente testada. Mas as perguntas continuam aí, à busca de resposta. Uma delas é se essa derrubada no PIB não foi intencional, como chegou a dizer o presidente do BNDES, Guido Mantega, e uma outra é se o Banco Central não exagerou na dose.
Que foi coisa encomendada, não há dúvida. Não foi à toa que os juros foram atirados para os 19,75% ao ano e lá ficaram quatro meses. O objetivo pretendido foi esse mesmo; foi conter a atividade econômica para que a inflação fosse empurrada para dentro da meta.
Diante da necessidade de fazer um ajuste para controlar a inflação, o governo tinha dois caminhos. Ou espaçava o tratamento por dois anos ou partia imediatamente para o semichoque. Decidiu que a execução da política econômica concentraria as maldades em 2005 para que, em 2006, ano eleitoral, só houvesse alívio geral, flores e votos. Assim foi feito.
Ontem, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Furlan, crítico insistente da atual política econômica, calculadamente evitou dizer que o Banco Central errou a mão. Preferiu afirmar que "os objetivos foram atingidos e que agora é preciso ajustar a política monetária ao novo cenário".
O Banco Central jamais vai admitir que exagerou. Seu argumento mais forte é o de que não pode haver erro de dose se a inflação ainda está acima da meta. E, se a meta de inflação fosse revisada para alguma coisa em torno dos 6%, ainda assim, os juros teriam de ficar perto de onde ficaram e a paulada na atividade econômica não seria substancialmente mais baixa.
Mas o cerne da questão não é técnico; é político. Não está claro quanto de arrocho e de inflação a sociedade está disposta a suportar. Há tempos em que agüenta mais e outros em que agüenta menos. Reconheça-se que é difícil um ajuste fino nessa matéria. E, do ponto de vista político, parece claro que, ou houve erro de dose ou houve erro de gerenciamento das expectativas, na medida em que o Banco Central não corrigiu essa percepção do mercado.
Se haverá mudança de rumos, como sugere Furlan, cabe saber em que direção. O presidente Lula tem à sua disposição quatro opções.
A primeira é deixar tudo como está, convencido de que a atividade econômica segue em recuperação; que o serviço mais pesado já foi feito e que em 2006 será muito mais fácil garantir a meta de inflação de 4,5% do que foi garantir neste ano os 5,1%; e que há uma queda "natural" dos juros pela frente. Para isso, terá de resistir à pressão política pelo menos por mais dois meses.
A segunda é concordar com um aumento do superávit primário (parcela da arrecadação destinada ao pagamento da dívida) para que os juros possam cair mais rapidamente. Nesse caso, estará trombando com a oposição interna do PT e de todos os que desenvolveram o fogo amigo contra Palocci, gente que tem horror ao aumento do superávit primário.
A terceira é dar ouvidos aos críticos mais ferozes, abandonar austeridade e ortodoxia e adotar uma política econômica de cunho populista. Isso exigiria trocar a equipe econômica e enfrentar o tiroteio do mercado financeiro, daqui e do exterior.
A quarta é manter o superávit primário nos 4,25% e aceitar uma inflação mais alta em 2006 do que os 4,5% já decididos, para que os juros possam cair mais depressa e garantir também recuperação mais rápida.
A menos que a crise política se deteriore rapidamente, o mais provável é que fique com a primeira opção.