NOVA YORK. A possibilidade de o presidente eleito Barack Obama vir a criar um ministério especial para cuidar da indústria automobilística pode indicar que o socorro financeiro do setor poderá ficar subordinado a políticas ambientais e à implantação de modelos de uso híbrido de combustíveis. Fugindo à sua teoria de que os Estados Unidos só podem ter um presidente de cada vez, Obama pressionou publicamente o Presidente Bush a aprovar um pacote de salvamento para a indústria, especialmente a GM, Ford e Chrysler, as três grandes de Detroit que estão mais uma vez em dificuldades financeiras.
Como Bush, de saída da Casa Branca não quer tomar a iniciativa, a maioria democrata no Congresso já decidiu, a partir de amanhã, aprovar uma verba de US$ 50 bilhões na sessão apelidada de “pato manco”, referência à situação política precária do presidente que termina o mandato tendo tido seu candidato derrotado na eleição.
Essa fidelidade a uma indústria específica tem sua explicação tanto na cultura americana quanto na base eleitoral democrata. Michigan e Ohio votaram no democrata, sendo que Ohio deixou de ser um estado republicano para apoiar Obama.
Nos subúrbios de Detroit, a classe média de operários brancos da indústria automobilística, que havia se passado para o lado dos republicanos desde 1980 com Ronald Reagan, voltou para o seio dos democratas, que sempre venceram no Estado.
Mas, para ser coerente com sua pregação, o futuro presidente Barack Obama terá que começar a forçar uma mudança de matriz energética que transforme os Estados Unidos de dependente do petróleo importado em consumidor de energias alternativas como os biocombustíveis.
Está havendo uma reação muito grande da opinião pública contra uma ajuda às montadoras aqui nos Estados Unidos sem que se mude o perfil da indústria automobilística, que teria que se adaptar às novas condições do mercado internacional, que será fortemente influenciado pela crise econômica que se desenha prolongada.
O Brasil, como pioneiro na tecnologia de fabricação do etanol a partir da cana-deaçúcar, e de outros biocombustíveis, está se preparando de várias maneiras para o que pode vir a ser uma mudança fundamental no mercado internacional.
A partir de amanhã, será realizada em São Paulo a “Conferência Internacional sobre Biocombustíveis: os biocombustíveis como vetor do desenvolvimento sustentável”, discutindo temas como segurança energética, produção e uso sustentáveis, agricultura, processamento industrial, além de questões ligadas a especificações e padrões técnicos, comércio internacional, mudança do clima.
O anúncio de que no campeonato de Fórmula Indy do próximo ano, uma competição tipicamente americana, será utilizado etanol brasileiro faz parte de um esforço de marketing para contrabalançar o poder dos produtores de etanol americanos, que contam com um forte subsídio governamental.
Em recente palestra na Universidade Columbia, o brasileiro Sérgio Trindade, especialista em combustíveis alternativos, ressaltou a necessidade de os biocombustíveis virarem commodities para competir no mercado internacional.
Trindade destacou que os países importadores como Estados Unidos e União Européia podem combinar a produção local com a importação, sendo necessário para que esse mercado internacional funcione um programa de certificação que seja reconhecido e adotado por todos.
O mercado ainda é incerto, atuando de maneira precária em Chicago, Nova York e São Paulo, com pouca liquidez e poucos contratos.
As barreiras tarifárias e sanitárias são questões ainda não resolvidas, além das condições de trabalho nas lavouras. A mecanização da lavoura de cana-de-açúcar, por exemplo, está reduzindo as queimadas e melhorando os salários no Brasil.
O Programa Brasileiro de Certificação de Biocombustíveis, que está sendo desenvolvido pelo Inmetro, vai dar atenção especial aos aspectos sociais e ambientais da produção dos biocombustíveis.
A parceria com o instituto nacional de metrologia dos EUA, prevista no memorando de entendimentos assinado entre os governos dos dois países, fará com que essas normas venham a ser incorporadas aos aspectos técnicos do produto, para que tenha uma uniformidade capaz de transformá-lo em commodity.
Os primeiros padrões de medição de alta qualidade para bioetanol e biodiesel já foram produzidos, e já existem cerca de 10.000 ampolas de materiais de referência certificados que serão em breve comercializados internacionalmente.
Paralelamente, estão sendo desenvolvidos novos métodos de análise para determinação da composição de biocombustíveis, bem como sua origem geográfica.
Foi criada também uma força-tarefa para harmonização das especificações de biocombustíveis, base para normas internacionais que estão sendo criadas.
O Inmetro está participando do Projeto Biorema, da Comunidade Européia, que objetiva realizar uma ampla capacitação dos laboratórios nacionais europeus para análises de biocombustíveis, através de um grande exercício de intercomparações de medições de padrões de alta confiabilidade, definidos pelo Inmetro e pelo NIST americano.
Também está sendo iniciada uma cooperação com o instituto metrológico alemão (PTB) para produção de padrões e técnicas analíticas especiais para biocombustíveis.
Todas essas medidas, no entanto, só terão consequência prática se o mercado internacional realmente for aberto, e para tanto os subsídios aos agricultores teriam que ser revistos tanto pelos Estados Unidos quanto pela Comunidade Européia.
A crise econômica internacional, no entanto, não sugere um momento propício para a abertura do mercado internacional.
Entrevista:O Estado inteligente
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