Merval Pereira
A reunião do G-20 errou a hora certa. Fora isso, há muito a dizer sobre ela. O grupo inclui 90% do PIB mundial, os países ricos e os dez maiores emergentes.
Não esteve presente o sol nascente, Barack Obama, mas sim George Bush, em seu ocaso.
Apesar disso, raios já começaram a ser enviados desde a reunião do Brasil, e eles iluminam idéias diferentes das que foram captadas em Brasília.
Muita gente está entendendo que a nova ordem mundial é para aumentar gastos públicos a qualquer preço, reduzindo a preocupação com a inflação para depois, ou melhor, ter “uma política monetária mais flexível”.
Mas os presidentes dos bancos centrais emitiram uma orientação, na reunião de São Paulo, que pode ser resumida numa frase: “de cada um, segundo suas possibilidades”.
Pode gastar quem tem superávit em transações correntes, quem tem uma situação fiscal sólida. É o caso da China, por exemplo.
Pode baixar juros e não se preocupar com inflação quem já está com seus índices em queda. A Inglaterra, em agosto, tinha uma previsão alta de inflação e, agora, fez outra previsão, bem mais baixa.
O Brasil já está com déficit em transações correntes e o quadro externo foi alterado para pior. Os preços das commodities caíram, o fluxo de capitais ficará reduzido, as empresas brasileiras terão que rolar US$ 40 bilhões no ano que vem. O pacote chinês, que pareceu tão abundante, na verdade é a antecipação, em dois anos, de projetos que seriam feitos em quatro anos. Aqui, a inflação permanece alta e pode subir com o impacto do dólar.
A interpretação de quem participou da reunião no Brasil dos bancos centrais do G-20, em São Paulo, é que, depois de 14 horas de discussão, os BCs foram muito cautelosos em prescrever expansão fiscal — como explicou o presidente do Banco Central Europeu, Jean Claude Trichet.
A possibilidade de usar a política anticíclica depende da inflação em cada país. O mundo acabou de ter uma onda inflacionária e ela está cedendo. Mas não em todos os países igualmente. A inflação subiu pelo impacto simultâneo da alimentação e da energia. Agora, a alimentação está em queda e a energia também. Nos países onde o mercado de energia é mais competitivo, nas economias industrializadas, principalmente, os preços subiram mais fortemente e, agora, caem mais rapidamente.
Não é o caso do Brasil, que tem um mercado dominado por empresa monopolista.
O IGP-10 divulgado semana passada mostrava que nos preços por atacado houve alta de 17,46% nos produtos para resinas e fibras e queda de 20% nos componentes Nafta.
O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC, disse que nunca viu variações dessa magnitude dentro de uma mesma cadeia. Mas o fato é que, mesmo quando se descontam os preços de alimentos e energia, a inflação no Brasil está alta, o que não acontece com países que estão reduzindo muito a taxa de juros.
— Ninguém concordou em abandonar o compromisso com as metas de inflação, apenas alguns países estão agora com uma situação mais confortável nesta área — explicou um participante da reunião.
No Brasil há um agravante.
Aqui, os índices de energia estão parcialmente indexados ao câmbio, como no caso dos preços de Itaipu.
O que significa mais pressão inflacionária.
Com déficit em transações correntes crescente e com uma inflação ainda alta, será um erro de tradução entender que o consenso a que se chegou nas reuniões do G-20, aqui e lá, foi que todos os países devem ter uma política expansionista fiscal e monetária.
Para nós, uma receita assim é perigosa, ainda que soe como música para quem já tem a propensão a elevar os gastos.
A reunião deste fim de semana não era para decidir nada, como a dos presidentes dos bancos centrais e dos ministros da Fazenda da semana passada também não. Mas elas começam a dar os primeiros passos no que pode vir a ser um movimento de mudança da arquitetura de governança do mundo. Nas questões práticas, a primeira definição é saber como será o super-regulador supranacional: se outro organismo a ser criado, ou se um FMI renovado. Se for o FMI renovado, mais urgente fica o segundo item da pauta, que é a mudança da estrutura de poder dentro do Fundo e a nova forma de capitalizálo.
Ele precisa de mais dinheiro e poder mais bem dividido. “Alguns países pequenos da Europa, como Holanda e Bélgica, têm mais poder do que o Brasil”, explica uma fonte do governo brasileiro.
O novo regulador, seja quem for, tem muito a fazer: submeter as agências de risco à supervisão; desenvolver padrões contábeis convergentes; eliminar as áreas livres de regulação, sejam setores ou territórios. Isso no momento da reorganização, após sanar a crise atual. Na parte política, o fundamental é encontrar o tamanho ideal do grupo. Já se sabe que 20 países é gente demais.
Tudo ficará mais fácil quando um novo governo, com a força poderosa do início de mandato, estiver na Casa Branca. Outras reuniões podem ser mais decisivas que esta. Aqui no Brasil, na reunião preparatória, a marca dessa travessia americana esteve presente até nas brincadeiras.
Trichet estava sentado à mesa de reunião ao lado de Tim Geithner, presidente do Fed de Nova York e cotado para a equipe do presidente eleito Barack Obama. Não resistiu a uma brincadeira que enrubesceu o colega: — Não sei se estou ao lado do presidente do Fed de Nova York ou do futuro secretário do Tesouro americano.
Em todas as áreas, estamos em tempo de definições.
oglobo.com.br/miriamleitao
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COM LEONARDO ZANELLI
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