Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, novembro 28, 2008

De falcões e pombos Merval Pereira


O Globo - 28/11/2008

Os ataques terroristas na Índia trouxeram novamente a questão da segurança nacional para o centro das preocupações dos americanos, que estariam sendo caçados em Mumbai e, no plano interno, de novo às voltas com ameaças de atentados no metrô de Nova York em pleno Dia de Ação de Graças. Assim, a apresentação da equipe que vai comandar a política de segurança nacional do futuro governo Barack Obama ganhou dimensões políticas maiores ainda do que normalmente já teriam, e as críticas de ambos os lados já cercam as escolhas, ainda não anunciadas oficialmente.

Os democratas mais empenhados no movimento pacifista vêem com desagrado escolhas como a de Hilary Clinton para a Secretaria de Estado, ou a permanência de Robert Gates na Secretaria de Defesa, que seriam sinais de que o espírito de "pombos" não estaria guiando a seleção do futuro gabinete.

A senadora Hilary Clinton, por exemplo, apoiou a Guerra do Iraque quando foi desencadeada, sendo inclusive criticada por isso por Obama durante a campanha, e também defende posições mais duras contra o Irã, aparentemente em desacordo com as idéias defendidas por Obama nos debates das primárias.

Ao mesmo tempo, republicanos belicosos criticam a ausência de "falcões" na equipe de Obama, no momento em que a ameaça terrorista já se mostrou novamente ativa. Se confirmar a manutenção de Gates à frente do Pentágono, o futuro presidente estará dando um caráter de urgência à primeira transição em tempo de guerra em 40 anos, optando por manter a operacionalidade do esquema de segurança já existente.

É inegável que uma transição desse nível, mesmo em tempos de paz, leva alguns meses para ser realizada com sucesso, e manter Gates significa que Obama não quer ficar um minuto de seu novo governo sem estar pronto para ações concretas contra o terrorismo.

Com uma longa carreira nos serviços de inteligência do governo dos Estados Unidos, sobretudo a CIA, Gates foi o primeiro nome cogitado para ocupar o novo ministério de segurança interna, criado logo depois dos atentados de setembro de 2001, mas recusou o convite para permanecer à frente de uma universidade no Texas.

Entrou para o governo Bush em 2006, depois de ter feito parte de um grupo de estudos bipartidário sobre a Guerra do Iraque, comandado pelo ex-secretário de Estado James Baker.

Gates tem condições de auxiliar o novo governo em duas políticas cruciais: o corte de programas militares não prioritários, na busca de equilibrar o orçamento interno, e ao mesmo tempo a retirada das tropas americanas do Iraque.

O cronograma de retirada dos 150 mil homens do Exército americano prevê um período de 16 meses, mas certamente esse projeto poderá ser ampliado caso as circunstâncias do momento indiquem a necessidade de um período maior.

Um dos principais objetivos do novo governo, o de transferir os esforços de guerra para o Afeganistão na busca dos terroristas da Al Quaeda, tem nos atentados da Índia talvez o primeiro sinal de reação na região.

Outros dois cargos de fundamental importância no esquema de segurança nacional já foram anunciados, e ambos mereceram críticas de republicanos mais radicais. A escolha da governadora do Arizona Janet Napolitano para o ministério da Segurança Interna foi vista como uma clara opção de dar prioridade às questões imigratórias, em detrimento à luta contra o terrorismo.

A governadora de um estado que faz fronteira com o México é vista como uma especialista na área de imigração, sem os conhecimentos necessários para atuar em outras áreas abrangidas pelo ministério, como a prevenção das drogas e o terrorismo.

Outra escolha criticada pelos republicanos foi a de Eric Holder para Ministro da Justiça, um antigo servidor do governo Clinton e ligado à senadora Hilary Clinton. Ele é acusado de ter ajudado Hilary na sua disputa pelo Senado em Nova York ao, como vice ministro da Justiça, ter apoiado o perdão dado pelo presidente Clinton a um grupo de terroristas de Porto Rico que colocou bombas em vários locais de Nova York, matando quatro pessoas em um restaurante.

O grupo Forças Armadas de Liberação Nacional (Faln) lutava pela independência de Porto Rico, que tem uma grande comunidade de residentes em Nova York. O fato é que os terroristas já estavam presos há 19 anos e uma comissão de prêmios Nobel da Paz, entre eles o ex-presidente Jimmy Carter, pediu a clemência, alegando que as penas eram muito maiores do que as normalmente atribuídas ao tipo de crime que haviam cometido.

Hilary, na sua campanha para o Senado, apoiou o perdão, mas depois retirou o apoio por que uma das condições da Casa Branca era de que os terroristas abdicassem da violência, o que eles se negaram a fazer depois de libertados.

O futuro ministro da Justiça, Eric Holder, foi um dos primeiros apoios na campanha de Obama dentro do Partido Democrata, assim como a governadora Janet Napolitano, e as duas nomeações estão sendo tratadas mais como uma recompensa política do que uma escolha técnica.

A verdade está no meio termo, e a de Obama não será uma equipe nem de "falcões" nem de "pombos", assim como a política de segurança nacional não será a continuação do espírito belicoso da era Bush, mas não será também dominada pela ingenuidade que muitos acusam Obama de ter.

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