Quem consegue chegar até lá já é por definição um vencedor. Vejamos o caso de Geraldo Alckmin, a quem se atribui a posse do troféu "dano irreparável" caso o eleitor não lhe dê amanhã uma chance de concorrer na final de 26 de outubro com Marta Suplicy.
Se terminar beirando os 20% como prevêem as pesquisas, na sua condição de vivente alimentado a votos, o tucano terá muito mais do que teria se tivesse ficado quieto no aguardo da legenda do PSDB para concorrer ao governo de São Paulo em 2010.
Exibiu-se teimoso, maculou a imagem de bom moço, passou a campanha às tontas sem saber direito qual história deveria contar no palanque, mas se exibiu. De todo modo está na boca do povo.
Contra isso há o argumento de que, sem a vaga no segundo turno, terá perdido a batalha interna para o governador José Serra. Além de uma meia-verdade, a assertiva parte de uma premissa falsa, pois Geraldo Alckmin nunca teve nem disputou a supremacia da influência na máquina do PSDB.
Nas duas vezes em que bateu de frente com Serra o confronto não chegou a se realizar. Em 2006, o então prefeito queria ser candidato a presidente, mas resolveu pular fora por avaliar que corria o risco de repetir 2002, quando ignorou as resistências, foi abandonado por sessões inteiras do partido e terminou vítima da teimosia e do excesso de confiança nos índices das pesquisas.
Em 2008, Serra poderia ter enfrentado Alckmin na convenção do PSDB e ganhado com as mesmas armas que levaram Gilberto Kassab do ostracismo à ante-sala do time de estrelas da política. Mas o custo seria enorme: ficaria com a fatura do "racha", contrataria novos obstáculos internos e prejudicaria a "naturalidade" da construção da futura candidatura presidencial.
Geraldo Alckmin conseguiu se impor duas vezes sem medir forças, só contando com a prudência estratégica do adversário.
Portanto, ganhou mais do que se tivesse ido para casa depois de deixar o governo de São Paulo, ficando à espera do que dificilmente viria. O entendimento com o grupo do governador, como se vê pelos termos em que se expõem essas relações, era a aposta menos rentável no campo das probabilidades.
Alckmin investiu muito além da medida de seus atributos - basicamente, dois: a condição de herdeiro de Mário Covas e uma suposta "predestinação" ao sucesso - e nem de longe pode dar-se por insatisfeito com a colheita.
Na pior das hipóteses, depois de amanhã terá atrás de si a cúpula do tucanato a reverenciar o valor de seu apoio. Na melhor, será dono de um passaporte ao paraíso.
A respeito de Kassab, sequer cabe análise nesse panorama visto sob a ótica das derrotas de cada um, porque seus ganhos são óbvios demais para quem entrou nessa quase por acaso, praticamente empurrado pelo então presidente do PFL, Jorge Bornhausen, para a vice de José Serra na municipal de 2004.
Marta Suplicy também está plenamente credenciada a participar do jogo do contente, mesmo que a maré do favoritismo vire no segundo turno e ela fique sem a prefeitura e, talvez, até sem a possibilidade de voltar ao ministério.
No cenário de deserto de nomes do PT para enfrentar Serra na preliminar em curso, Marta já fez um bonito danado. Carregou o partido na ponta das preferências a campanha toda e mostrou que, não obstante a rejeição quase matadora, é senhora de vários milhões de votos.
Perdendo, põe esse capital num belo estandarte, dá argumento para o PT paulista pôr em movimento a articulação de sua candidatura para governadora ou presidente em 2010 e ainda contará com a vantagem de se livrar de experiências já vividas.
Digamos que hoje interesse muito mais a Marta Suplicy uma disputa bem travada do que um resultado que a prenda às obrigações de ser prefeita. Se não conseguir ganhar, ainda assim o PT lhe será devedor, pois sem ela hoje muito provavelmente estaria fora da competição em São Paulo.
Se juntarmos a isso a posição lamentável do candidato do partido no Rio e a anulação da identidade petista em Belo Horizonte, enxergamos com nitidez a dimensão do serviço que Marta Suplicy - perdendo ou ganhando - prestou ao PT pelo simples fato de ser candidata.
E, por que não dizer, a si - por motivos quase iguais aos de Alckmin, guardadas todas as diferenças -, por renovar o patrimônio imobilizado desde a derrota de quatro anos atrás, e ao presidente Lula.
Com toda sua popularidade, ele não pôde circular à vontade na segunda e na terceira maiores cidades do País por conta da insuficiência de desempenho do PT. Na primeira, conseguiu fazer o papel de grande cabo eleitoral graças a Marta.
Contas pagas, no segundo turno, porém, a história será outra. Lula vai calibrar sua presença: nem tão perto que seja obrigado a dividir a derrota nem tão longe que fique impedido de repartir a vitória.