A calma voltou ontem para os mercados porque todos resolveram apostar que os políticos americanos não vão ficar no castigo dos banqueiros irresponsáveis. Parece que eles entenderam o recado mais importante, o de que banqueiro quebrado derruba o dinheiro do depositante e do aplicador, portanto, arrasta para o fundo também o eleitor que eles julgaram estar atendendo quando da rejeição do pacote do secretário Henry Paulson.
Mas, também para o Brasil, a tremedeira geral trouxe novidades. Até agora, o presidente Lula repetia que o País não seria atingido. A conversa já é outra. Ficou admitido que nem tudo vai continuar como antes. O crédito externo, por exemplo, está fechado e não voltará tão cedo a ser o que era. As empresas não vão encontrar financiamento fácil e provavelmente terão de comprar dólares no câmbio interno para pagar compromissos no exterior.
Mas a escassez de crédito também vai espraiar-se para as operações em reais. São vários os mecanismos pelos quais pode faltar esse dinheiro. Um deles tem a ver com o próprio mercado de capitais. Até há alguns meses, foi relativamente fácil para as grandes empresas emitirem ações. Mas essa temporada também ficou para trás. As empresas que agora precisarem de mais recursos para investimento ou para capital de giro terão de recorrer aos bancos e, assim, alijarão pessoas físicas do circuito do crédito.
Pode faltar dinheiro também para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Assim, o PAC, que já andava empacado, corre o risco de ficar ainda mais. E aí já vemos um desdobramento político. O presidente Lula contava com o show das obras públicas para promover a Mãe do PAC (ministra Dilma Rousseff) na sua candidatura à Presidência da República em 2010. Agora pode ter se atrapalhado em seus planos. Conforme for, a Petrobrás terá mais dificuldades para conseguir recursos para investir nos projetos do pré-sal.
Alguns observadores entendem que está no fim o ciclo de alta das commodities e, por isso, o Brasil vai perder receitas com exportações. Essa pode ser uma conclusão apressada porque não há certeza de que haverá redução da demanda de alimentos. A Ásia continuará crescendo em torno de 8% ao ano e isso significa que pelo menos mais 30 milhões de pessoas serão incorporadas anualmente ao mercado de consumo e, portanto, ao mercado de alimentos. Pode-se acrescentar ainda que o segmento de etanol nos Estados Unidos continuará retirando cada vez mais milho do mercado.
O crescimento econômico do Brasil vai ser mais baixo (provavelmente ficará pelos 3% em 2009) e, assim, a arrecadação de impostos também não será o que está sendo. Isso vai exigir reação do governo federal. Como não dá mais para aumentar a carga tributária, parece inevitável uma redução das despesas do governo. O momento está pedindo mais austeridade na condução das contas públicas.
Se o governo Lula puser em marcha um plano assim, não vai ser a malária que matará a economia brasileira.
Confira
Deixou de ser - Dois economistas que se consideram de esquerda e que, até há alguns meses, não poupavam críticas à política econômica do presidente Lula agora estão dizendo que a economia brasileira está bem mais preparada para enfrentar a crise financeira global.
São eles a professora Maria da Conceição Tavares, da PUC carioca e da Unicamp, e o atual representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional, Paulo Nogueira Baptista Júnior.
Ora, se a economia está melhor agora, não pode ser por outra razão senão pela política macroeconômica adotada.