Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 10, 2008

BARBARA GANCIA Quantos zeros há em um trilhão?



Os comodistas acreditaram na teoria do "efeito marola", e a greve dos bancários está aí para provar que a ficha não caiu


NESTA SEMANA, tive de me familiarizar com um termo que só me lembro de ter empregado com propriedade nas vezes em que o utilizei para quantificar células, moscas ou grãos de areia.
O termo é "trilhão" e foi muito usado nestes dias para enumerar as perdas deflagradas pela crise imobiliária nos Estados Unidos. Uns dizem que a ajuda prestada pelo governo norte-americano aos bancos, na ordem de US$ 700 bilhões, não chega nem mesmo à unha do mindinho do problema. Que para estancar a hemorragia que levou o sistema financeiro à UTI seriam necessários mais de US$ 3 trilhões (há quem fale em US$ 5 trilhões).
A calculadora que trago na cuca não consegue processar essa quantidade de zeros. Para falar a verdade, nem sei quantos zeros há em um trilhão e aposto um picolé de limão como muita gente (alô, nobre leitor!) também não saberia tirar essa informação do colete de bate-pronto.
Sou do tempo do milionário (palavra nascida no final dos anos 50 para definir quem possuía, em dólares, aplicações na base dos seis zeros, dinheiro que permitia viver com conforto por uma vida inteira sem trabalhar), da época em que os nojentamente ricos eram aqueles que tinham avião particular. Pois, há coisa de uns dez anos, tive de rever esse conceito do rico ser aquele que possui avião. Um meu amigo, que trabalhava para uma imensa multinacional européia, foi chamado pelo patrão para discutir seu bônus anual. O patrão marcou o encontro em uma de suas tantas casas de veraneio, em Vermont, nos Estados Unidos.
Lá chegando, meu chapinha deu de cara com uma cena inusitada. No jardim da casa do patrão, viu 12 ursos panda correndo livres. Não sei se a história procede, mas depois que a ouvi passei a considerar muito ricos só aqueles que possuem, além do avião, um punhado de pandas.
Mas, voltando à crise, do jeito que a coisa vai, até quem tem dois cães xexelentos sem pedigree, como é o meu caso, deve abrir o olho.
Lula disse há poucos dias que não seremos muito afetados pela crise e quem anda na rua percebe que os comodistas acreditaram piamente na teoria presidencial do "efeito marola". A greve dos bancários está aí para provar que a ficha não caiu.
Algo me diz que não é bem assim.
Mesmo quem não tem nenhum centavo no banco, não se chama Miguel ou mora em Niterói não deverá passar imune pelo tsunami.
Veja só: na Islândia, o sistema bancário derreteu e houve ameaça de corrida aos bancos; os Estados Unidos estão a ponto de recorrer ao FMI; o Citibank vai pelo mesmo caminho da Panair, Transbrasil, Vasp, Varig, TWA, Pan Am e Swissair e, em Paris, capital mundial do turismo, de um dia para o outro, os restaurantes ficaram às moscas. Trilhões delas.
Ainda não planejei minhas férias de fim de ano, mas estava pensando em visitar amigos em Washington.
Estava. Por conta das notícias dos últimos dias, já me conformei com a idéia de passar o Réveillon tendo o Faustão como companhia virtual. Ao menos a vantagem da adaptabilidade a gente há de ter sobre os muito ricos, não é mesmo? Como sobrevivente do Plano Collor, sou até capaz de hospedar no Natal algum panda sem-teto que tenha recém-chegado dos EUA.

barbara@uol.com.br
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