O Estado de S. Paulo |
9/12/2006 |
Ainda que não venha a resultar no cancelamento em massa de posses de eleitos e reeleitos nos respectivos mandatos, a “malha fina” da Justiça Eleitoral nas contas de campanha lança luz ao processo até então obscuro, e sobretudo leniente, de aceitação, às vezes com a inútil “ressalva”, de contabilidades irregulares. O novo padrão de análise já produziu como efeito prático três evidências: a condescendência anterior da Justiça, a displicência dos candidatos com a lei e o despreparo dos comitês financeiros na análise das doações e depois na prestação de contas aos Tribunais Regionais Eleitorais. Até agora foram contestadas as receitas e despesas do presidente Luiz Inácio da Silva, dos governadores eleitos José Serra (SP), Sérgio Cabral (RJ), Ana Júlia Carepa (PA) e Jaques Wagner (BA); dos reeleitos Blairo Maggi (MT), Cássio Cunha Lima (PB) e Wellington Dias (PI), além de 124 deputados, cujas prestações foram rejeitadas em pareces técnicos ainda passíveis de julgamento pelos tribunais. Há também um ou outro caso de impedimento de posse. Vale lembrar que pela nova legislação não são mais os tesoureiros das campanhas e sim os candidatos em pessoa os responsáveis pelos erros, tenham eles origem em equívocos ou em infração. É claro que todos os retidos na malha fina alegaram falha na análise da Justiça - sendo que o coordenador da campanha de Blairo Maggi apontou até a existência de “alguma esperteza” por trás da decisão do TRE-MT - ou se dispuseram prontamente a corrigir “erros técnicos”, como foi o caso da campanha presidencial que, no entanto, deixou sem explicação até agora a origem e o destino de R$ 10 milhões. Mas a reação do coordenador financeiro da campanha de José Serra, o ex-ministro José Gregori, foi a mais esclarecedora a respeito da situação. Vocalizando uma posição que é também a do governador eleito, Gregori disse que as exigências da Justiça não são “realistas”. Segundo ele, não se pode exigir de um candidato conhecimento pleno da condição legal de um doador para concluir se existe algum impedimento para doações. Referia-se às empresas com algum tipo de relação com concessões de serviços públicos. Ora, o candidato talvez não tenha mesmo obrigação de saber essas coisas, mas um comitê financeiro bem estruturado e preocupado com as questões legais - como convém - existe exatamente para isso. Se funcionarem como meros arrecadadores de recursos, ao molde dos coletores de impostos, realmente não terão condições de analisar detalhes e rejeitar doações que possam criar problemas depois na prestação de contas. Ao invés de se insurgir contra a lei e considerá-la dura demais, talvez até usando de seu poder de influência no Congresso para sugerir providenciais flexibilizações, os candidatos fariam um bem a si mesmos e ao sistema de um modo geral se se adequassem ao novo padrão de exigência, quem sabe gastando menos em propaganda e mais na montagem de equipes técnicas para cumprir os ditames legais. É o mínimo para quem pretende aprovar uma reforma política em que um dos pontos principais é a instituição do financiamento público das campanhas. Com a ligeireza atual no trato da prestação de contas, vista como mera formalidade, pois foi assim que a Justiça Eleitoral tratou do assunto até esta eleição, não estarão credenciados a pedir ao público pagante autorização para tirar recursos do Orçamento para financiar campanhas cujas contas não estejam acima de qualquer suspeita. Fiscal de emenda Vice-presidente da agonizante CPI dos Sanguessugas, o deputado Raul Jungmann entregou nesta semana um oficio à Controladoria-Geral da União pedindo que suas emendas ao Orçamento sejam fiscalizadas previamente e submetidas a auditoria permanente. Com isso, Jungmann pretende incentivar os colegas de Congresso a fazer o mesmo. “É uma forma simples de prevenir equívocos, inibir a corrupção e dividir o peso da responsabilidade da correta utilização dos recursos do Orçamento com o Poder Executivo”, diz ele. A idéia surgiu dias atrás, quando o controlador-geral, Jorge Hage, e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, estiveram no Congresso para discutir formas de combater a corrupção sistêmica. Durante a audiência, Jungmann perguntou se a CGU poderia fazer esse trabalho de auditagem e fiscalização prévias. Jorge Hage disse que sim e na última terça-feira confirmou a possibilidade, quando o deputado esteve em seu gabinete para formalizar o trato. “Não precisa projeto de lei, investigação nem burocracia, é só confiar nos instrumentos de Estado”, pondera o deputado. Pontuação A derrota do candidato petista para a vaga no Tribunal de Contas da União pode mesmo indicar dificuldade para o Planalto na eleição da presidência da Câmara, mas não necessariamente. Desde 2003 o governo perdeu todas nas indicações para o TCU, mas ganhou duas vezes a presidência da Câmara. A resistência não parece ser ao governo, mas ao PT. |
Entrevista:O Estado inteligente
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segunda-feira, dezembro 11, 2006
Dora Kramer - Malha fina eleitoral
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