As idas e vindas na discussão do pacote ilustram a ausência de estratégia, e não se sabe bem o que o governo deseja |
Pacote e estratégia são coisas diferentes. O pacote é um amontoado de medidas de natureza diversa.
Sua edição dá a falsa impressão de que as autoridades estão tomando as providências necessárias. Os pacotes contêm, freqüentemente, iniciativas arquivadas no passado ou que estão em vigor e que acabam sendo apresentadas sob nova embalagem. A reedição, sob a forma de um pacote, constitui mero evento de oportunidade. Quase sempre uma medida estranha, que não guarda relação com as demais, é incluída apenas a título de "carona".
Logo depois das eleições, a discussão em torno de um pacote fiscal chegou a sugerir mudanças de natureza estrutural. No entanto diferentes hipóteses foram sendo eliminadas, até sobrar uma desoneração tributária pontual, cuja dimensão será definida nas próximas semanas. Esta última pode gerar resultados setoriais, mas não muda a taxa de crescimento da economia em bases permanentes.
Além disso, introduz regimes especiais de impostos, aumentando a complicação e o grau de distorção do sistema. Redução de impostos é bem-vinda em um país que taxa cerca de 40% do PIB (Produto Interno Bruto). Mas precisa estar articulada a um projeto de médio e longo prazos de redução gradual da carga tributária. Isso equivaleria a perseguir a diminuição da carga para algo entre 30% e 35% do PIB, no espaço de uma década.
Uma estratégia envolve, portanto, algo muito mais abrangente do que um pacote. Compreende três elementos principais. Em primeiro lugar, um objetivo claro a ser perseguido. No caso brasileiro, a meta geral deveria ser a de resgatar a vocação de crescimento do país, perdida nos últimos 25 anos. Em segundo lugar, um diagnóstico preciso do problema a ser enfrentado e dos possíveis instrumentos disponíveis para tal tarefa. Em terceiro lugar, um cronograma de implementação e de verificação de resultados, de forma a assegurar o cumprimento das metas.
As idas e vindas na discussão do pacote de Natal ilustram a ausência de estratégia. Não se sabe bem o que o governo deseja. Inicialmente, a expansão do PIB em 5%. Agora, algo menor do que isso por um período de tempo indeterminado.
Tampouco há um diagnóstico claro acerca das causas da semi-estagnação. Depende da ala do governo. As opiniões variam e se contradizem entre os ministérios e, não raro, dentro de cada ministério. Pior ainda, as opiniões de uma mesma autoridade oscilam ao longo do tempo!
Os eventos desta semana são ilustrativos. Os ministérios do Trabalho e da Previdência Social negociaram o reajuste do salário mínimo para R$ 380, o que eleva de forma excessiva os gastos correntes do governo, especialmente os da Previdência. A proposta não contou com o apoio do Ministério da Fazenda e não parece estar articulada a qualquer programa. Foi o que se obteve na mesa de negociação e pareceu conjunturalmente conveniente na relação com as centrais sindicais.
Ocorre que a elevação de gastos correntes diminui ainda mais o limitado espaço para o crescimento do investimento público. Este último é complementar às inversões privadas, especialmente nas áreas de infra-estrutura. Assim, a negociação do valor do salário mínimo conflita com o objetivo de elevar o investimento e, por conseguinte, com a aceleração do crescimento da economia.
A Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) das Nações Unidas divulgou nesta semana o desempenho dos vários países latino-americanos em termos de crescimento. Embora majoritário, o peso da produção brasileira no PIB da América Latina diminuiu de 32% em 2002 para 30% em 2006. Na América do Sul, a redução foi de 54% para 47% nos mesmos anos.
Tal fenômeno de perda de posição no cenário internacional é ainda mais acentuado quando se compara o Brasil com a China, a Índia e outros países asiáticos. Em persistindo a falta de estratégia de crescimento, tal processo deve continuar, independentemente de quantos pacotes econômicos estiverem em gestação.