Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 28, 2006

Celso Ming - Tapete lambuzado




O Estado de S. Paulo
28/12/2006

Caiu um pote de melado no tapete vermelho da TAM, símbolo do tratamento VIP a qualquer passageiro.

A tragédia da hora não é mais a bagunça do controle de vôo. Tem nome inglês, intraduzível para o português: overbooking. É a prática, comum nas companhias de transporte de passageiros (e não só entre as aéreas), de vender bilhetes demais em relação aos assentos disponíveis. Isso às vezes acontece também em espetáculos de artistas, jogos de futebol e sessões de cinema.

No caso das companhias aéreas, o overbooking baseia-se na suposição de que, em todo vôo, alguns passageiros não comparecem ao embarque (no show).

Se uma loja não vende um aparelho de TV, pode manter a mercadoria na prateleira e oferecê-la ao freguês seguinte. No transporte aéreo, assento não vendido em vôo realizado é faturamento perdido para sempre. O overbooking evita que a aeronave opere abaixo da sua capacidade.

Na maioria das vezes, é conseqüência do comportamento dos passageiros. É comum reservar lugares em vôos ou companhias diferentes para se prevenir de eventuais contratempos, especialmente quando a viagem é muito importante. Ou o passageiro manda bloquear assento na classe turística e na executiva para deixar a opção para a hora do check-in, quando tiver informações sobre a ocupação da aeronave e se poderá ou não se refestelar sobre três poltronas.

A incidência de no show varia conforme a temporada, o dia da semana, a hora do vôo ou, então, conforme simples variáveis meteorológicas, que podem fechar um aeroporto. Mesmo em situações normais, o setor de transportes aéreos já está listado entre os mais sujeitos a imprevistos.

A legislação prevê que a companhia aérea acomode o passageiro no vôo seguinte ou no de outra empresa. E deve cuidar da hospedagem, translados e eventuais outras compensações. Há empresas que oferecem diárias em dinheiro e/ou transferência para classe superior (upgrade).

Mas, em situações como as de agora no Brasil - em que os aeroportos viraram um caos; os vôos atrasam ou são cancelados; as conexões não se realizam ou só são possíveis horas ou dias depois; problemas mil têm de ser resolvidos improvisadamente -, fica complicado administrar conflitos produzidos por overbooking.

Como nos acidentes aéreos, a lista de responsáveis desta crise não deixa ninguém incólume: governo Lula, Ministério da Defesa, Aeronáutica, a categoria dos controladores de vôo, a Infraero, a Anac e, claro, as companhias aéreas, cada um com seu quinhão.

No caso da TAM, é possível identificar duas agravantes. A primeira foi a maneira com que se lançou sobre as fatias de mercado abandonadas pela Varig. Atirou-se com pressa demais ao pote e acabou se lambuzando, com sobras de melado espalhadas sobre o tapete.

Outra agravante é a concorrência na faixa das baixas tarifas. A TAM vem tendo de administrar conflitos entre objetivos estratégicos. Quer manter a imagem de empresa de alto padrão de atendimento e, ao mesmo tempo, encarar a competição feroz da Gol, que assumidamente ocupa o segmento do low cost, low fare (baixo custo, baixa tarifa).

E isso cobra lá seu preço.

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