Dora Kramer - Governo aceita pressões, aceita prejuízo e já não se preocupa em condenar ações do MST |
O Estado de S. Paulo |
2/12/2006 |
Depois de seis meses de trégua eleitoral, antecedida pela invasão de nada menos que o Congresso Nacional, os sem-terra agora reunidos em novas e diferentes denominações voltaram à atividade (criminosa), ousados como sempre: desta vez paralisaram por 12 horas o porto de Maceió, impedindo embarque e desembarque de mercadorias. A "ocupação" só não foi mais duradoura porque as autoridades constituídas atenderam de imediato a exigência e providenciaram o início do processo de desapropriação de 20 mil hectares de uma fazenda no oeste de Alagoas. Não chegou a haver sequer um embate de interesses. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), cuja sede na capital alagoana havia sido invadida na terça-feira, concordou célere com a negociação - vale dizer, rendição - e os revoltosos, então, concordaram em deixar o porto. Ainda assim, horas depois. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, não chegou a condenar a ação, limitando-se ao queixume brando. Disse que os sem-terra foram "longe demais" e que houve um "exagero". Não por nada não, mas porque, segundo ele, "o Incra fez todos os esforços para obter a imissão de posse da fazenda". Quer dizer, para ele a invasão foi um ato de injustificada impaciência e nada mais. Os prejuízos de paralisação no trabalho de escoamento da produção das usinas de açúcar e álcool não sensibilizaram a autoridade, como também há muito já não sensibiliza ninguém no governo o fato de essas organizações desprovidas de configuração jurídica afrontarem sistematicamente a ordem legal. Até há pouco tempo, havia pelo menos a preocupação de condenação formal das ações. Agora o poder público realiza o prejuízo, reclama da contundência na forma da reivindicação, atende de pronto as exigências e praticamente pede desculpas pelo mau jeito. Com isso, no caso dos sem-terra chegamos à institucionalização da ilegalidade como rotina. A leniência governamental nos diz a todos e aos invadidos - de fato e em potencial - em particular: acostumem-se, pois é assim que é. Mal comparando, é mais ou menos como ocorre nos aeroportos, onde o caos dos atrasos virou também coisa rotineira. O governo simplesmente não toma conhecimento da situação nem se sente obrigado a garantir os direitos individuais de propriedade e os coletivos de ir e vir. Enquanto isso, o líder João Pedro Stédile avisa que tem mais e manda dizer ao presidente Luiz Inácio da Silva que os sem-terra não são seus "compadres". Um ingrato esse moço, pois são sim e com autorização para anarquizar com o estado de direito como bem lhes aprouver. O PT e o PMDB precipitaram, e pelo visto em decisão conjunta, a formalização de seus pleitos para disputar a presidência da Câmara, sem guardar reverência à alegada predileção do governo pela continuidade do atual presidente, Aldo Rebelo. E o fazem em reação à anunciada disposição do presidente da República de compor o ministério só depois de resolvida a questão do comando do Congresso. Em ambos partidos vigora a forte desconfiança de que Lula não manterá a decisão, só a anunciou para pôr um freio de arrumação na ambição de seus aliados. Apresentando as candidaturas, dando a disputa como fato consumado, PT e PMDB acreditam que o presidente seja forçado a abrir um pouco o jogo e comece a conversar com eles sobre os dois assuntos concomitantemente. Noves fora Para tentar entender melhor qual será o benefício objetivo que o PMDB unido renderá ao governo Lula - já que a benesse em vice-versa é auto-explicável - é só inverter a questão: qual foi mesmo o malefício que os neo-adesistas impuseram ao governo nos quatro anos durante os quais se denominaram de oposição? Nenhum, a não ser impedir Lula de exibir o troféu da aliança formal, cujo sentido é o da ampliação da distribuição de cargos e, como bem diz o senador eleito Jarbas Vasconcelos - ele mesmo um oposicionista ultralight como governador de Pernambuco -, tem prazo de validade a vencer a partir das insatisfações resultantes da partilha. Nas votações no Congresso, o PMDB dividido não chegou a influir na imposição de derrotas significativas ao governo, durante os escândalos de corrupção não amolou os acusados nas comissões de inquérito, não teve participação adversária de significado nas tribunas da Câmara e do Senado - excetuando-se o senador Pedro Simon - e na derrota do PT para Severino Cavalcanti pela presidência da Câmara ficou com o candidato oficial, Luiz Eduardo Greenhalgh. O que poderão fazer agora, e não fizeram antes, pois o Palácio do Planalto achava que já estava bem servido por Renan Calheiros e José Sarney, é emprestar ao presidente Lula o know-how amplamente utilizado no governo Fernando Henrique de acionar os tratores governistas para passar por cima da oposição quando a ocasião assim exigir. |
Entrevista:O Estado inteligente
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segunda-feira, dezembro 04, 2006
Dora Kramer - Governo aceita pressões, aceita prejuízo e já não se preocupa em condenar ações do MST
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