Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Celso Ming - O suspeito de sempre

Celso Ming - O suspeito de sempre


O Estado de S. Paulo
2/12/2006

Na falta de uma solução salvadora para os males da economia, vigora no Brasil uma espécie de rotatividade na escala de bodes expiatórios.

Durante os últimos três anos, o principal culpado por tudo quanto de ruim acontecia na economia eram os "juros escorchantes". Eram acusados de serem diretamente responsáveis pelo alto Custo Brasil e pela falta de crescimento econômico. E porque estimulavam a especulação financeira, ajudavam a formar um câmbio hostil à produção e à criação de empregos.

Como, de setembro de 2004 até agora, os juros básicos (Selic) caíram 6,5 pontos porcentuais, vai sendo formada a percepção de que eles já não explicam o câmbio achatado e o medíocre crescimento econômico. Daí por que foi preciso apontar outra vítima atroz, naturalmente o câmbio.

A economia brasileira é relativamente fechada. O comércio exterior (exportações mais importações) não equivale a mais do que 30% do PIB. Apenas para comparar, o da China é de 86% do PIB. Um câmbio bem mais valorizado do que há quatro anos talvez explique o menor dinamismo das exportações e o maior das importações. Mas não explica o baixo crescimento econômico.

Como adverte o professor Roberto Padovani, da Tendências Consultoria, é preciso buscar as causas do baixo crescimento não no relativo emperramento do setor externo, mas nas condições internas.

Afora isso, o PIB anual brasileiro equivale a alguma coisa ao redor dos US$ 900 bilhões e as importações de 2006 talvez nem cheguem aos US$ 100 bilhões (11,1% do PIB). Dá para dizer que importações baratas estejam apertando certos setores da indústria, mas não dá para dizer que sejam importante fator de estancamento de todo o PIB brasileiro.

O presidente da Funcex, Roberto Giannetti da Fonseca, lembrou ontem que o câmbio só se equilibrará quando o País crescer e as importações aumentarem. Ou seja, o câmbio equilibrado é o resultado do crescimento - o que é diferente de dizer que o câmbio desequilibrado contém o avanço do PIB.

O Ministério do Desenvolvimento já divulgou as estatísticas da balança comercial de novembro. E lá se viu que o saldo (exportações menos importações) deve fechar este ano ao redor dos US$ 45 bilhões. Se as condições do câmbio brasileiro fossem tão adversas, como tem sido alardeado, as exportações (que crescem ao ritmo de 17,2% ao ano e, neste ano, deverão ser 44% mais altas do que as importações) não estariam exibindo toda essa força. E, aí sim, o estrangulamento das vendas externas estaria de fato pesando no avanço do PIB.

Desde que atingiu R$ 3,90 por dólar, os exportadores estão reclamando de que o câmbio está baixo demais. De lá para cá, não param de anunciar a gestação de um apagão exportador, por pura falta de câmbio. Não há o menor indício de que um colapso assim esteja para acontecer.

As cotações do câmbio interno estão girando em torno dos R$ 2,17 por dólar. Só não caíram abaixo de R$ 2 por dólar porque o Banco Central não pára de comprar moeda estrangeira e de entesourar reservas. E, no entanto, as exportações seguem crescendo, como ficou dito, graças à forte demanda externa, não só por commodities, mas também por produtos manufaturados. Este é, em princípio, o segmento mais sensível às variações de câmbio. Mas não está em fase de definhamento. Ao contrário, pesa 54,1% na cesta total de exportações e cresce a 15,0% ao ano.

As travas mais importantes ao crescimento econômico não estão nos juros altos nem tampouco no dólar barato - embora esses fatores também exerçam lá seu peso. Quem quer identificar essas travas deve seguir outras pistas. Entre os principais suspeitos estão: o baixo estoque de capital (investimentos insuficientes) que não garante produção futura; a precária infra-estrutura do País, que puxa pelos custos de produção e distribuição; as confusas regras do jogo (marco regulatório), que afastam os empreendedores; a altíssima carga tributária, que pouco deixa para o consumo e para o investimento; e, enfim, a enorme gastança do setor público, que puxa a dívida e os juros e derruba o crédito.

E-mail: celso.ming@grupoestado.com.br

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