Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 21, 2006

Depois do recuo



EDITORIAL
Folha de S. Paulo
21/12/2006

Parlamentares desistem de aumento salarial absurdo, mas têm ainda uma extensa agenda moralizadora a enfrentar

NÃO FOI simplesmente um recuo. As lideranças da Câmara e do Senado foram compelidas, contra a sua vontade, a abandonar a idéia de dobrar o salário dos congressistas. Persistir no desatino, a esta altura dos acontecimentos, equivaleria a declarar guerra à opinião pública.
Com o recesso parlamentar à porta, tudo o que os porta-bandeiras dos supersalários desejam agora é que o assunto seja logo esquecido. Quem incitou a batalha e depois bateu em retirada torce para que a sociedade se satisfaça com o recuo. Mas a volta atrás em nada altera a agenda necessária para o Congresso recuperar a credibilidade, massacrada nos últimos quatro anos.
A tentativa de elevar ao teto do funcionalismo os vencimentos dos congressistas lançou luz sobre um dos tópicos dessa agenda depuradora. Trata-se de dar respostas ao descontrole do gasto público que ainda prevalece no Poder Legislativo -problema que também existe no Judiciário e no Ministério Público.
Apenas as duas Casas do Congresso custarão ao contribuinte R$ 6 bilhões em 2007, dotação equivalente à alocada para o Ministério de Minas e Energia ou à prevista para Ciência e Tecnologia -sabe-se de antemão que estes, à diferença de Câmara e Senado, terão seus dispêndios contingenciados ao longo do ano.
No que concerne às despesas com folha de pagamento no Legislativo federal, elas tiveram um crescimento acima da inflação de 26% ao longo da atual legislatura. No mesmo período, os dispêndios com servidores no Poder Executivo -no qual há alguns anos se instalou uma cultura de controle dessa espécie de despesa- evoluíram bem menos (7,5%) em termos reais.
O Senado, particularmente avesso a prestar contas orçamentárias, poderia tentar explicar por que seus gastos com pessoal explodiram em quatro anos: subiram mais de 50% acima da inflação! As duas Casas em conjunto -e o Tribunal de Contas da União- estão convidadas a explicar o motivo pelo qual aumentaram em 18% o seu quadro de funcionários de 2003 a 2005.
A propósito, o que fazem exatamente os mais de 36 mil servidores alocados no Legislativo federal e no TCU permanece um grande mistério.
Depende apenas das lideranças no Congresso o início de um programa de combate à gastança legislativa. Poderiam de saída dar o exemplo, reduzindo drasticamente as verbas extras que levam o custo mensal de um parlamentar no Brasil para o patamar dos R$ 100 mil.
Antecipando-se à pressão do Executivo e da sociedade, parlamentares deveriam tomar para si a iniciativa de aprovar mecanismos impedindo o aumento de despesas com pessoal. Seria um passo inicial para exercerem o mesmo tipo de controle sobre as Assembléias Legislativas.
Após quatro anos de devastação, o Congresso Nacional necessita de estadistas.

Arquivo do blog