Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, setembro 01, 2006

Luiz Garcia - A terceira vez



O Globo
1/9/2006

Todos ou quase todos os estados americanos têm em suas leis penais a figura do third-time loser. É o cidadão que comete um crime violento pela terceira vez. Quando acontece, ele é condenado automaticamente à prisão perpétua, mesmo que a última derrapada tenha sido um discreto assalto à mão armada sem um tiro disparado.

O nosso PT talvez corra o risco de ser três vezes perdedor. Na atual administração, o partido já se queimou duas vezes por tentar colocar sela e freio na mídia nacional. E a terceira - nada oficial, apenas até agora algo pensado dentro do partido - acaba de ser revelada. Foi a proposta de um grupo de trabalho associado à montagem do programa de governo para os próximos quatro anos, descoberta pela "Folha de S. Paulo".

Não há menção dela no programa conhecido. Mas é bom saber o que pensam aqueles que, dentro do PT, são encarregados de ter idéias sobre a comunicação de massa.

E esse pessoal propôs uma forma bastante marota de "democratizar os meios de comunicação". É bom lembrar que em suas duas investidas nessa área o governo petista primeiro tentou criar uma "Agência Nacional do Audiovisual" e depois encampou a proposta de um "Conselho Federal de Jornalismo". As duas iniciativas foram denunciadas como formas manifestamente ilegais de controlar os meios de comunicação. Isso era tão evidente que o Planalto teve a sabedoria de recuar para diminuir o prejuízo.

Na proposta agora conhecida, pretende-se acabar com o que seria um "desequilíbrio concorrencial" na mídia. O primeiro passo seria um recadastramento das concessões de TV e rádio, o que levaria a uma regulamentação da concorrência para impedir a "concentração do setor". É difícil imaginar como se produziria isso. Tarcísio Meira, por exemplo, se fizesse duas novelas na Globo, teria de atuar em seguida numa da Record? Fátima e William não podem trabalhar no mesmo canal? É patético. Tem mais: "conselhos populares" opinariam nas concessões de rádio e TV.

Na mídia impressa fica mais engraçado ainda. O governo providenciaria "incentivos econômicos", com recursos inclusive oficiais, "para o desenvolvimento de jornais e revistas independentes, não veiculados aos grandes grupos de comunicação". Coerentemente, o pessoal que produziu essa pérola a declarou adequada à necessidade de encarar a comunicação de massa como "tarefa politicamente estratégica do governo". Óbvia estratégia: jornais e revistas financiados pelo governo seriam certamente mais fiéis ao Planalto do que aos seus leitores.

Enfim, tudo uma grande bobagem. E com certeza não vai longe, se é que já não foi engavetada. Acreditemos, todos juntos: Lula não se arriscaria a ser, nessa área, um perdedor três vezes.

Mas é bom a gente não esquecer que o preço da liberdade é a eterna disposição de pôr a boca no trombone.

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