Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, setembro 20, 2006

DOSSIÊ COMPLICA CADA VEZ MAIS O PT



Gustavo Krieger e Helayne Boaventura
Correio Braziliense
20/9/2006

Aumentam as suspeitas de que o PT está envolvido na compra de dossiê que ligaria José Serra, candidato pelo PSDB ao governo de São Paulo, à máfia dos sanguessugas. Em nota, ontem, a revista Época revelou que, há duas semanas, foi procurada por Oswaldo Bargas (foto) e Jorge Lorenzetti. Um dos responsáveis pela elaboração do programa de governo da campanha de Lula à reeleição, Bargas disse à revista ter documentos que seriam capazes de “desmoralizar” Serra. Ressaltou que não falava em nome do PT nem do governo. E afirmou que o presidente do partido, Ricardo Berzoini, sabia que iriam falar com a revista, mas não conhecia a documentação contra o tucano. Época não se comprometeu a publicar nada, sem antes ver o material. Uma semana depois, a IstoÉ publicaria reportagem em que Serra é acusado de envolvimento com sanguessugas. Chefe do núcleo de inteligência da campanha de Lula, Lorenzetti pediu demissão. Berzoini confirmou que foi avisado do contato dos dois com Época, mas negou conhecer o dossiê. Em entrevista, o ministro Tarso Genro disse que Lula está “perplexo” com o episódio. E cobrou explicações do PT. Para Tarso, se for comprovado que integrantes do partido participaram da compra do dossiê, a pena tem que ser em dobro.

Oswaldo Bargas, homem de confiança do presidente do PT, tentou oferecer dossiê a uma revista. deputado admite o “contato”

Mais um personagem ligado à cúpula do PT foi envolvido na operação de compra de um dossiê contra políticos tucanos. A revista Época divulgou ontem nota na qual conta ter sido procurada há duas semanas por Oswaldo Bargas, ex-secretário do Ministério do Trabalho e hoje responsável pelo capítulo sobre Trabalho e Emprego do programa de governo da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição. Bargas ofereceu à revista “denúncias fortes o suficiente para desmoralizar o candidato do PSDB ao governo do estado de São Paulo, José Serra, e o ex-ministro da Saúde Barjas Negri.” Ele é muito próximo ao presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, de quem foi um dos principais assessores no Ministério do Trabalho.

Bargas é casado com Mônica Zerbinato, secretária particular de Lula desde os tempos do Instituto da Cidadania. Figura discreta e de uma fidelidade absoluta a Lula, Mônica trabalha no Palácio do Planalto e é responsável pelos compromissos não-oficiais do presidente, incluindo os familiares.

Segundo a Época, no dia 6 de setembro um repórter da revista reuniu-se com Bargas em um hotel de São Paulo. Estava presente Jorge Lorenzetti, que chefiava o núcleo de inteligência da campanha de Lula, também é suspeito de envolvimento na compra do dossiê. Na reunião, Bargas não mostrou o material sobre as denúncias, mas disse que elas eram embasadas em “farta documentação”. A revista disse que não se comprometeu com a publicação antes de ler o material e Bargas informou que a fonte havia desistido. Uma semana depois, conteúdo semelhante foi publicado pela revista IstoÉ.

A nota da Época diz que “durante o encontro, Bargas e Lorenzetti disseram várias vezes que aquela reunião nada tinha a ver com o PT nem com o governo. Aquele encontro, segundo eles, servia apenas para sondar o interesse da revista. Bargas afirmou que Aloizio Mercadante (PT), concorrente de Serra na disputa pelo governo de São Paulo, não sabia das denúncias nem da reunião. Disse ainda que, no PT, apenas o presidente do partido, Ricardo Berzoini, havia sido avisado do encontro com o repórter para passar informações de interesse da campanha. Berzoini, segundo Bargas, não tinha conhecimento do conteúdo do material.”

A versão
A revelação da revista complica a situação de Berzoini. Na segunda-feira, em uma entrevista coletiva, ele disse que só tomou conhecimento do envolvimento de petistas na compra do dossiê quando eles foram presos, na sexta-feira passada em São Paulo. Ontem, em nota oficial, reconheceu: “De fato, tive conhecimento de que um integrante da nossa campanha manteria contato com a Época para tratar de uma pauta de interesse jornalístico”. Mas repetiu: “Jamais tive ciência do conteúdo abordado nesse encontro”.

Ex-diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Bargas faz parte de uma geração de sindicalistas que chegou ao poder com Lula. Os dois foram cassados pela ditadura militar após a greve de 1983. Ainda no movimento sindical, foi secretário de Relações Internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT), de São Paulo. Com a eleição de Lula, foi chamado por Berzoini para chefiar a Secretaria Nacional de Relações do Trabalho. Com a chegada ao mais alto posto do Ministério do Trabalho de outro sindicalista, Luiz Marinho, ex-presidente da CUT, tornou-se chefe de gabinete do ministro.

Lorenzetti sai da campanha



Lorenzetti pediu demissão depois do escândalo

O petista Jorge Lorenzetti pediu demissão ontem da chefia do núcleo de inteligência da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição. Apontado como um dos articuladores da tentativa de compra de um dossiê ligando políticos tucanos à máfia dos sanguessugas, ele pediu afastamento em uma carta enviada ao presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini. A carta tem mais contradições que explicações. Lorenzetti não deixa claro seu papel no episódio.

“Julgo ter extrapolado os limites de minhas atribuições como assessor de risco e mídia da coligação A Força do Povo, mas, nada obstante, afirmo taxativamente que em momento algum autorizei o emprego de qualquer tipo de negociação financeira na busca de informações relacionadas a adversários políticos”, diz o texto, que completa: “Minha participação no episódio circunscreveu-se tão- somente em solicitar que fosse averiguada a autenticidade dessas informações, visando, exclusivamente, contribuir para a correção de uma injustiça que vem sendo cometida contra o Partido dos Trabalhadores no escândalo conhecido como a máfia dos sanguessugas.”

Lorenzetti segue o mesmo roteiro adotado pelo ex-assessor especial de Lula, Freud Godoy, também suspeito de envolvimento na compra do dossiê. Os dois negaram envolvimento com as irregularidades mas pediriam demissão, para tentar controlar a crise. Assim como Freud, Lorenzetti ofereceu-se para depor na Polícia Federal. A PF deve marcar o depoimento dele para os próximos dias.

Lula já pediu publicamente um voto de confiança em Lorenzetti. Na cerimônia de lançamento do pólo de fruticultura do Pará, em 21 de agosto de 2003, o presidente aconselhou os agricultores que confiassem nas pessoas que estavam ali, entre elas estrangeiros da Organização Intereclesiástica para a Cooperação ao Desenvolvimento, da qual Lorenzetti era dirigente. “Possivelmente, a maioria dos pequenos agricultores ainda não tenha dimensão do significado de confiar em uma pessoa que vem do estrangeiro para ajudar, confiar no Jorge Lorenzetti, que é de Santa Catarina e que faz relação internacional”.

Ironicamente, no encerramento da carta de demissão, Lorenzetti diz: “Desde já, apresento minhas sinceras desculpas se não correspondi à confiança depositada em minha pessoa”.

Arquivo do blog