Edson Silva - 22.jun.2006/Folha Imagem | O candidato em SP José Serra, que ataca governo Lula por corte de repasse de verbas ao Estado |
Alckmin é mais evasivo, mas também identifica "coisas estranhas" nos ataques
Candidato ao governo do Estado menciona panfletos e gravações atribuídas ao PCC, mas não mostra provas de envolvimento de petistas
LEANDRO BEGUOCI
ENVIADO ESPECIAL A JALES
SILVIO NAVARRO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Em Brasília, o candidato tucano à Presidência, Geraldo Alckmin, foi evasivo: disse que há "coisas estranhas" por trás da série de ataques do PCC (Primeiro Comando da Capital) e que a polícia deve investigar "qual a origem e quem está por trás de tudo isso".
Bornhausen e o candidato a vice na chapa de Alckmin, José Jorge, voltaram ontem a tentar envolver o PT na onda de atentados em São Paulo. O presidente nacional do partido, Ricardo Berzoini, acusou a oposição de oportunismo. O PT estadual anunciou que ingressará com uma notícia crime na Justiça Eleitoral contra Serra (leia na página A6).
Ao mencionar os supostos "indícios" de envolvimento do partido adversário com a facção criminosa, Serra afirmou: "Basta você olhar os manifestos do crime organizado, o que eles dizem sobre a política, coisas que se diz que eles [criminosos] dizem, inclusive nas gravações. É fato que uma das cooperativas de perueiros em São Paulo é ligada ao ex-secretário de transportes de São Paulo [Jilmar Tatto, durante a administração de Marta Suplicy]. Chegou-se, inclusive, a ser pedida a prisão dele. Há ligações notórias com esse pessoal."
O candidato não explicou a que gravações se referia. A Folha apurou que grampos telefônicos feitos em maio pela polícia paulista revelaram supostas ordens de um dos líderes do PCC a seus subordinados para que atacassem políticos do PSDB e poupassem petistas. Os atentados contra políticos, porém, nunca ocorreram.
A menção indireta a Tatto se deve a um inquérito da Polícia Civil de Santo André, no qual o ex-secretário e outras sete pessoas são acusadas de ter influência sobre perueiros supostamente ligados ao PCC. A polícia pediu a prisão do petista, mas a Justiça considerou não haver provas contra ele. Para Tatto, as insinuações dos tucanos e pefelistas se devem a "desespero" (leia na página A6).
Antes de comentar as declarações de Bornhausen, Serra já havia insinuado que a onda de atentados promovida pelo PCC poderia ter motivações partidárias. Ao ser questionado sobre o que pretende fazer para debelar a crise na segurança pública, caso eleito governador, afirmou: "Esses ataques são muito estranhos nas suas implicações políticas, porque tem havido constantes manifestações de líderes do crime organizado contra determinadas forças políticas, como se estivessem se partidarizando."
Na semana passada, panfletos atribuídos ao PCC criticaram o PSDB e responsabilizaram o partido pela crise.
Campanha
Alckmin evitou avalizar as declarações de Bornhausen e disse que o pefelista "não fez nenhum vínculo direto" entre PT e PCC. Anteontem, em entrevista à Folha, o pefelista disse que "PT pode estar manuseando, manipulando essas ações [atentados]".
"Tem muita coisa estranha por trás de tudo isso. Mas não vou fazer nenhuma observação de natureza política", disse Alckmin. "Estranho a forma como a coisa ocorre, a época em que ocorre, a maneira como os atos são desencadeados."
Alckmin chegou na tarde de ontem a Brasília, onde se reuniu com a coordenação e o comitê financeiro da campanha para dimensionar o impacto da crise de segurança em sua candidatura. Os tucanos defenderam que Alckmin continue rechaçando o envio da Força Nacional de Segurança a São Paulo e que tente responsabilizar pela crise a lentidão na transferência de recursos federais e a resistência em endurecer a legislação penal.
Antes de embarcar para Brasília, Alckmin teve um encontro com o governador de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL), no qual disse ter manifestado apoio às ações de enfrentamento.
ESTADO DE S PAULO
Cláudio Lembo: "Lula está desequilibrado e faz uso eleitoreiro da crise de segurança em São Paulo
EFEITOS: "Do ponto de vista eleitoral, essa crise prejudica mais o presidente Lula do que Alckmin"
FORÇA NACIONAL: "É bandeira eleitoral. É demagogia. O que faço com 2 mil homens que não conhecem SP?"
OS ATAQUES: "Esse novo surto foi provocado pela prisão de BH. É um líder grande do PCC, um Marcola"
Angélica Santa Cruz
Na tarde de ontem, o governador Cláudio Lembo dedicou algumas horas para pôr num papel os itens que pretende apresentar na reunião de hoje com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. "Estou organizando tudo, para não ficar uma conversa vazia", explicou.
Em meio à segunda onda de violência atribuída ao crime organizado em São Paulo, Lembo listou seis pedidos que pretende fazer ao governo federal. Quer verbas para reconstruir presídios, aumento do efetivo da Polícia Federal, equipamentos de inteligência, transferência de presos federais que cumprem pena em presídios estaduais, a criação de uma câmara interestadual de caráter permanente para trocar informações e ajuda da Receita Federal para rastrear contas bancárias de integrantes do PCC.
Só não quer a ajuda da Força Nacional de Segurança oferecida pelo governo - que define como "ineficaz" e "bandeira político-eleitoral". Em entrevista ao Estado logo após definir sua pauta de pedidos, Lembo reagiu às declarações do presidente Lula, ironizou o poder de ajuda oferecido e reclamou do uso eleitoreiro da crise, inclusive por seu partido.
O presidente Lula declarou que "se a situação está sob controle, não poderia estar acontecendo o que acontece hoje em São Paulo". O que o senhor achou?
Não foi uma declaração feliz. O que nós podemos dizer é que estamos a par de tudo o que está acontecendo em São Paulo, sabemos as causas e as conseqüências - e estamos agindo. Além do mais, em matéria de controle, certamente ele não é o melhor mestre. É só analisar o Brasil. O que está descontrolado é o País. Certamente ele se espelhou no governo dele. Aqui está tudo sob controle dentro do que podemos ter, em uma situação de crise. As emoções de uma campanha fazem até os presidentes perderem o equilíbrio. O presidente Lula perdeu o equilíbrio. Está desequilibrado.
O senhor está entre os que avaliam que ele fez uso eleitoreiro da crise em São Paulo?
Certamente. Acho muito equivocado da parte dele. Esse tema é tão difícil e tão nacional que temos de tratar com grande cuidado, medindo palavras, tendo cooperação recíproca da União com os 27 Estados. Mas também compreendo que as pessoas em campanha por vezes percam os limites das palavras. Falei ontem e hoje longamente com o ministro Thomaz Bastos. Foi uma conversa normal, mas com o registro de todos os fatos. Acho que eu tenho me portado com um nível de cidadania elevado e mereço o mesmo tratamento. Eu disse a ele que é uma pena que o clima tenha se deslocado para o político-partidário e tenha saído do político-administrativo.
Como o ministro reagiu?
Ele ouviu, compreendeu. E vem aqui amanhã (hoje). Diz que vem trazer uma pauta tirada de uma reunião com a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e as Forças Armadas. Acho ótimo! Muito bom! Estou mesmo querendo muito saber quais são as informações que a Abin vai me dar... Que eles me informem, porque estou pronto para cumprir missões específicas. No mais, posso dizer que não é bom soltar palavras ao ar, sem racionalidade.
E por que, afinal de contas, o senhor não aceita a ajuda da Força Nacional de Segurança?
Eu aceito todas as ajudas ! São Paulo merece! E peço o seguinte: primeiro, maior efetivo da Polícia Federal em São Paulo. É fundamental para nossa luta contra o crime ter efetivos de inteligência da PF. Quero que o governo retire os 1.600 presos federais que temos em São Paulo. É um convênio, mas neste momento estamos precisando de vagas. Quero ainda: equipamento de inteligência. E quero que a Receita nos ajude a rastrear as contas dos líderes do PCC presos e das pessoas próximas a eles. Precisamos saber de onde vem e para onde vai o dinheiro do narcotráfico. E, para finalizar: mandem dinheiro para ajudar a reconstruir presídios. Só na reforma do de Araraquara vamos gastar R$ 17 milhões. Agora, o problema dessa Força de Segurança que virou o mote do governo federal e dos meios de comunicação deve ser analisado com a tranqüilidade que o governar exige. É bandeira político-eleitoral.
Por quê?
Essa força é formada por efetivos das Polícias Militares dos 27 Estados. Todos se juntam e deslocam 7.676 homens. A PM de São Paulo tem 87 mil na ativa! Se me mandassem esses 7 mil homens, eu teria, na rua, no máximo 2 mil - porque eles trabalham em turnos. O que faço com essas pessoas num Estado com 40 milhões de habitantes? Iam desaparecer em São Paulo, ainda mais sem conhecer a topografia da cidade. Isso é bandeira de campanha político-eleitoral. Eles sabem que esses surtos de ações do crime aparecem por uns dias e vão diminuindo, como já estão diminuindo. Para convocar a força ia demorar 14 a 20 dias. Na hora em que chegar, já vai estar calmo. Para quê fazer isso? É demagogia. Não quero fazer demagogia, assumi a administração de forma racional. Onde vou acantonar essa tropa? Não tenho quartéis para eles, tenho para minha tropa. Aí falam: em Mato Grosso do Sul deu certo. Em Mato Grosso do Sul foram cento e poucos homens para um presídio. No Espírito Santo também, para um presídio! Eu tenho 144 presídios. Não adianta! Quer tanto mandar? Manda! Mas vai ficar no Pacaembu assistindo a jogo de futebol... Falar dessa força é ausência de racionalidade. E se o governo federal não tem racionalidade, então não pode ser administrador.
O senhor no início dizia que não precisava de ajuda. Agora o senhor mudou de disposição?
Eu sempre disse que queria ajuda. E estou dizendo: eu quero muito! Eu não quero é essa Força Nacional. Quero essas medidas concretas e a criação de uma câmara de inteligência, para que possamos trocar informações. Quando passar mais esse surto de ataques, o problema vai continuar e vai se alastrar por outras partes do território brasileiro.
O que causou os novos ataques?
Fizemos duas operações em Diadema e prendemos o BH, o chefe do tráfico do ABC e da Baixada Santista. Isso desencadeou essa crise toda. Já tinha os tais "salves" antes, mas o surto de violência aconteceu abruptamente depois da prisão do BH. Ele é um grande líder do PCC, é um Marcola. Sabíamos que haveria reação. Mas o que é melhor: deixá-lo solto ou prendê-lo? A sociedade precisa responder.
A cada crise dessas, ficamos sabendo depois que o Estado interceptou grampos e já sabia. O Estado não consegue se precaver?
Numa cidade de 17 milhões de habitantes, segmentos social e economicamente deprimidos, esses movimentos funcionam como um exército oculto que nos pega em todo momento. É difícil precaução total. Precisaríamos de um grande investimento, como o que se fez na Itália com o Plano Marshall. Infelizmente, não pertencemos à União Européia e falta esse grande investimento social.
Isso significa que, mesmo sabendo que haverá ataques, o governo não tem o que fazer?
Significa que o futuro governador e o futuro presidente terão de deixar de pensar só em coisas tópicas e pensar nos grandes centros urbanos. Não se pode mais pensar no brasileiro como cordial. Caímos na real, isso é sonho. O Brasil é complexo como todos os demais países e nos grandes centros urbanos, se houver maior rapidez na concepção de cidadania, haverá também no combate ao crime organizado. Os governadores terão de parar com coisinhas pequenas, com obrinhas de fantasia. Temos que pensar friamente o problema urbano. As cidades brasileiras estão em processo de degeneração.
O senhor queria aceitar ajuda federal e o PSDB não deixou?
Não teve intervenção. Ainda hoje Alckmin esteve comigo e foi muito elegante. Dizer isso é uma ingenuidade. Sou muito independente e demonstrei isso nestes três meses. Se houver necessidade, eu aceito. Estou pedindo, não estou? Mas a Força Nacional não tem a efetividade que a sociedade pensa. Temos o choque da PM, que é ótimo. Não morreu nenhum preso nesta crise. E tenho reuniões diárias. Agora, o Brasil precisa parar de ter preconceitos e entender que sem uma inteligência efetiva não vamos combater a criminalidade. Os órgãos de inteligência foram desmontados. Criou-se o pesadelo do SNI e não se pôs nada no lugar. Foi um grande erro, porque não dispomos das informações de que precisamos. E temos de ter, dentro dos limites de um Estado democrático, algum tipo de inteligência.
Onde o governo Alckmin errou, para a situação chegar a esse ponto?
O governo de Geraldo Alckmin não errou. Construiu uma grande Polícia Militar e mais mais da metade de um grupo de 147 penitenciárias.
Mas quando o Nagashi Furukawa saiu da Secretaria da Administração Penitenciária, o senhor sinalizou que talvez ele tenha conversado demais com os presos.
Eu diria apenas que o atual secretário, Ferreira Pinto, está aplicando a Lei de Execuções Penais. Está fazendo o exercício da administração dentro da lei, mas sem concessões.
Nesta crise houve conversas entre o governo e líderes do PCC?
Fiquei chateado porque disseram da outra vez que fomos negociar com o Marcola. O Marcola foi honesto neste depoimento de agora. Falou a verdade. Disse que uma advogada pediu para vê-lo, achamos que ela deveria ir. Foram junto um delegado, um coronel e uma procuradora. Infelizmente os advogados estão desmoralizados neste momento e nenhum apareceu pedindo pra ir.
Candidatos ao governo do Estado e à Presidência estão pedindo a cabeça do secretário de Segurança Pública, Saulo de Castro Abreu Filho. O senhor vai dar?
Quando eles forem presidentes ou governadores indicarão o secretário que acharem oportuno. Mas agora é a minha vez de indicar e de manter.
As conversas partidárias em meio à crise estão pegando fogo. O senador Jorge Bornhausen (SC), presidente do PFL, até diz que há um elo entre o PT e PCC. O que é isso?
Eu não saberia dizer se há esse elo. Mas identifico em algumas atitudes do PCC a presença de muitos Brunos Maranhões. Vejo semelhanças entre presos que quebram e matam e pessoas capazes de invadir um lugar sagrado como a Câmara. Mas no debate político-partidário acho que essa crise prejudica mais Lula do que Alckmin. São Paulo está agindo com o rigor de sempre, mas o uso político de tudo é do presidente. E o eleitor é reflexivo, ele sabe identificar essas atitudes.
O senhor ainda está contando as horas para deixar o governo?
Contar as horas é muito difícil... Mas agora descobri uma coisa na minha agenda, para a qual nunca dava bola antes. Olha aqui, embaixo da data tem a informação de quantos dias faltam para terminar o ano. Hoje, quinta-feira, faltam 171 dias! Amanhã, sexta, serão 170. Graaaaças a Deus!