Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 04, 2006

'Eleitor procura candidato menos pior' Estado

Cenário de 2006 causa perplexidade ao brasileiro, que não conhece
Alckmin e teme reeleger Lula após o escândalo do mensalão

Paulo Moreira Leite

Aplicada estudiosa dos humores do eleitorado, a pesquisadora mineira
Cássia de Barros Paixão informa que o eleitor anda perplexo e
desanimado. "A maioria não quer escolher o melhor candidato", diz.
"Só quer encontrar o menos pior."

Economista de formação, ela fez levantamentos qualitativos - nos
quais grupos representativos de eleitores fazem discussões sob
direção de um pesquisador - em todas as campanhas presidenciais
recentes. Suas análises ajudaram na formulação da estratégia do PSDB
em 1994 e 1998 e alimentaram a campanha de Lula em 2002. A partir de
pesquisas recentes ela falou sobre a campanha presidencial deste ano.

Como estão os eleitores de 2006?

Como sempre numa eleição presidencial, eles enxergam uma escolha
séria, quando refletem sobre os rumos do País. Mas também dizem que é
uma escolha difícil, pesada, pensada.

Por quê?

O eleitor tem consciência de que uma reeleição tem o significado de
avalizar ou negar o presidente. E o que se gostaria mesmo é de lhe
dar um sinal amarelo. Lula não é certeza de bom governo nem garantia.
É uma aposta. Não foi fácil este último ano, com denúncias,
escândalos, o PCC... O eleitor se sente desorientado, procura
explicações, valores. Ficou difícil pensar no coletivo, a
individualidade está exacerbada, pensar no outro se tornou meio
ridículo.

Quem está em campanha para valer?

Hoje o eleitor vê um candidato só, o Lula. É a referência. Não só
pela sua liderança, mas porque nos fez enxergar o País que somos, com
uma imensa pobreza, mostrando que precisamos de políticas para
combatê-la.

E o Geraldo Alckmin?

Os eleitores não sabem quem é nem o que representa. Bem ou mal, Lula
é identificado com a prioridade com o social. Mesmo o eleitor de São
Paulo tem dificuldade para entender como Alckmin enxerga o País.

Como explicar a posição de Lula nas pesquisas?

É a teoria do pássaro na mão, que é melhor do que dois voando: ao
menos esse presidente fez alguma coisa pelos pobres.

O que mudou no Lula em 2006?

Era possível dizer em 2002 que a esperança venceu o medo. A
expectativa de mudanças coletivas dava o tom da escolha em Lula. Hoje
as pessoas estão mais cautelosas, existem medos fortes e subjetivos -
medo de sair na rua, de criar filhos, de acreditar em valores. O medo
está mais presente que a esperança.

Os eleitores de renda mais baixa temem perder programas como o Bolsa-
Família?

Eu acho que sim. O eleitor é mais pragmático, mais individual. Mas eu
acho que uma parcela da população teme perder o Lula, naquilo que ele
representa como exemplo de vida. Muitos têm grande identificação com
a trajetória pessoal do presidente. Para eles, um fracasso de Lula
seria uma angústia insuportável. Eles sentiriam como um fracasso
pessoal deles. Isso dá um bloqueio.

O eleitor enxerga responsabilidades do presidente na corrupção?

O eleitor enxerga tudo. Diz que o presidente foi omisso e concorda
que não é possível que não soubesse de nada. Alguns eleitores tentam
compreender a omissão do presidente e são condescendentes,
considerando que foi engolido pelo ambiente político. Outros acham
que ele foi conivente. O maior aliado do Lula é a pessoa do
presidente. E o principal adversário do Lula são as atitudes do
presidente.

E a violência?

O eleitor vê responsabilidade do governo do Estado e do Alckmin nos
ataques do PCC. A sensação é de desmando, como se o Marcola (líder da
facção criminosa)tivesse sido governador por uns dias. Mas muitos
eleitores dizem que o governo federal deveria ter feito intervenção
em São Paulo e que isso só não ocorreu por interesses políticos.

Alckmin pode crescer ?

Ele precisa ampliar o apoio. Tem um perfil pessoal oposto ao de Lula
e para muita gente isso sinaliza que não vai escolher o lado do povo
se chegar ao governo. Já escutei de um eleitor que ele é "muito Fiesp
(Federação das Indústrias do Estado de São Paulo)".

Será uma eleição de "pobre contra rico"?

Não. Será uma eleição onde a oposição precisará de um discurso mais
sofisticado, sem simplismos nem ataques diretos. O povo não irá votar
no Alckmin por protesto, mas se concluir que é o nome e o rosto de um
País melhor.

Cássia de Barros Paixão, pesquisadora

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