Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 11, 2006

Dora Kramer - Aparências, nada mais O Estado de S. Paulo


11/7/2006

Primeiros momentos mostram que obediência à Lei Eleitoral é só
discurso de campanha

O discurso governista de firme obediência à Lei Eleitoral e às
restrições impostas pela regra da reeleição não resistiu aos
primeiros dias de campanha oficial. O presidente Luiz Inácio da Silva
dá a largada já quebrando a norma de só fazer campanha nos fins de
semana, deixando os dias úteis para ações exclusivamente de governo:
ontem receberia o PMDB para um jantar de apoio do partido e na quinta-
feira participará do lançamento oficial da campanha, em ato público
do PT, em São Bernardo do Campo.

Tomada não ao pé da letra, mas sob a ótica da realidade prática, a
reunião ministerial marcada para hoje tampouco pode ser vista como um
encontro de trabalho estritamente governamental. Prevista para durar
o dia todo, e obviamente ocupar as manchetes do dia seguinte, a pauta
da reunião tem dois itens.

Os ministros serão "informados" sobre o que a legislação eleitoral
proíbe ou permite aos agentes públicos nesse período e será feito
também um balanço das ações administrativas, de forma a fornecer à
equipe de primeiro escalão do presidente argumentos para que eles
defendam o governo na campanha.

Ou seja, trata-se de uma reunião de campanha sem tirar nem pôr uma
vírgula. Primeiro, porque visa a produzir um fato a ser noticiado com
destaque sem que exista uma motivação objetiva de governo para o
encontro.

No ano passado, por exemplo, em meio à crise as reuniões ministeriais
estiveram suspensas. A necessidade desta agora só existe em função
das eleições.

As "informações" sobre os procedimentos de campanha estão todas
explicitadas na lei e devidamente listadas numa cartilha - "Eleições
2006, orientações aos agentes públicos" - já distribuída a todos pelo
Ministério do Planejamento. Não haveria, pois, razão para fazer um
encontro de ministros o dia inteiro para repetir o já exposto em
texto de 27 páginas.

Em segundo lugar, o caráter eleitoral do ato fica patente no balanço
administrativo destinado a fornecer argumentos de defesa para os
ministros frente à população, vale dizer, ao eleitorado.

O jantar com o PMDB, marcado para ontem, tanto poderia ser realizado
na Granja do Torto quanto no Alvorada, ambos locais permitidos por
lei em virtude de servirem como residências aos presidentes. O
horário combinado pode atender à justificativa de que é fora do
expediente, mas não se coaduna à norma estipulada pelo próprio
governo de que a agenda de campanha seria cumprida apenas aos
sábados, domingos e feriados.

Parece pouco frente às inúmeras e mais graves possibilidades de uso
da máquina administrativa, mas é muito no que tange à agressão do
princípio preestabelecido, pois é de pequenas infrações que se forma
um todo transgressor.

O cenário de desafios à lei aos primeiros acordes da campanha
completa-se com o flagrante de burla à nova legislação patrocinado
pelo PT nas ruas de São Paulo 48 horas depois do início oficial da
campanha. A proibição de distribuição de brindes foi solenemente
ignorada pelos militantes que participavam de manifestação em prol da
candidatura de Aloizio Mercadante ao governo do Estado, distribuindo
camisetas do partido às pessoas no centro da cidade.

Se a primeira impressão é a que fica, o candidato oficial e seu
partido não contribuem para forjar uma boa imagem de si neste início
de campanha nem ajudam a imprimir sinceridade à anunciada disposição
de se manter dentro dos limites da legalidade.

Neste aspecto, soa incongruente até o conteúdo da reunião de hoje,
alegadamente de orientação legal aos ministros para que não incorram
em infrações à lei num encontro por si só sinalizador da vontade de
transgredir.

Referência

O senador Antonio Carlos Magalhães se autoproclamando "guardião da
moralidade" lembra muito o presidente Lula declarando-se o porta-
estandarte da ética, primeiro e único.

Trinca

Não poderiam ser mais representativos do negócio em pauta os
senadores padrinhos de três novos diretores dos Correios indicados
pelo PMDB: Ney Suassuna, investigado pelo Ministério Público, Polícia
Federal e CPI dos Sanguessugas; Romero Jucá, alvo de inquérito por
apresentação de garantias falsas para empréstimo no Banco da
Amazônia; e Luiz Otávio, denunciado em 2001 pelo Ministério Público
sob suspeita de fraude em operação de financiamento com bancos oficiais.

Zero a zero

O veto ao reajuste de 16,6% para os benefícios previdenciários dos
aposentados não deve custar muito caro ao presidente Lula,
eleitoralmente falando.

Se é verdade que ele se desgasta ao vetar, é verdade também que a
oposição não pode se aproveitar impunemente da crítica excessiva ao
gesto, pois sua passagem pelo poder não deixa dúvida de que, se
governo fosse, o PSDB também vetaria o aumento.

A diferença está na fase anterior do processo, a aprovação do
reajuste: o grupo hoje de oposição dificilmente deixaria de articular
maioria no Congresso para evitar a situação de veto.

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