Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, julho 06, 2006

Celso Ming - Coisa de burocratas

O Estado de S. Paulo
6/7/2006

A s desculpas esfarrapadas para a demora da aprovação da reforma
cambial mostram má vontade e o viés fiscalista do Ministério da Fazenda.

O que está em questão é a atual exigência de cobertura cambial nas
operações de comércio exterior. Hoje, todo exportador está obrigado a
vender no câmbio interno a moeda estrangeira que obtém com suas
vendas lá fora, assim como o importador está obrigado a comprar no
câmbio interno os dólares que vai entregar ao fornecedor externo.
Pelo menos no caso em que há transferência de moeda nas duas mãos de
direção, trata-se de exigência burra: obriga a que a empresa venda
internamente os dólares que em seguida terá de recomprar.

Este é o caso da Embraer que importa cerca de 75% das partes e
componentes dos aviões que exporta. É o da Petrobrás, que importa
petróleo e exporta derivados. E é o das tradings, que operam nas duas
pontas do comércio exterior. A proposta é permitir que os
exportadores deixem no exterior o volume de moeda estrangeira que
será usado no pagamento dos fornecedores. Os especialistas
verificaram que a flexibilização da exigência de cobertura cambial
reduziria em cerca de 4% os custos das transações de câmbio.

Os defensores da Fazenda argumentam que essa flexibilização sangraria
o Tesouro em R$ 200 milhões anuais em arrecadação de CPMF que
deixaria de ocorrer e que essas perdas têm de ter compensação.
Curiosamente, este foi o argumento ontem sustentado pelo secretário
de Política Econômica, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, que, até maio,
como diretor-executivo do Iedi, aplaudia irrestritamente o projeto de
reforma da Fiesp e agora, como enverga o boné da Fazenda, diz coisa
diferente.

A arrecadação anual da CPMF ultrapassa R$ 30 bilhões por ano. As tais
perdas alegadas pelo Fisco não passariam de 0,7% do total, uma gota
diante da maior racionalidade que ganhariam as operações cambiais.
Mas burocrata não pensa nisso.

Esse argumento não faz sentido por duas principais razões. A
primeira: mesmo se a CPMF fosse um imposto arrecadatório (sua única
justificativa é ser imposto para fiscalizar as movimentações
bancárias), o governo não deveria lamentar perdas tão insignificantes
de arrecadação, especialmente se vêm para modernizar o câmbio e para
aumentar a competitividade do produto nacional.

Segunda, se é para levar em conta esse tipo de renúncia tributária,
seria preciso dizer o mesmo de qualquer compensação financeira
interna. Quando têm débitos e créditos em reais umas com as outras,
tanto empresas como pessoas físicas compensam essas quantias e só
transferem a diferença para a conta do outro. E é só essa diferença
que leva CPMF. Ninguém é acusado de sonegação por agir assim, nem o
Fisco considera isso renúncia tributária. Por que esse critério não
pode ser estendido às operações de câmbio?

E, se é verdade que esta reforma cambial deve de alguma forma
indenizar quem perder com ela, como quer a Fazenda, então os bancos e
as casas de câmbio também teriam direito a alguma compensação, porque
afinal perderão operações de câmbio.

FALHA NOSSA
Ao contrário do que ficou dito aqui ontem, quando se reduz a procura
por títulos do Tesouro dos Estados Unidos, sua remuneração tende a
subir.

Arquivo do blog