O GLOBO
Todas as indicações são de que o Supremo Tribunal Federal não está com ânimo de decretar a intervenção no Distrito Federal, apesar da opinião do procurador-geral da República — interpretada pelo presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, como a indicação de que existe uma "metástase institucional", com o envolvimento de todos os setores do Executivo e do Legislativo nos escândalos.
O Supremo vai jogar com o tempo para ver se a classe política resolve de alguma maneira a questão de governabilidade do Distrito Federal, no pressuposto de que a intervenção é uma medida radical e de difícil aplicação.
A renúncia do governador interino Paulo Octávio, igualmente envolvido nos escândalos de corrupção que levaram à cadeia o governador eleito José Roberto Arruda, colocou na cadeira de governador o deputado distrital do PR Wilson Lima, o que é prenúncio de confusão.
Não apenas por ser um aliado de Arruda que dificilmente não será envolvido em denúncias nos próximos dias, mas porque não parece estar talhado para comandar uma coalizão partidária que dê estabilidade ao governo.
Comparam Lima ao ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti, que acabou destituído do cargo por receber um "mensalinho" do concessionário do restaurante da Câmara, um crime mixuruca à altura de seu autor.
Mas Severino Cavalcanti tinha uma vantagem sobre Wilson Lima: fora eleito pelo voto de seus companheiros para o cargo. Lima chegou ao governo no rastro de uma crise política que parece não ter fim, e não demonstra estar aparelhado para a função.
Apesar dos pesares, a vida do Distrito Federal ainda não foi afetada pela crise política.
Os serviços públicos estão funcionando dentro da normalidade, e a ordem pública está mantida, especialmente depois que o governador foi colocado na prisão e não poderá usar os órgãos oficiais para obstruir as investigações ou chantagear aliados e adversários.
Caso Wilson Lima demonstre uma maturidade que não se presume até o momento, consiga organizar um governo que minimamente mantenha em funcionamento o Distrito Federal, e não seja abatido por alguma denúncia, estará facilitado o trabalho do Supremo, que se reúne em março para decidir sobre o pedido de intervenção feito pelo procurador-geral da República.
A questão é que tanto ele quanto seu vice, Cabo Patrício, do PT, pretendem disputar um novo mandato na eleição de outubro, e têm que se desincompatibilizar nos primeiros dias de abril.
A não ser que Lima goste tanto do cargo que prefira ficar no governo até o fim do mandato de governador, sem concorrer à eleição.
Ou, quem sabe, num desfecho surpreendente, consiga montar um esquema político que o apoie para uma candidatura à reeleição como governador. Improvável, mas não impossível, que em política não existe.
Se houver, no entanto, a desistência dos dois políticos na cadeia de sucessão, o terceiro elo da cadeia, o Poder Judiciário, já se separou desse imbróglio através do aviso do presidente do Tribunal de Justiça, Níveo Gonçalves, que deu entrevista dizendo que não tem nada a ver com política e não aceitaria assumir o cargo de governador do Distrito Federal.
Aí teríamos um vazio institucional que poderia ser solucionado com uma eleição indireta pela própria Câmara Distrital, que poderia eleger um "interventor".
O grave no caso do Distrito Federal é que a perspectiva de curto prazo não é de uma solução para a crise política, pois o favorito nas eleições para governador é Joaquim Roriz, o político que deu início a essa série interminável de escândalos em Brasília.
Ele é a fonte de poder que gerou José Roberto Arruda, Paulo Octávio e quase toda essa base parlamentar que atua, de acordo com o procurador-geral da República, com base nos elementos colhidos na investigação realizada na Operação Caixa de Pandora, como um "grupo que, por ser constituído pelas mais altas autoridades do Distrito Federal, instalou-se no próprio governo e utiliza as funções públicas para desviar e apropriar-se do dinheiro público (...)".
O problema é que Roriz está livre para se candidatar ao governo de Brasília ou a qualquer outro cargo público. Foi governador nomeado entre 1988-1990; ganhou força política para se eleger diretamente no mandato de 1991-1994; e voltou ao governo para mais dois mandatos seguidos, depois da aprovação do sistema de reeleição, de 1999-2002 e 2003-2006.
Eleito senador, renunciou ao mandato para não ser cassado. Roriz foi acusado de quebra de decoro, e responderia ao Conselho de Ética do Senado, após a divulgação de conversas telefônicas em que combinava a divisão de R$ 2,2 milhões com o ex-presidente do Banco Regional de Brasília Tarcísio Franklin de Moura, negócio que envolvia também o empresário Nenê Constantino, da Gol.
Como a investigação da Polícia Civil de Brasília não teve consequências, Roriz está livre para se candidatar, e aparece como o favorito na corrida ao governo do Distrito Federal.
A não ser que surjam novas acusações contra ele, o Supremo não pode decidir pela intervenção apenas para impedi-lo de voltar a governar o Distrito Federal pela quinta vez.
E temos a ameaça de têlo novamente de volta ao governo ou, hipótese menos improvável, que o deputado Wilson Lima revelese um político tão astuto quanto Roriz e monte um esquema de poder que permita que se candidate com chances de derrotálo em outubro.
A outra hipótese é que, decretada a intervenção, pelo Supremo, ou escolhido o novo governador em eleição indireta, o interventor, ou o eleito, tornese o nome forte da política de Brasília. Não são perspectivas animadoras
Entrevista:O Estado inteligente
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