FOLHA DE S. PAULO
Nabuco e Brasília convidam a refletir sobre a degradação entre nós da antiga dignidade da função pública
Não parece haver nada em comum entre os 50 anos de Brasília e o centenário da morte de Joaquim Nabuco. Ambas as datas convidam, no entanto, a refletir sobre a degradação entre nós da antiga dignidade da função pública.
Fui dos primeiros voluntários a trabalhar em Brasília, aonde cheguei em 10 de março de 1961. Éramos um punhado de pioneiros unidos pela ilusão de que vivíamos momento único: passado a limpo, o Brasil repartia com alma nova e purificada.
No plano cultural, Brasília dava expressão à utopia racional e funcionalista do modernismo. No político, correspondia à refundação do país. Longe das quarteladas da Vila Militar e da agitação das ruas, a alva cidade voltava as costas à corrupção da Corte, simbolizada pela Gaiola de Ouro, a Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro.
Antes de completar quatro anos, o sonho tinha acabado. O golpe de 1964 inaugurou ditadura que ocupou quase a metade da vida da nova capital. Estava pronta a cena para a invasão de aventureiros rapaces empenhados no saqueio sistemático do planejamento urbanístico. O penúltimo governador esmerou-se na irresponsabilidade de semear favelas monstruosas ao distribuir lotes para comprar votos de miseráveis; o atual é preso por flagrante de atos pornográficos de corrupção explícita que nos devolvem aos tempos de governadores coloniais embarcados acorrentados para Lisboa.
Em lugar do Te Deum, a festa dos 50 anos se deveria abrir com um Réquiem pelo assassinado Plano Piloto de Lúcio Costa e Niemeyer. E prosseguir com o sermão de um Vieira redivivo mostrando como a corrupção destrói primeiro a capital, isto é, a cabeça, depois o corpo e a alma da nação. Se a corrupção continuar a ser alentada sob pretexto de governabilidade, se a Justiça se limitar a espasmos de energia, sem acabar com a impunidade, talvez haja ainda menos a comemorar em mais meio século. Brasília confirmará de modo irônico a profecia de Malraux de que seria "a mais bela ruína do século 20".
Quando morreu Nabuco, cem anos atrás, Domício da Gama se queixou: "Machado de Assis, Euclides da Cunha, Joaquim Nabuco fazem falta a meu coração de brasileiro confiado no futuro de uma nação que teve dessas inteligências". Mais que a inteligência, porém, essa trindade inigualada nos deixou o exemplo da austeridade a serviço do interesse público, os dois primeiros como funcionários, o último também como político.
Parlamentar incomparável, Nabuco sempre se bateu por ideias, pela Abolição, no início, pela Federação, mais tarde. Jamais foi ministro no Império ou na República, nunca teve poder nem dinheiro. Merece nesta hora de cinismo que se lembre o que dele disse Gilberto Freire na Câmara dos Deputados em 1947:
"Um Brasil que tem (...) um político, um parlamentar da grandeza e da atualidade de Nabuco, não deve deixar que essa grandeza seja esquecida, principalmente em época marcada pela desconfiança de que todo político brasileiro seja um politiqueiro, e todo homem público, um mistificador (...). Nabuco é uma das maiores negações dessa lenda negra com que se pretende desprestigiar entre nós a vida pública (...). Os brasileiros de hoje, os moços, os adolescentes, (...) é este o Nabuco que precisam conhecer de perto: o político que foi também um homem de bem. O político que não separou nunca a ação da ética".
Entrevista:O Estado inteligente
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