O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem manifestado reiterado apoio à reativação da Telebrás, com o propósito alegado de que essa estatal "coordene e gerencie a oferta de serviços de banda larga pelo menor preço possível a todos os brasileiros". Por louvável que seja esse objetivo, há uma distância muito grande entre os fins visados e os meios propostos para alcançá-los.
Como em ano de eleições tudo se promete, o presidente diz que a intenção é oferecer o acesso à banda larga a R$ 10 mensais. Só não diz como fazer esse milagre.
Para que se tenha ideia do disparate, é bom lembrar que a mais avançada e mais barata rede de banda larga do mundo é da Coreia do Sul, onde 97% dos domicílios podem acessar a internet à velocidade de 50 Megabits por segundo (Mbps) ? quase 100 vezes a velocidade da banda larga brasileira ? por apenas US$ 25 (R$ 47), como mostrou o jornalista Ethevaldo Siqueira no Estado de domingo.
Também é estranho que o presidente tenha afirmado que o governo já promoveu suficiente debate sobre todos os aspectos do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Ora, nem o Congresso nem a sociedade tiveram a oportunidade de participar da discussão aberta e ampla desse tema. Nem mesmo o ministro das Comunicações, Hélio Costa, tem participado de todas as reuniões internas para a elaboração do PNBL. E mais: já manifestou sua discordância quanto à reativação da Telebrás e a outros pontos do PNBL. Houve apenas duas reuniões com operadoras de telecomunicações.
As redes de banda larga são as grandes rodovias do conhecimento e da informação do século 21. Por sua importância, elas interessam a toda a população brasileira e não podem ser discutidas apenas por burocratas interessados em cargos neste e no próximo governo.
O principal argumento do presidente da República para defender a recriação da Telebrás é que o Estado precisa de um instrumento para poder universalizar a banda larga. Mas não é esse o caminho adequado. Já existe no Brasil uma infraestrutura moderna de redes fixas e móveis, de fibras ópticas e sem fio, terrestres e via satélite. E o governo só dispõe de 20% da infraestrutura de cabos ópticos do País.
O governo praticamente nada investe em telecomunicações, nem nas áreas mais carentes do País, embora arrecade mais de R$ 40 bilhões por ano em impostos sobre telefonia e, na prática, confisque boa parcela dos fundos setoriais de telecomunicações. O melhor exemplo do pouco interesse do governo pela inclusão digital é o que ocorre com o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), cujo valor acumulado já se aproxima dos R$ 10 bilhões, sem nada ter sido aplicado naquilo para que foi criado.
A tese da estatização da banda larga chega a ser contraditória, pois os maiores instrumentos de ação do governo deveriam ser a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) ? que o governo Lula tem enfraquecido e desprofissionalizado ? e o Ministério das Comunicações ? que deveria formular políticas públicas para o setor, mas foi colocado em segundo plano até na elaboração do Plano Nacional de Banda Larga.
A experiência mundial tem provado que o verdadeiro papel do Estado moderno em telecomunicações não é gerir ou operar diretamente os serviços ou os investimentos. Para que possa contribuir, realmente, para a transformação da realidade econômica e social, o Estado deve, acima de tudo, regular, fixar normas, formular políticas públicas, elaborar programas, estabelecer metas e objetivos ? além de supervisionar, fiscalizar e agir com rigor e eficiência para a manutenção da qualidade, a redução dos preços dos serviços e a intensa utilização das novas tecnologias e da infraestrutura existente. Cabe ainda ao governo implementar o chamado governo eletrônico e negociar Parcerias Público-Privadas, com a participação das empresas operadoras, bem como estimular as empresas privadas a inovar e a investir em pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
Há ainda, no caso, um ponto que beira o escândalo: a manipulação das cotações das ações da velha e moribunda Telebrás, que já tiveram valorização de até 35.000% desde 2003. Cabe não apenas à CVM, mas também ao Congresso, ao Ministério Público e à Polícia Federal investigar quem está ganhando dinheiro com essa indecorosa especulação.
Entrevista:O Estado inteligente
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