Coisas da Política |
Jornal do Brasil - 05/11/2008 |
Orlando Silva de Jesus Júnior entrou em campo, em 4 de abril de 2006, com a modéstia inconvincente do reserva instruído para fingir que não se sente à altura de quem se despede. Logo ficou claro que o secretário-geral do Ministério do Esporte se aquecera anos a fio para substituir o titular Agnelo Queiroz – e, sobretudo, estava pronto para adaptar-se ao estilo agressivo do companheiro de ataque Carlos Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro. Agnelo e Nuz- man fizeram bonito com combinações ousadas, como as que tornaram o Rio a cidade-sede do Pan-2007. Mas as proezas da nova dupla mostrariam que Silva nasceu para jogar junto com Nuzman. Quando o ministro tomou posse, os Jogos Pan-Americanos estavam orçados em R$ 386 milhões. Quando o evento terminou, Silva e Nuzman, favorecidos pela atuação do armador Cesar Maia, haviam torrado 10 vezes mais. O Tribunal de Contas da União segue juntando pilhas de notas superfaturadas, mas ignora o paradeiro de boa parte dos mais de R$ 4 bilhões (pagos pela platéia de contribuintes). O sinal vermelho já fora acionado pela economia americana. Que tal recuperar o dinheiro das comissões e ladroagens, mandar os envolvidos para fora de campo e para a cadeia os culpados pela gastança criminosa? É o que faria qualquer país. Mas o Brasil reconstruído por Lula não é um país qualquer. O presidente não tinha paciência para lidar com despesas miúdas nem perigos inexistentes. Não deu um pio sobre a tremenda tabelinha do Pan-2007. Preferiu antecipar ao mundo, durante uma visita a Madri, que o colega americano não perdia por esperar. "Bush, resolve o problema da crise, porque não vou deixá-la atravessar o Atlântico e chegar ao Brasil", Lula prometeu dizer em 17 de setembro de 2007. Ou porque George Bush não entendeu o que o visitante disse, ou porque não se arriscou a repassar a proibição, a crise levantou âncoras e partiu na direção do colosso tropical. Pelo menos até 18 de março deste ano, Lula não notou a aproximação da forasteira desaforada. "Estamos vivendo um momento mágico", gabou-se num palanque em Campo Grande. Num palanque no Recife, reeditou no dia 27, agora em tom paternal, o recado prometido em Madri: "Bush, meu filho, resolve a tua crise". O Brasil não tinha nada com isso, recordou. É isso aí, concordaram aos berros os dois principais governantes do Brasil olímpico. A participação na Olimpíada de agosto engoliu, ao longo de quatro anos, quase R$ 700 milhões. Valeu a pena, adiantou a expressão triunfante de Silva e Nuzman no desembarque em Pequim. Além da conquista histórica consumada em junho – o Rio ultrapassou a fase eliminatória da escolha da cidade-sede dos Jogos de 2016 – tinham dois motivos de orgulho. Antes mesmo que as competições começassem, o Brasil estabeleceu dois recordes. Foi a maior delegação desde a estréia em 1920. E a mais cara. A essas medalhas imaginárias, somaram-se 3 de ouro, 4 de prata e 8 de bronze. Não é pouco pódio para tanto dinheiro? "O número de medalhas não é o único critério para avaliar o desempenho de um país", tocou Nuzman de primeira. "O desempenho das mulheres melhorou bastante", devolveu Silva, de trivela. (Maurren Maggi, campeã do salto em distância, dispensou-se de lembrar que, enquanto esteve afastada das pistas por um caso mal explicado de doping, não ganhou da cartolagem um só centavo). "Foi o primeiro ouro na natação", completou Nuzman. (César Cielo revelou no fim de setembro que, dos chefões olímpicos nativos, só recebeu pressões). Os craques queriam mais que justificar uma performance bisonha. Queriam verbas para 2016. E não tem faltado dinheiro. Lula soltou R$ 85 milhões para o projeto que o Rio deve apresentar ao COI em fevereiro. "A crise é um tsunami nos Estados Unidos", desdenhou em 4 de outubro. "Aqui, se ela chegar, será uma marolinha que não dá nem para esquiar". No dia 13, Silva doou R$ 6 milhões a uma empresa amiga. No dia 21, presenteou o COB com R$ 3,6 milhões. No dia 23, o governo informou que mais R$ 23 bilhões foram usados para conter a disparada do dólar. No mesmo dia, Silva concedeu-se R$ 500 mil para falar bem do Rio no camarote em Interlagos. No fim do mês, pediu R$ 1 bilhão para gastar em 2009. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, novembro 05, 2008
Augusto Nunes-O Brasil olímpico surfa na marolinha
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