Os bons negócios das empresas
brasileiras com créditos de carbono
Duda Teixeira
Toshiyuki Aizawa/Reuters |
Japoneses protestam contra a não-adesão dos Estados Unidos a Kioto: muitas empresas americanas compram créditos mesmo sem ser obrigadas |
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As emissões mundiais de dióxido de carbono (CO2), o principal vilão do efeito estufa, aumentam à média anual de 2,5%, de acordo com estatísticas divulgadas na semana passada. Até seis anos atrás, o aumento médio era inferior a 1% ao ano. Há várias formas de ajudar na redução dessas emissões devastadoras para o clima global. Uma das mais promissoras é ganhar dinheiro para salvar o planeta. O Brasil é o segundo país com o maior número de projetos para a venda de créditos de carbono, atrás apenas da Índia, e o segundo pelo critério de redução de emissões entre os países emergentes. Nos últimos seis anos, empresas brasileiras venderam mais de 300 milhões de reais desses certificados concedidos como recompensa por projetos de redução nas emissões de gases do efeito estufa. O potencial de faturamento nos próximos seis anos é estimado em 4 bilhões de reais, sem considerar novos projetos que podem vir a ser criados nesse período – o que aumentaria ainda mais o valor.
A base desse negócio é um acordo assinado em uma conferência da ONU em 1997, o Protocolo de Kioto, que tem a adesão de 189 nações. Nesse documento, os países se comprometem a diminuir a emissão de dióxido de carbono até retornar a níveis inferiores aos de 1990. Para estar de acordo com as regras, uma empresa pode diminuir as próprias emissões ou comprar créditos de carbono de companhias dos países em desenvolvimento para compensar a poluição que sua atividade provoca. Esse mercado tornou-se bilionário. Só no ano passado, foram vendidos na Europa 10 bilhões de dólares em licenças de emissão de carbono. O Brasil, como outros 147 países em desenvolvimento signatários do Protocolo de Kioto, não é obrigado a conter a liberação dos gases, mas tem o direito de vender os créditos da sujeira que deixou de fazer. Os brasileiros estão bem colocados nesse negócio graças à experiência com projetos de redução de emissões – empresas nacionais foram as primeiras a registrar um projeto na ONU, em 2004 – e ao baixo custo de implantá-los por aqui.
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Executivos chegam para a feira Carbon Expo, na Alemanha, em maio: antecipação européia da redução de CO2 estimulou o mercado de carbono |
Há duas maneiras de ganhar dinheiro com a venda de créditos de carbono. A primeira segue os critérios do Protocolo de Kioto. Nesse caso, os projetos são registrados na ONU e podem ter seus créditos vendidos a empresas da União Européia e do Japão, cujos governos já estabeleceram metas de redução da poluição para alguns setores industriais. Cada crédito significa que a companhia retirou da atmosfera 1 tonelada de CO2 e repassa ao comprador o direito de emitir o equivalente em gases poluentes. Antes do registro do projeto na ONU, é preciso que ele seja recomendado por uma comissão interministerial do governo brasileiro – isso costuma levar de quatro a seis meses, devido ao excesso de burocracia. Os negócios brasileiros são feitos sobretudo com compradores europeus. A segunda opção para ganhar dinheiro com as licenças para poluir é colocar os créditos à venda em bolsas independentes. A principal é a Bolsa do Clima de Chicago, fundada em 2003. Os compradores, ali, são principalmente empresas americanas que, apesar de não ser obrigadas por lei (o presidente George W. Bush não aderiu ao Tratado de Kioto), compram créditos para demonstrar sua preocupação com o meio ambiente. IBM, Ford e Motorola estão entre as companhias que compram créditos em Chicago. Há empresas brasileiras que atuam nos dois mercados. Os fabricantes de celulose brasileiros Klabin, Cenibra e Suzano e a indústria química Rhodia têm créditos à venda em Chicago. Mas só a Aracruz já efetuou uma venda. A Suzano Papel e Celulose conta concretizar, neste mês, um negócio de 3,5 milhões de dólares.
Em Chicago, podem ser negociados os créditos de projetos que reduziram a emissão de seis gases do efeito estufa. Pelos critérios da ONU, só valem três tipos de gases. Outra diferença é que na Bolsa do Clima de Chicago podem entrar projetos de reflorestamento – o que explica a predominância de empresas brasileiras de celulose no pregão. Quando as plantas crescem, transformam o carbono do ar em troncos, folhas e raízes. Esse método de seqüestro de carbono, no entanto, não é reconhecido pelas regras de Kioto e não vale para a Europa e o Japão. O jeito, então, é vender os projetos em Chicago, onde a procura é menor e os créditos custam a metade.
A Rhodia ganhou créditos de carbono com a instalação de filtros em suas fábricas de náilon em Paulínia, no interior de São Paulo, e na Coréia do Sul para impedir a liberação de óxido nitroso, 310 vezes pior para o aquecimento global que o gás carbônico. O projeto está registrado na ONU e já rendeu 140 milhões de reais. "No futuro, as empresas terão de administrar o balanço energético tão bem quanto fazem hoje com seu balanço financeiro", diz o economista amazonense Rafael Marques, vice-presidente da Bolsa do Clima de Chicago. O crescimento do comércio de créditos de carbono é tal que já existem até corretores especializados (os chamados brokers), que compram a licença de projetos incipientes para revendê-la a um preço mais alto no futuro, ou simplesmente aproximam vendedores e compradores.
"O mercado de carbono é o melhor exemplo de como o capitalismo pode estar a serviço do meio ambiente", diz o carioca Pedro de Moura Costa, presidente da EcoSecurities, empresa baseada em Londres, que investe em 273 projetos limpos pelo mundo, 32 deles no Brasil. "Em alguns anos, os brasileiros estarão tão familiarizados com as cotações do carbono como hoje estão com os valores do dólar ou do ouro", acrescenta Costa. A previsão faz sentido porque um quinto de todos os projetos de redução de carbono registrados na ONU é brasileiro – são 79, com outros 118 prestes a ser inscritos.
Tom Stoddart/Getty Images |
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"Todo dia vem um europeu ou japonês bater na nossa porta", diz Meire Ferreira, diretora do Instituto Sadia de Sustentabilidade. Em 2004, a empresa de alimentos instalou biodigestores em granjas próprias e em outras de pequeno e médio porte no Paraná e em Santa Catarina. Dentro desses equipamentos, parecidos com tanques fechados, os dejetos de suínos fermentam e o gás metano liberado por eles é transformado em gás carbônico (o metano tem um impacto 21 vezes maior sobre o aquecimento global). Em maio deste ano, a Sadia vendeu por 90 milhões de reais o metano que deixou de emitir a um broker com sede em Luxemburgo e um banco francês.
Luciano Candisani/Kino.com.br |
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