Artigo - Mauro Chaves |
O Estado de S. Paulo |
9/12/2006 |
Não, não tem nada que ver com “governo de coalizão” isso que o presidente Lula está tentando fazer, em seguidas reuniões com presidentes e líderes de partidos, para montar ou remontar sua equipe ministerial. Há “governo de coalizão” - mais freqüente em regimes parlamentaristas - quando situação e oposição se unem, geralmente em momentos de grande crise, para a formação de uma administração conjunta. No caso brasileiro, trata-se apenas do velho, surrado e eticamente carcomido loteamento do governo com os partidos aliados. Mesmo que se procure dar a aparência de negociações em torno de “princípios programáticos” - com obviedades do tipo “crescimento econômico” e as “reformas” cantadas em verso e prosa e jamais feitas (política, tributária, etc. e tal) -, no fundo o máximo a discutir é se os ministérios serão entregues aos partidos com “porteira fechada” ou não, isto é, com ou sem as sinecuras dos escalões de baixo. A propósito, a ocupação verticalizada dos ministérios pelos partidos até poderia dar certo se houvesse algum partido, no momento, desfrutando unidade interna - o que não há nos aliados do governo (nem na oposição). Então, essa “porteira fechada” pode significar a extensão da briga do chiqueiro partidário ao curral ministerial. Mais importante, no entanto, é indagar: de que serve esse loteamento? Por acaso ele garantirá algum respaldo, no Congresso, aos projetos de interesse do governo? Será que, em razão dos cargos já ocupados (por seus prepostos e/ou apaniguados) nos ministérios e estatais, os ilustres parlamentares deixarão de fazer suas, digamos, exigências específicas, por ocasião das votações nas mui probas Casas Legislativas federais? Reconheça-se, por justiça, que o presidente Lula está trabalhando nessas reuniões como talvez nunca o tenha feito em sua vida. O esforço do toma-lá-dá-cá, da troca daquela diretoria de estatal por aquela assessoria ministerial, do contrato a ser feito com aquela ONG pela facilidade de colocação daqueles parentes, da verba a ser arrumada para aquele município pela votação daquele candidato à Mesa da Câmara, tudo isso é, de fato, extenuante, especialmente porque o presidente está sozinho de dar dó: tem mais, ao seu redor, desarticuladores (do tipo Tarso Genro e Marco Aurélio Garcia) do que articuladores políticos. Por falar em desarticulação, em seu primeiro teste de coesão, na Câmara dos Deputados, o governo Lula, já em clima de segundo mandato, teve o seu primeiro fracasso retumbante ao perder, para o deputado não reeleito Aroldo Cedraz (PFL-BA), fiel carlista, a vaga no Tribunal de Contas da União (TCU) que pretendia dar ao petista mineiro Paulo Delgado - a ponto de este, tão decepcionado que ficou, já ter anunciado seu abandono da vida política. Por outro lado, não parece nem um pouco tranqüilo o encaminhamento, que faz o presidente Lula, do processo de escolha dos presidentes das Casas Legislativas. Lula pretende reeleger Aldo Rebelo para a presidência da Câmara porque nunca um presidente da República pôde contar com alguém tão fiel (mais do que qualquer petista), tão automaticamente alinhado com o governo quanto o deputado do PCdoB - verdadeiro yes-man planaltino, que parece ter dado mais importância aos interesses políticos do governo Lula do que aos da instituição que preside, não se preocupando nem em defendê-la, perante diatribes vindas do Planalto. Mas o PT, que procura adquirir forças até para não perder o poder de barganha com o próprio presidente Lula - necessário para defender suas boquinhas, pois ninguém é de ferro -, lançou seu candidato, o deputado paulista Arlindo Chinaglia. Por sua vez, inconformados com a “fome” dos petistas, os deputados do PMDB resolveram também disputar a presidência da Câmara, para o que concorrem o baiano Geddel Vieira Lima, o cearense Eunício Oliveira e, agora, até o presidente do partido, Michel Temer (SP). Mas o tal “conselho de coalizão” é de vasta composição, pois nele já estão PT, PMDB, PSB, PDT, PCdoB, PL, PRB e PV, enquanto PP e PTB estão para entrar. Será, então, que, aproveitando-se do apetite geral, despertado por esse disforme amontoado partidário, não surgirão veleidades, das profundezas indecifráveis do baixo clero, capazes de colocar no assento do presidente da Câmara - o segundo na linha sucessória do chefe de Estado e de governo - alguém semelhante a Severino Cavalcanti? Quanto ao Senado, o apoio do PSDB à candidatura de José Agripino (PFL-RN) tornou menos garantida, para o Planalto, a reeleição do também fiel (embora nem tanto quanto Aldo) Renan Calheiros. Em meio à confusa desarticulação política, o governo Lula enfrenta o que para a população brasileira significa algo muito pior, ou seja, uma desastrada desarticulação administrativa, do que o pavoroso apagão aéreo é bem emblemático: há mais de 40 dias as pessoas, no Brasil, passam por um transtorno, em suas viagens aéreas, como se o País estivesse em plena guerra. Cancelamento de dezenas de vôos, atrasos brutais de centenas deles, passageiros esparramados pelos saguões dos aeroportos, confusão geral, falta de espaço nos hotéis próximos dos aeroportos, falta de informações e de atendimento, até impossibilidade de transporte de órgão - que impediu o transplante de fígado marcado para uma criança -, todo esse sofrimento estúpido, imposto às pessoas, enquanto autoridades apatetadas não encontram soluções para o grave problema, ora dizendo uma coisa, ora outra, a demonstrarem uniformidade apenas num aspecto: o da absoluta incompetência. Chega a causar constrangimento e comiseração a figura patética do ministro da Defesa, Waldir Pires - uma boa pessoa, político com integridade de caráter -, transformado em verdadeira barata tonta, que parece não ter noção alguma do que trata a pasta ministerial de que é titular. Talvez seja ele a maior vítima moral desse trágico governo de colisão. |
Entrevista:O Estado inteligente
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segunda-feira, dezembro 11, 2006
Governo de colisão
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