O Brasil vive um paradoxo de difícil explicação, de conseqüências sérias para o nosso futuro: ao mesmo tempo em que já chegamos a um certo consenso na sociedade sobre a necessidade de crescimento da economia dentro de um cenário de equilíbrio fiscal inflação controlada, discutir a maneira de atingir esse objetivo não faz parte de uma das campanhas presidenciais mais amorfas de que já se teve notícia no país. Não há um candidato, a começar pelo favorito, o presidente Lula, que tenha coragem de abordar com profundidade as reformas estruturais de que país necessita para crescer sem retrocessos, como da Previdência, ou o corte de gastos públicos, indispensável para manter as contas no azul.
Ao contrário, Lula envia um orçamento para seu provável primeiro ano do segundo mandato com previsão de aumento de gastos, e projeção de crescimento de 4,75% do PIB, irrealista.
O tucano Geraldo Alckmin, por seu turno, fala genericamente em corte de gastos, mas ao mesmo tempo promete manter e ampliar o Bolsa Família, que já atinge mais de 11 milhões de famílias, num gasto anual de mais de R$ 8 bilhões.
Se não o fizer, corre o risco de perder os parcos votos que ainda tem no Nordeste.
Vivemos uma esquizofrenia assustadora, num estado assistencialista, que gasta muito e mal, mas que pretende manter o equilíbrio fiscal às custas de uma carga tributária brutal.
Dois dos oposicionistas — Alckmin e Heloísa Helena —, ainda por cima, afirmam sem pudor que o dinheiro para investimentos virá da redução dos juros, como se fosse simples “decisão política” o corte de juros, ou como se o dinheiro poupado ficasse sobrando para o governo gastar. Ou não sabem que a redução da dívida não significa sobra de dinheiro, mas apenas dívida menor a longo prazo, ou estão enganando mais uma vez os eleitores.
Segunda-feira, no GLOBO, em seminário promovido com o Instituto Milênio, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que acaba de lançar um livro com um título otimista, “Crônicas da convergência”, e um subtítulo mais otimista ainda, “Ensaios sobre temas já não tão polêmicos”, participou com o economista Fabio Giambiagi, do Ipea, e o jornalista Guilherme Fiúza de um debate do qual fui mediador.
Por “não tão polêmicos” leia-se controle da inflação, superávit fiscal e a necessidade das reformas estruturais na economia para um crescimento sustentável, agenda que, surpreendentemente, passou do governo tucano ao petista.
Franco deu uma explicação simples para os altos juros: o Brasil seria comparável a uma empresa mal administrada, cheia de dívidas, com histórico ruim de pagamentos.
Quem se arrisca a emprestar dinheiro a uma empresa assim cobra caro. Entre tantas observações surgidas no debate, duas se destacam para explicar nosso crescimento econômico medíocre nos últimos anos, a uma taxa média de 2% a 2,5% do PIB: o aumento avassalador dos gastos públicos, e a falta de investimentos, causa e conseqüência.
Gustavo Franco ressaltou que, na época do “milagre brasileiro”, nos anos 70, em que crescíamos a taxas asiáticas, o investimento no país chegou próximo a 30% do PIB, sendo que o Estado entrava com cerca de 10% e o restante era bancado pela iniciativa privada. Hoje o investimento privado continua na casa dos 18%, mas a capacidade do Estado é cada vez menor, entre 1% e 2% nos últimos anos, mais baixa taxa de investimento desde o pós-guerra.
E por que falta capacidade ao estado para investir? economista Fabio Giambiagi apresentou o gráfico abaixo, que é esclarecedor. Nos últimos 15 anos, as despesas primárias do governo cresceram vertiginosamente. Entre 1991 e 2004, esses gastos, que correspondem especialmente benefícios do INSS, pagamento de pessoal e transferências a estados e municípios, aumentaram nada menos que 7,5% do PIB. Giambiagi desfiou dados impressionantes: a) nos últimos 12 anos, o salário mínimo teve um aumento real acumulado de 94%; b) em contraste, de 1994 2006, o rendimento médio real das regiões metropolitanas captado pelo IBGE caiu 3%; Ele defendeu uma reforma ampla da Previdência, com indexação de todas as aposentadorias ao INPC, em vez de simplesmente desvincular o aumento do salário mínimo das aposentadorias, para evitar que a pressão se transfira para o aumento real das aposentadorias.
Segundo ele, cada ano o número de pessoas acima de 60 anos nos próximos 25 anos vai aumentar em torno de 4%.
Além disso, de cada três aposentados, dois ganham salário mínimo, e, se continuarem tendo aumento real, por definição o gasto real vai passar de 4% e a relação INSS/PIB vai crescer indefinidamente.
Com a indexação ao INPC, eles teriam a garantia de que não perderiam o poder de compra da aposentadoria, mas deixariam de ter aumentos reais, que sobrecarregam o sistema.
Coube a Guilherme Fiúza exprimir a grande questão: onde está a sociedade, que não se pronuncia, que não participa do debate político que vai definir o seu próprio futuro?
Despesas primárias
24 22 20 18 16 14 12 1991 2000 2005 92 93 94 95 96 97 98 99 03 04 01 02 FONTE: STN GOVERNO CENTRAL (% PIB)
Ao contrário, Lula envia um orçamento para seu provável primeiro ano do segundo mandato com previsão de aumento de gastos, e projeção de crescimento de 4,75% do PIB, irrealista.
O tucano Geraldo Alckmin, por seu turno, fala genericamente em corte de gastos, mas ao mesmo tempo promete manter e ampliar o Bolsa Família, que já atinge mais de 11 milhões de famílias, num gasto anual de mais de R$ 8 bilhões.
Se não o fizer, corre o risco de perder os parcos votos que ainda tem no Nordeste.
Vivemos uma esquizofrenia assustadora, num estado assistencialista, que gasta muito e mal, mas que pretende manter o equilíbrio fiscal às custas de uma carga tributária brutal.
Dois dos oposicionistas — Alckmin e Heloísa Helena —, ainda por cima, afirmam sem pudor que o dinheiro para investimentos virá da redução dos juros, como se fosse simples “decisão política” o corte de juros, ou como se o dinheiro poupado ficasse sobrando para o governo gastar. Ou não sabem que a redução da dívida não significa sobra de dinheiro, mas apenas dívida menor a longo prazo, ou estão enganando mais uma vez os eleitores.
Segunda-feira, no GLOBO, em seminário promovido com o Instituto Milênio, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que acaba de lançar um livro com um título otimista, “Crônicas da convergência”, e um subtítulo mais otimista ainda, “Ensaios sobre temas já não tão polêmicos”, participou com o economista Fabio Giambiagi, do Ipea, e o jornalista Guilherme Fiúza de um debate do qual fui mediador.
Por “não tão polêmicos” leia-se controle da inflação, superávit fiscal e a necessidade das reformas estruturais na economia para um crescimento sustentável, agenda que, surpreendentemente, passou do governo tucano ao petista.
Franco deu uma explicação simples para os altos juros: o Brasil seria comparável a uma empresa mal administrada, cheia de dívidas, com histórico ruim de pagamentos.
Quem se arrisca a emprestar dinheiro a uma empresa assim cobra caro. Entre tantas observações surgidas no debate, duas se destacam para explicar nosso crescimento econômico medíocre nos últimos anos, a uma taxa média de 2% a 2,5% do PIB: o aumento avassalador dos gastos públicos, e a falta de investimentos, causa e conseqüência.
Gustavo Franco ressaltou que, na época do “milagre brasileiro”, nos anos 70, em que crescíamos a taxas asiáticas, o investimento no país chegou próximo a 30% do PIB, sendo que o Estado entrava com cerca de 10% e o restante era bancado pela iniciativa privada. Hoje o investimento privado continua na casa dos 18%, mas a capacidade do Estado é cada vez menor, entre 1% e 2% nos últimos anos, mais baixa taxa de investimento desde o pós-guerra.
E por que falta capacidade ao estado para investir? economista Fabio Giambiagi apresentou o gráfico abaixo, que é esclarecedor. Nos últimos 15 anos, as despesas primárias do governo cresceram vertiginosamente. Entre 1991 e 2004, esses gastos, que correspondem especialmente benefícios do INSS, pagamento de pessoal e transferências a estados e municípios, aumentaram nada menos que 7,5% do PIB. Giambiagi desfiou dados impressionantes: a) nos últimos 12 anos, o salário mínimo teve um aumento real acumulado de 94%; b) em contraste, de 1994 2006, o rendimento médio real das regiões metropolitanas captado pelo IBGE caiu 3%; Ele defendeu uma reforma ampla da Previdência, com indexação de todas as aposentadorias ao INPC, em vez de simplesmente desvincular o aumento do salário mínimo das aposentadorias, para evitar que a pressão se transfira para o aumento real das aposentadorias.
Segundo ele, cada ano o número de pessoas acima de 60 anos nos próximos 25 anos vai aumentar em torno de 4%.
Além disso, de cada três aposentados, dois ganham salário mínimo, e, se continuarem tendo aumento real, por definição o gasto real vai passar de 4% e a relação INSS/PIB vai crescer indefinidamente.
Com a indexação ao INPC, eles teriam a garantia de que não perderiam o poder de compra da aposentadoria, mas deixariam de ter aumentos reais, que sobrecarregam o sistema.
Coube a Guilherme Fiúza exprimir a grande questão: onde está a sociedade, que não se pronuncia, que não participa do debate político que vai definir o seu próprio futuro?
Despesas primárias
24 22 20 18 16 14 12 1991 2000 2005 92 93 94 95 96 97 98 99 03 04 01 02 FONTE: STN GOVERNO CENTRAL (% PIB)