Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, setembro 01, 2006

Celso Ming - Magreza




O Estado de S. Paulo
1/9/2006

O adjetivo para crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre você pode escolher à vontade: foi fraco, decepcionante, medíocre, pífio...

E foi isso aí, um número tão magro que esfriou a comemoração da esperada promoção dos títulos da dívida brasileira na tabela de classificação de risco da agência Moody's, também divulgada ontem.

O comportamento do PIB é acompanhado com interesse por empresas, analistas e escritórios de consultoria porque indica o ritmo dos negócios e sugere o que fazer: investir ou não; fazer estoques ou não; esperar, cercar a concorrência, aumentar a agressividade das vendas...

Por ser atentamente rastreado, todos sabem o que o mercado espera. Para o avanço do PIB no segundo trimestre do ano em relação ao anterior, vinha trabalhando com números entre 0,6% e 1,5%. O que saiu está abaixo das previsões mais pessimistas: crescimento de apenas 0,5%.

Esse número acumula para os primeiros seis meses do ano um crescimento da produção ou da renda de 2,2% em relação ao primeiro semestre do ano passado. Agora é necessário rever as projeções sobre o PIB para todo este ano. O Banco Central, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Desenvolvimento esperavam avanço do PIB de 4,0% a 4,5%. Será preciso agora padrão de crescimento chinês nos dois trimestres seguintes para que a expectativa do governo para todo o ano se confirme. O mercado havia refeito a sua: trabalhava com 3,5%. Agora que a economia mundial está em desaquecimento deve corrigi-la para algo em torno dos 3%.

Mas convém não tirar conclusões demais. Esses números se comportam como corte de serrote, com altos e baixos. O que foi ruim no segundo trimestre pode se recuperar no seguinte. O que vale é a tendência geral, de crescimento medíocre.

Na cascata de estatísticas fornecidas pelo IBGE, o organismo que calcula o PIB, há duas informações a destacar. A primeira é conseqüência do cruzamento de três dados. Um deles é o de que, no lado da demanda por mercadorias e serviços, o carro-chefe do PIB foi o consumo das famílias que cresceu 1,2%. Mas, no lado da oferta, a indústria teve comportamento negativo: queda de 0,3%. A importação também caiu 0,1%, mas caiu menos. Ou seja, a participação das importações no consumo cresceu mais do que a da indústria.

O maior consumo das famílias, por sua vez, tem a ver com vários fatores: baixa da inflação, que reforçou o poder aquisitivo; queda do dólar, que valorizou o salário real; aumento do salário mínimo; expansão do crédito, especialmente o consignado (desconto das prestações diretamente do salário ou da aposentadoria); e as benemerências do governo Lula, especialmente por meio do Bolsa-Família.

Outra informação importante é a que mostra o investimento, que tecnicamente leva o nome de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF). Depois de ter crescido nos dois trimestres anteriores (1,7% e 3,7%, respectivamente), no segundo trimestre caiu 2,2%. Nesse período, o brasileiro está investindo menos e menos investimento pode ser sinal de menos produção futura.

Dizer que essa vagareza se deve ao juro alto é tacanhice porque o crescimento econômico já foi bem mais alto com esses juros aí. Além disso, os juros altos agem sobre o consumo, que não só foi o segmento que mais cresceu como também é o que não dá sinais de retração.

O câmbio adverso talvez tenha tido certa influência, mas não se deve exagerá-la porque, como adiantado acima, a valorização cambial aumentou o salário real e, portanto, aumentou o poder aquisitivo do consumidor, especialmente por meio do barateamento dos alimentos.

Uma das explicações para esse crescimento medíocre do PIB é o avanço do setor público sobre a renda do brasileiro. A carga tributária, que era de 35,8% do PIB em 2004, saltou a 37,4% do PIB em 2005 e pode ter saltado mais acima neste ano. O governo arranca o que pode do contribuinte e devolve a baixa qualidade já conhecida.

celso.ming@grupoestado.com.br

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