Montaner: na lista da idiotia, lula é vegetariano
A entrevista com Carlos Alberto Montaner, feita por Ciça Guedes e publicada no Globo deste domingo tem um defeito: é muito curta. Mas, mesmo assim, excelente. E engraçada. Montaner é um dos autores do Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano, uma crítica severa e bem-humorada ao populismo e ao esquerdismo bocó da região. Os outros autores são Plínio Mendoza e, atenção!, Álvaro Vargas Llosa, e não apenas "Vargas Llosa", como está na abertura do texto, que é como o mundo chama o pai dele, o escritor peruano mundialmente reconhecido. Na finada revista Primeira Leitura, escrevi algumas vezes recomendando o livro e afirmando que os três haviam cometido uma grande injustiça: listavam FHC entre os idiotas populista-esquerdopatas do continente, o que, convenha-se, nem mesmo um esquerdista que não se queira populista ou esquerdopata aceitaria. Montaner acabou concordando comigo e dá uma notícia: na reedição, o ex-presidente sai do rol. E Lula brilha. Acho que ele dá uma escorregada ao dizer que o tucano poderia, a exemplo dele próprio, integrar a lista de "ex-idiotas". Já escrevi o que acho: os autores não entenderam ou não leram a versão de FHC da Teoria da Dependência, que nada tem de populista ou de esquerdista. Na entrevista, Montaner diz que Lula vai integrar o grupo do que ele chama "esquerda vegetariana", junto com Tabaré Vázquez, presidente do Uruguai, e Néston Kirchner, da Argentina. Na esquerda carnívora, ficam Hugo Chávez (Venezuela), Fidel Castro (Cuba) e Evo Morales. Segundo ele, o presidente da Venezuela lidera uma nova "epidemia de idiotice". Só uma discordância com Motaner, um cubano que se exilou aos 17 anos e vive na Espanha: Lula adora carne. De preferência, pingando sangue. Supô-lo vegetariano é cometer o erro que comete o Departamento de Estado americano.A ENTREVISTA - O GLOBO
Rio, 09 de julho de 2006
'Há uma epidemia de idiotice capitaneada por Chávez'
Ciça Guedes
Há dez anos o escritor cubano Carlos Alberto Montaner escreveu o "Manual do perfeito idiota latino-americano", com Vargas Llosa e Plinio Mendoza. O livro — um libelo contra o populismo que, para Montaner, tem nova onda na América Latina — causou furor com sua lista de idiotas. Agora o militante anticastrista, que fugiu de Cuba com 17 anos e morou em vários países, vivendo hoje na Espanha, escreve uma nova versão e diz: FH sai da lista, mas Lula fica.
Na edição de 96 do "Manual do perfeito idiota latino-americano", a lista de idiotas incluía Fernando Henrique e Lula. O senhor diz que Fernando Henrique é autor do "manual da seita" dos populistas ("Dependência e Desenvolvimento na América Latina"), mas curou-se com muitas leituras, o que Lula não fez. Na nova lista, FH sai e Lula fica?
CARLOS ALBERTO MONTANER: A nova edição do "Manual", que sairá em breve, é quase urgente diante do surgimento de uma espécie de epidemia de idiotice capitaneada por Hugo Chávez. Fernando Henrique não estará na nova lista, embora o editor nos tenha sugerido um capítulo sobre ex-idiotas notáveis felizmente curados, no qual poderíamos incluir a nós mesmos — eu, Plínio Mendoza e Vargas Llosa. Sem dúvida o nome de Lula estará na lista, mas dentro da benigna epígrafe da doce esquerda vegetariana.
E quem é carnívoro nessa "onda de neo-populismo"?
MONTANER: Lula, Tabaré Vázquez e Néstor Kirchner, os vegetarianos, têm pouco a ver com Fidel Castro, Hugo Chávez e Evo Morales, os carnívoros. No Cone Sul, o Brasil incluído, tem-se uma visão equivocada do desenvolvimento, mas não devastadora. A senhora Bachelet, ainda que socialista, está mais próxima de Tony Blair que dos vegetarianos e dos carnívoros. No Chile, a classe dirigente alcançou o limiar da sensatez e não busca enfrentar o Primeiro Mundo, mas sim fazer parte dele. Já o eixo Castro-Chávez-Morales continua ancorado no discurso e nos esquemas da Guerra Fria, sonha com uma América Latina revolucionária, que expulse a economia de mercado e, a longo prazo, destrua o Primeiro Mundo. Seus colegas vegetarianos sabem que ele é um tipo perigoso e desagradável, mas toleram suas loucuras e seus discursos insuportáveis porque ele tem um talão de cheques polpudo. Kirchner conseguiu US$ 3 milhões em bônus com ele.
O senhor diz que "os revolucionários latino-americanos têm uma idéia cômica da elasticidade dos orçamentos e da capacidade arrecadadora do Estado". Isso se aplica ao governo brasileiro?
MONTANER: Temo que o presidente Lula, ainda que se deva aplaudir sua moderação, siga sem entender como se cria a riqueza e como se pode gastar mal. Formado nas superstições da luta de classes, talvez não consiga entender que o que pode tirar da miséria metade dos brasileiros é um tecido empresarial exitoso e denso, capaz de gerar emprego. Lula deve ser avaliado não pelos acertos de seu governo, que são poucos, mas pelos erros que não cometeu. Mas essa é quase a definição de um político medíocre.
Nem na política externa o governo de Lula se salva da mediocridade que o senhor diz?
MONTANER: Há 12 anos a economia brasileira e a chinesa tinham o mesmo tamanho. Hoje a chinesa é três vezes maior. Enquanto Lula anda pelo mundo tentando formar um pólo de desenvolvimento com África do Sul, Índia e Rússia, países como Chile, China e Coréia do Sul tentam se associar aos mercados e a nações. Lula está preso à idéia absurda de que há rivalidade norte-sul, leste-oeste, centro-periferia. Não superou a segunda metade do século XX.