Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 01, 2005

MERVAL PEREIRA Angústias petistas

O GLOBO


A cassação do ex-ministro José Dirceu é um marco histórico na política brasileira e simboliza a derrocada do PT, partido que ajudou a fundar e do qual foi o maior organizador dos últimos anos. O agora ex-deputado foi eleito com mais de 500 mil votos em São Paulo na onda da vitória de Lula para presidente da República, que ajudou a tornar realidade. Identificado como o principal responsável pela organização de um esquema de corrupção que fez inchar a base partidária do governo na Câmara à custa de distribuição de cargos e de dinheiro, o deputado José Dirceu tentou durante quatro meses evitar a cassação, que se consumou ontem como uma resposta da Câmara aos anseios da opinião pública, que via na sua eventual absolvição o sinal mais alarmante de um grande acordo para evitar a punição do principal líder político do PT.

O acirramento dos ânimos políticos está levando a que cresça no PSDB a tese de que o candidato do partido deve ser o prefeito paulistano José Serra, que teria o perfil mais apropriado para uma disputa que se prenuncia virulenta. A tese contrária, que estava sendo apoiada pelos aliados do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, propunha que a agressão ao PT não seria o melhor caminho para enfrentar a campanha de reeleição do presidente Lula.

O governador paulista seria um candidato mais leve, enquanto o prefeito José Serra, com seu modo aguerrido de fazer política, atrairia para a campanha a virulência dos adversários, e o PSDB perderia a chance de colocar-se em contraposição ao atual governo pela competência de gestão, e não pela agressividade.

O governador Alckmin, com o perfil de médico interiorano, político pacato, mas eficiente administrador, seria a melhor contraposição ao líder sindical petista, um presidente que tentará a reeleição com a popularidade decadente e que terá a apoiá-lo um partido despedaçado pelas diversas defecções de políticos e pelas acusações de corrupção e que, por isso mesmo, terá que ser mais agressivo para não ser desmoralizado nas urnas de 2006.

A postura de contrapor à possível agressividade do partido do governo um candidato de perfil moderado, porém, está deixando inquietos alguns dos principais líderes tucanos, que temem que uma postura mais passiva diante de possíveis acusações petistas poderá dar ao PSDB uma imagem anódina, que não corresponderia ao desejo da eleitorado.

Está preocupando esses líderes tucanos a acusação de que o partido está tendo um comportamento ambíguo diante das acusações contra o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, na sua gestão na prefeitura de Ribeirão Preto. O partido não pretende mudar sua posição em relação a Palocci, porque entende que é seu papel proteger a governabilidade e a manutenção de uma política econômica que classifica como continuidade da dos governos de Fernando Henrique Cardoso.

Mas também não quer passar a imagem de que está envolvido em qualquer acordo político para preservar o governo Lula, e considera que a campanha eleitoral será virulenta independentemente do tom que o candidato tucano queira dar. Para enfrentar uma campanha agressiva, o prefeito José Serra teria características mais apropriadas, além de um trunfo político que até agora se mostra imbatível: as pesquisas de opinião, que o apontam como o único candidato de todos os partidos em condições de vencer o presidente Lula no momento.

Alckmin, talvez para mostrar-se capaz de estocadas políticas mais agressivas, tem alterado o tom de suas críticas nos últimos dias, além de estar mais solto na sua peregrinação pelo país. Mas já anunciou que não fará uma campanha de acusações contra Lula, mas sim apontando para o futuro. Essa postura, que é apoiada por líderes tucanos importantes como o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, não encontra repercussão em grande parte do partido, que acha que na campanha eleitoral será preciso mais combate diante dos petistas que já ensaiam se reorganizar.

Além de todos os detalhes da campanha eleitoral, há a postura no governo em substituição a Lula em 2007. Se existe o temor de que uma campanha sangrenta possa inviabilizar a governabilidade do próximo presidente da República, há também a previsão de que haverá necessidade de um candidato que conheça a máquina pública para desmontar o aparelhamento feito pelo PT.

O eventual próximo presidente da República eleito pelo PSDB terá diante de si uma tarefa hercúlea, segundo a análise de diversos dirigentes tucanos: a de retomar para o Estado brasileiro a máquina administrativa, que estaria hoje dominada pelos petistas e seus aliados.

A tarefa não seria simples, pois além do fato de que cargos-chave na administração pública estariam dominados pelo partidarismo, estaria havendo uma inversão da função de diversos postos públicos, o que teria reflexos no próprio andamento da economia. As agências reguladoras seriam um exemplo dessa distorção das funções dos órgãos do Estado.

Um mecanismo que seria modernizador das decisões do Estado acabou sendo entregue a políticos que não teriam a capacidade técnica para dirigi-los. O ex-deputado do PCdoB Haroldo Lima na agência do petróleo, a ANP, e o ex-deputado Paulo Lustosa na Anatel seriam exemplos desse uso político das agências reguladoras.

O prefeito José Serra, que continua mais candidato do que nunca, sabe que tem pela frente uma decisão difícil, a de deixar a prefeitura no início do próximo ano, quando terá completado apenas um ano de mandato. Ele sabe também que não poderá ser um candidato como foi em 2002, enfrentando restrições de partidos aliados como o PFL. Por isso não pretende forçar nada, e condiciona sua candidatura a um consenso partidário.



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