Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 17, 2005

DORA KRAMER O mapa das intenções

Em seu primeiro discurso depois da divulgação das pesquisas Datafolha e Ibope/CNI registrando redução nos índices de apoio à reeleição, o presidente Luiz Inácio da Silva desenhou ontem com clareza seu mapa de intenções eleitorais para 2006: só disputa para ganhar é a principal delas.
Mas, em caso de desistência, não vai se afastar do processo político como fez José Sarney em 1989, quando, diante de índices de popularidade ínfimos, não teve candidato, não emprestou seu apoio a ninguém, assistiu de cima do muro à luta pela própria sucessão.
Lula não agirá assim. A serem dignas de credibilidade suas palavras, pretende influir e atuar como cabo eleitoral qualificado: 'Se decidir não ser (candidato), vamos escolher alguém para ganhar (as eleições).' Na solenidade de lançamento da pedra fundamental da nova refinaria da Petrobrás, em Pernambuco, Lula anunciou que falava 'com a alma'.
Nessa condição, foi claro como nunca havia sido antes a respeito de seus planos políticos, rejeitando, de um lado, a pressão dos correligionários para decidir disputar um novo mandato e, de outro, enterrando certezas inamovíveis sobre sua candidatura a qualquer custo.
O roteiro seguido por Lula em períodos pré-eleitorais anteriores, indica que ele pode ter feito uma declaração para seu público interno, aí considerando PT e adjacências.
De outras vezes ele já acenou com a hipótese de não se candidatar com o intuito de pressionar (para não dizer enquadrar) os aliados a lhe emprestarem apoio incondicional.
Seja como for, o presidente fez um movimento importante.
Fincou estacas da porta de saída para uma eventual desistência, caso as coisas piorem muito, e lançou as bases do discurso com o qual enfrentará seus adversários no próximo ano, seja ele ou não o candidato.
Lula não deixou dúvida sobre sua intenção de retomar o discurso ideológico abandonado em 2002 em favor do pragmatismo administrativo e da suavidade política.
Atacou fortemente a imprensa como indutora do oposicionista, ignorando a influência dos meios de comunicação em sua trajetória do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista até a Presidência da República.
Construiu paralelos entre a situação dele e de outros líderes políticos populistas da América do Sul, com destaque para Hugo Chávez, e deixou claro que adotará a estratégia de se mostrar uma vítima das elites e do conservadorismo antidemocrático.
Goste-se ou não, concorde-se ou não, seja eficaz ou não, ao menos Lula apontou o caminho que pretende seguir.


Lula só disputa com garantia de vitória e opta pelo discurso da vitimização



DE RAÇAS
O presidente Lula lavrou ontem seu protesto contra os que acham os nordestinos bons apenas para construir pontes e viadutos. 'Pensam que somos uma raça inferior.' Consigne-se: não foram as elites as autoras da classificação hierárquica entre raças nem as responsáveis pela qualificação dos trabalhadores da construção civil no escalão inferior.


ÔNUS DA PROVA
Diante do acinte da Câmara na absolvição de um réu confesso, começam a aparecer sugestões para reação do eleitorado. Uma delas, de Antonio Carlos Schiaveto, é particularmente criativa - aliás, só terão abrigo neste espaço estas, as agressivas e grosseiras ficam de fora.
Ele propõe o lançamento de um movimento nacional baseado no argumento da 'falta de provas' e sugere o seguinte: 'Na falta de provas de que o deputado é contra a corrupção, o eleitor não vota nele.' E como o deputado vai provar ao eleitor que é um combatente da luta anticorrupção? 'Votando abertamente pela cassação do corrupto.' O raciocínio do leitor é o de que o voto secreto existe para proteger de pressões a escolha fundada no princípio da correção. A opção perniciosa dispensa, portanto, o sigilo. Assim, quem quiser merecer a renovação do mandato legislativo que trate de abrir à opinião pública sua posição.


DOIS CASOS
Duas situações semelhantes, duas atitudes opostas dizem muito a respeito das convicções e da independência dos governantes. Ambas referem-se a grampos telefônicos autorizados pela Justiça e feitos pelas polícias dos Estados da Bahia e do Espírito Santo.
O governador capixaba, Paulo Hartung, não demorou 24 horas para demitir o secretário de Segurança Pública diante da descoberta de que a polícia grampeara os telefones da redação da Rede Gazeta, de Vitória, para monitorar conversas de jornalistas.
Na Bahia, o governador Paulo Souto levou quase três anos para demitir o delegado da polícia que, em 2002, esteve à frente de uma operação de escutas tendo como alvo inimigos do senador Antônio Carlos Magalhães e montada a partir da Secretaria de Segurança Pública.
O delegado até outro dia recebia sem trabalhar. Foi exonerado um dia desses. Mas a secretária de Segurança da época, Kátia Alves, continua dando expediente na administração estadual como presidente da empresa baiana de saneamento.

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