Em março de 1944, acampado no Norte da África, Saint-Exupèry escreveu inquietante texto sobre o futuro. “Quando esta guerra acabar, os verdadeiros problemas irão começar”, disse o jornalista, aviador e romancista, em Lettre au colonel X. Quatro meses depois ele desapareceu, em vôo de reconhecimento sobre o Mediterrâneo.
O texto faz parte da coletânea de ensaios e reportagens publicados postumamente sob o título de Un sens a la vie. Os verdadeiros problemas são sempre os mesmos, e as guerras não passam de frustradas tentativas para resolvê-los.
Hoje estarão reunidos, em Moscou, chefes de Estado dos grandes países que venceram o Eixo há 60 anos. Como todas as guerras se parecem, os três grandes (Churchill, Roosevelt e Stalin) se encontraram em Ialta, no início de fevereiro de 1945, a fim de decidir o futuro do mundo. Naquele momento, os anglo-saxões não tiveram qualquer constrangimento emir conversar com o dirigente soviético em sua própria casa. Nos últimos 60 anos omundo mudou – e não mudou. Os verdadeiros problemas estão aí, conforme previu Saint-Exupèry, esse fascinante ídolo dos tempos modernos, morto aos 44 anos.
As duas maiores potências daquele tempo (os soviéticos caíram, mas os russos não estão mortos) se encontram novamente sob o meridiano de Ialta. Bush tomou a iniciativa da provocação, criticando Roosevelt por ter aceitado, em Ialta, a divisão da Europa. Esqueceu-se de que a União Soviética fora o país mais sacrificado no conflito, com mais de 20 milhões de mortos, entre soldados e civis. De junho de 1941, até julho de 1944, com a abertura da Segunda Frente, os soviéticos suportaram todo o peso da guerra no continente. Estavam com o ânimo combatente em alta com a vitória e era difícil negar-lhes o que quisessem. O acordo foi rigorosamente respeitado pelos soviéticos. Não se tratou de uma virtude dos comunistas, mas do velho patriotismo dos soldados russos, que constituíram o grosso das tropas no conflito.
Para nós, no entanto, importa mais a advertência que Bush endereçou a Putin, alertando-o para que “respeite os seus vizinhos”. Seria o caso de o dirigente russo devolvê-la ao norte-americano. A longa história do intervencionismo norte-americano neste hemisfério retira do presidente Bush autoridade para tratar do tema. A União Soviética não respeitou, é certo, seus países vizinhos. O que ocorreu na Hungria e na antiga Tcheco-Eslováquia não lhe concede o diploma de boa vizinhança. Mas os Estados Unidos não ficam atrás; ao contrário. A guerra expansionista contra o México e as freqüentes intervenções na Nicarágua, na Guatemala, na República Dominicana (com apoio brasileiro), em El Salvador, no Chile, em favor de Pinochet contra Allende, em Granada, para coisa nenhuma, e no Brasil, em 1963/1964, são parte de uma lista incompleta de atos de desrespeito aos vizinhos.
Ainda agora os Estados Unidos intervieram diplomaticamente contra o Brasil ao pressionar os países árabes para que não enviassem seus chefes de Estado à Conferência de Brasília. Deixaram de vir os seus principais aliados, como o príncipe saudita e o presidente Mubarak, do Egito. Outro que não virá é o presidente da Colômbia. Não é preciso perguntar quem lhe pediu esse favor.
Para fechar a coluna, mais um problema político doméstico: o vice-presidente José Alencar disse a Leonardo Attuch, da revista IstoÉ Dinheiro, que pode vir a ser candidato à sucessão de Lula. Em política só se admite uma possibilidade quando já existe o desejo. O empresário foi vice de Lula representando os conservadores, para dar aval de credibilidade ao governo. Hoje diz que o governo não cumpre o que foi prometido ao povo. Sua posição é a dos setores produtivos, que não suportammais os juros altos, que só beneficiam o setor financeiro.
Se for candidato, e não chegar ao segundo turno, Alencar poderá, com seu apoio, decidir o resultado das eleições. A isso chamamos astúcia da dialética.
jb
Entrevista:O Estado inteligente
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