O GLOBO - 28/06/11Uma Argentina ou dois Chiles. É deste tamanho a economia subterrânea no Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) e a Fundação Getúlio Vargas. Por não ser formal, é difícil medir, mas se pode imaginar o mal que ela faz ao país. Segundo estudo que será divulgado hoje, no ano passado ela foi de R$663,4 bilhões ou 18,3% do PIB.
O novo presidente do Etco, embaixador Roberto Abdenur, explica que para se chegar ao número os economistas têm que usar métodos de aproximação. Umas das formas, diz o economista Fernando Holanda Barbosa Filho, é o cálculo pelo mercado de trabalho. Mesmo os trabalhadores informais entram nas pesquisas do IBGE, como a Pnad, que pega todo o Brasil, e a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que é calculada em seis regiões metropolitanas.
- A economia informal deixa vestígios como os do mercado de trabalho e na demanda por moeda, e nós podemos calcular pelo trabalho informal ou pelo método monetário - diz Barbosa Filho.
Por esses vestígios eles vão calculando. É sempre uma medida imprecisa, por sua própria natureza, mas que tem ficado mais sofisticada. No futuro, vai se tentar incluir a renda do capital e estudos por setor econômico e regiões do país.
A boa notícia é que essa economia que eles definem como subterrânea, que inclui "bens e serviços não reportados deliberadamente ao governo", não tem crescido. Ficou estável no ano passado em relação ao ano anterior como proporção do PIB; na série que começa em 2003, o tamanho dessa economia da sombra caiu de 21% para 18,3%. A má notícia é que mesmo num ano de forte crescimento do PIB, 2010, e num período de maior formalização do emprego, o tamanho dessa economia não caiu, mas ficou estabilizada em torno de 18% do PIB.
Uma das razões, segundo Fernando Holanda Barbosa Filho, é que apesar de a PME mostrar uma queda da informalidade no emprego, o dado nacional não tem mostrado uma queda tão forte.
O economista Luiz Schymura explica que o estudo é ferramenta para a organização da sociedade:
- Entramos nessa empreitada com o Etco porque achamos que esse assunto é pouco discutido. Quando o político usa o caixa dois para cobrir gastos de campanha, a sociedade contemporiza; quando ele põe no bolso é que há uma condenação maior. Combater esse jeitinho brasileiro é uma discussão fundamental no Brasil hoje.
Abdenur explica que o Etco não faz lobby; quer apenas estudar, informar, dar às empresas ou ao setor público instrumentos para se criar um melhor ambiente de negócios no combate à pirataria, à sonegação, à concorrência desleal.
Já foram divulgados números até maiores do que este para a economia informal brasileira, mas o Etco e a FGV acham que melhor do que imaginar um número, é calcular, como eles têm feito.
- A economia subterrânea é um sintoma. Não adianta apenas combater. É preciso fazer um esforço de institucionalização do país - disse Marcílio Marques Moreira, também do instituto.
Um exemplo aconteceu na Bahia. O Etco firmou parceria com a secretaria de Fazenda do estado e a Microsoft, que desenvolveu programa que consegue cruzar informações para evitar o falso destino; ou seja a empresa declarar que está vendendo para outro estado para pagar menos ICMS.
- Desta forma se faz o trabalho de investigação atrelado à nota fiscal eletrônica. O ICMS é hoje a maior fonte de sonegação através da simulação do destino. O programa pega esse tipo de sonegação, mas o compromisso com a Microsoft foi que isso fosse compartilhado com outros estados. E está sendo mesmo, agora é o Espírito Santo a implantar o sistema - diz Hoche José Pulcherio, presidente do Conselho de Administração do Etco.
Como economia subterrânea eles definem a produção de bens e serviços que sonega impostos, não paga contribuições para a seguridade social, foge do cumprimento de leis e regulamentações trabalhistas e evita custos do cumprimento de normas.
Mas como em parte é um sintoma, o que eles querem é combater através de diversas formas. Uma delas é simplificar o pagamento de impostos no Brasil. O excesso de normas é um incentivo a que se entre na informalidade ou a que uma empresa formal acabe tendo parte de suas atividades na informalidade.
A confusão é exatamente esta. Não há uma fronteira precisa entre formal e informal, entre legal e ilegal no Brasil. Há subdeclaração de renda. O setor formal fornece para o informal, e se beneficia em parte dos preços mais baixos de fornecedores informais. Ao mesmo tempo é prejudicado pelo concorrente que não paga impostos.
Para desfazer essa teia que foi se formando na economia, pela complacência ou pela complexidade das normas do país, o Etco quer usar os estudos da FGV sobre o tema para mostrar o quanto o país perde. E construir coalizões entre empresas e governo que pressionem a economia para a formalização cada vez maior. Foi o que fizeram com o Ministério da Justiça na luta contra a pirataria e com a Receita e o Cade para combater a concorrência desleal no mercado de cervejas.
Entrevista:O Estado inteligente
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