As safras de grãos recordes no Brasil e no mundo anunciadas nesta
sexta-feira não deverão conter as pressões sobre a inflação por causa
do aumento da demanda e da especulação financeira no mercado de
commodities.
É o que a OCDE prevê no seu panorama da agricultura mundial. O estudo
foi divulgado no mesmo dia em que a presidente Dilma Rousseff
apresentou, com ênfase justificada, o plano de safra e pecuária para
2011/12, com recursos de R$ 107 bilhões para financiamento de uma
produção de grãos estimada pelo IBGE em 106 milhões de toneladas. No
exterior, "há sinais que os custos de produção estão aumentando e a
produtividade recuando", diz a OCDE, destacando o preço do
combustível.
As cotações das commodities agrícolas tiveram uma alta de 48% nos
últimos doze meses e o petróleo, 38%, de acordo com o tradicional
levantamento que a revista britânica Economist realiza semanalmente.
Podem crescer menos nos próximos meses, porque a economia mundial não
reage, mas os baixos estoques, apenas 494 milhões de toneladas e o
movimento especulativo provocado pelo reduzido rendimento dos juros,
continuarão pressionando a inflação, no Brasil e no exterior. É o novo
desafio da economia mundial. Mais nosso porque, mesmo com um
crescimento menor do PIB, o consumo interno vem aumentando
proporcionalmente mais no Brasil que nos EUA e na Europa. Um cenário
aparentemente contraditório de mais alimentos e mais inflação.
A solução pelo menos parcial passaria pelo aumento da produtividade
para reduzir os custos de produção agrícola e formação de estoques.
No plano agrícola que a presidente anunciou na sexta-feira, há
recursos generosos, RS$ 107 bilhões, a juros quase negativos para os
agricultores para aumentar a produtividade, dos quais R$ 5,2 bilhões
para a comercialização, abastecimento interno e equalização dos
preços.
O dilema. Aqui o desafio é maior, pois no Brasil há mais inflação que
nos Estados Unidos e na Europa. A Conab, por orientação do Ministério
da Agricultura está comprando para fazer estoques; RS$ 221 milhões só
neste mês e vai dispor de mais recursos. A questão é que essas compras
podem estar sendo feitas não só para armazenar para o período da
entressafra, mas para garantir um preço mínimo adequado para o
agricultor a fim de estimulá-lo a continuar plantando aqueles produtos
que lhe dão maior rendimento. E, se os custos internos por área
produzida forem elevados comparando-se aos externos, a equalização
poderá acabar sendo feita aos níveis internacionais.
Brasil, o lado bom e ruim. A alta das cotações externas das
commodities agrícolas tem um duplo efeito sobre o Brasil. Favorece as
exportações, que sustentam a balança comercial, confirmando a posição
de liderança que o Brasil tem hoje no mercado mundial, mas contamina
os preços internos. Isso explica em parte, o fato de termos tido
grandes safras nos últimos anos e ao mesmo tempo pressões crescentes
sobre os preços dos alimentos, numa cenário que pode repetir-se nos
próximos meses.
Isso enfraquece as medidas do governo e do Banco Central para conter a
inflação e traze-la para baixo de 5%. A alta dos preços externos
deverá manter-se este ano e pode continuar sendo repassada para o
mercado interno. É evidente que o quadro seria bem pior se o Brasil
não tivesse essa excelente performance agrícola e pecuária,
Governo atento. Na apresentação do Plano de Agrícola e Pecuária, a
presidente registrou o desafio. Falou na obtenção de preços razoáveis
no mercado interno e destacou o peso dos financiamentos destinados a
compra de equipamentos. "Do total de R$ 107 bilhões em crédito rural,
89% serão financiados com juros de até 6,75% ao ano. Isso significa
juros próximos do zero, compatíveis com aqueles oferecidos no mercado
externo." E acrescentou que os produtores estavam recebendo armas para
que possam competir dentro e fora do país, com destaque especial para
renovação dos canaviais e produção de açúcar sem afetar o álcool, como
ocorreu este ano.