O Estado de S. Paulo - 28/06/2011 |
O governo certamente se excedeu nos fogos, mesmo levando em conta a época de festas juninas, em comemoração à melhora da nota com que a agência de classificação de risco Moody"s acaba de brindar a economia brasileira. Agora subimos de nível, para a prestigiosa companhia das Ilhas Mauricio e do Casaquistão, e alcançamos o segundo lance, de baixo para cima, na grade de classificação das economias em que se pode apostar com riscos moderados de levar um calote.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, veio a público para dizer que a passagem da nota Baa3 para Baa2 era um "reconhecimento da correção na conduta da política econômica". E o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, em comunicado, ressaltou que a graduação do rating brasileiro "reconhece a capacidade e efetividade das atuais políticas econômicas". Pode até ser que seja por aí. Mas, quando se sabe que os atribulados Portugal, Espanha e Itália ainda estão três degraus acima ou que México, Azerbaijão e Botswana exibem notas superiores à do Brasil, melhor talvez fosse moderar nos rojões. As notas das agências de risco expressam avaliações bem específicas, a partir de critérios estranhos. Instituições seculares, Moody"s e Standard & Poor"s, as duas maiores das "três irmãs" das agências de classificação de crédito globais - a terceira é a Fitch Ratings -, nasceram, na virada do século XX, como avaliadores de risco dos investimentos na expansão das ferrovias para o oeste americano. Da especialização na avaliação de riscos privados transbordaram, a partir de uma expansão global, no rastro da financeirização das economias, para a avaliação dos riscos financeiros de governos - algo, na essência, articulado com outras dimensões de análise, inclusive e especialmente as políticas. Não é mera coincidência que o formato atual de funcionamento das agências de classificação de risco date do início dos anos 90, quando o sistema financeiro consolidou uma hegemonia global sobre as economias, da qual derivam os dramáticos eventos que convulsionam o mundo, principalmente nos últimos cinco anos. As agências de ratings são parte de um sistema repleto de peculiaridades, em que a medição dos riscos de crédito, principalmente no caso dos créditos soberanos, ganhou uma elasticidade sem precedentes. Mesmo errando mais do que seria aceitável, as agências têm lugar de relevo neste mundo bizarro. Sem seu aval, gestores de fundos são impedidos de recomendar investimentos. Empresas e governos, portanto, dependem das agências para captar recursos. No caso dos governos, para as agências, o que está em jogo é a evolução das dívidas em títulos públicos e a política fiscal empregada para assegurar sobras de recursos suficientes para manter as dívidas administráveis. O resto, como, por exemplo, a pujança do mercado interno ou os esforços e estímulos locais para o investimento produtivo, não conta. Cardiologistas que examinam as condições do sistema circulatório sem se preocupar com o estômago do paciente, os analistas das agências de ratings se arriscam a emitir relatórios - e frequentemente o fazem - atestando boa condição cardíaca para empresas e, mais grave, para economias que se contorcem em cólicas. O banco de investimentos Lehman Brothers, cuja estrondosa quebra entrou para a história como marco do crash de 2008, manteve o triplo A, melhor classificação de risco possível, até vésperas da ruína. A Grécia, hoje em situação desesperadora, merecia, mal faz um ano, quando já cambaleava e negociava um primeiro socorro do FMI e do Banco Central Europeu, classificação de crédito melhor do que o do Brasil. Chama a atenção que, depois de todas as trapalhadas, as avaliações das agências de classificação de riscos ainda sejam tão reverenciadas - e seus erros mereçam tantas justificativas que não os justificam. Primeiro, porque, para investimentos em produção, suas notas valem muito pouco. Depois, porque o retrospecto não é nada abonador. As agências são lentas na revisão de posições e conferem valor excessivo ao passado. Parecem só conseguir antecipar fatos consumados. Suas notas sobem quando faz tempo que as coisas vão bem e caem quando o desastre não tem mais volta. A verdade é que, como instrumento independente capaz de impedir que crises de dívida se instalem e se propaguem, as agências são um fiasco. Só mesmo num mundo tão bizarro elas podem manter o prestígio e a importância que ainda lhes emprestam. |
Entrevista:O Estado inteligente
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