Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 26, 2011

Razões que a razão desconhece FERREIRA GULLAR

FOLHA DE SÃO PAULO - 26/06/11

O caso Cesare Battisti parece exigir reflexão, tal o impacto que
causou a decisão do Supremo Tribunal Federal ao confirmar a do
presidente Lula, negando-lhe a extradição.

Como se sabe, a extradição foi pedida pelo governo italiano, conforme
os termos do tratado assinado pelos dois países. Battisti havia sido
condenado, na Itália, à pena de prisão perpétua pelo assassinato de
quatro pessoas.

De acordo com aquele tratado, a extradição pode ser negada em caso de
crime político. Sucede que os homicídios por ele cometidos se
caracterizavam como crimes comuns, o que foi reconhecido pelo STF, em
2009, autorizando sua extradição para a Itália. No entanto, nessa
mesma ocasião, admitiu caber ao presidente da República consumar ou
não a extradição.

Pois bem, Lula ficou com o processo até o último dia de seu governo
para, só no derradeiro momento, negar a extradição do italiano. A
todos nós surpreendeu o ato do presidente da República, contrariando
uma decisão de alta corte de Justiça do país. Em que se funda tal
arbítrio, se aquela corte reconheceu que os crimes cometidos
justificavam o pedido de extradição?

A principal alegação do procurador-geral de Justiça foi que Battisti,
se devolvido a seu país, estaria sujeito a tratamento arbitrário e
vingativo, argumento destituído de lógica, uma vez que a Itália vive
sob regime democrático. O mais incompreensível de tudo isso é que o
STF, ao apreciar a decisão de Lula, contrária a seu julgamento
anterior, voltou atrás, aceitou a permanência de Battisti no Brasil e
mandou soltá-lo.

Acresce o fato de que, tendo entrado clandestinamente no Brasil
portando documentos falsos, não pode ser aceito como visitante legal
ou imigrante. Tampouco pode ser admitido como refugiado político, já
que não foi nessa condição que entrou no país. Teria que ser expulso
mas, como esta é a terra do jeitinho, logo um jeito se deu para
legalizar-lhe a situação à margem da lei.

Mas, afinal de contas, quem é de fato Cesare Battisti, para merecer o
amparo especial de nossas autoridades e instituições? O que faz dele
um personagem importante a ponto de levar o presidente da República e
o Supremo Tribunal Federal a porem em risco nossas relações com um
país cujo povo faz parte de nossa história?

Cesare Battisti, depois de militar no Partido Comunista Italiano, dele
se afastou para ingressar em organizações que desejavam chegar ao
poder pelas armas. Praticou atentados, assaltou cidadãos e terminou
condenado a seis anos de prisão.

Na cadeia, conheceu o teórico de uma organização terrorista, chamada
Proletários Armados pelo Comunismo. Isso no final da década de 1970,
quando a Itália vivia sob regime democrático e quando qualquer cidadão
poderia candidatar-se e disputar o poder pelo voto.

Mas aqueles ´revolucionários´ _que não tinham voto algum e, por isso,
jamais chegariam ao poder democraticamente queriam alcançá-lo pela
força das armas. Como também não eram mais que um pequeno grupo de
cretinos sectários, voltaram-se para os atentados e assaltos, a fim de
roubar o dinheiro dos cidadãos e comprar armas.

Foi assim que Battisti matou quatro pessoas: uma porque a considerava
fascista; outra que era chofer da penitenciária onde estivera preso, e
as outras duas um joalheiro e um açougueiro, para lhes roubar
dinheiro.

O resultado dessa série de atos criminosos e irresponsáveis foi a
prisão de seus autores e o fim da tal organização. Battisti então
fugiu para a França, de onde, ao ter sua extradição decretada, fugiu
para o Brasil. Foi então que escreveu um livro onde dizia renunciar à
conquista do poder pela violência e passou a usar esse argumento para
não pagar pelos crimes cometidos.

Mas de que vale essa renúncia feita depois que sua organização havia
sido desmantelada pela repressão e ele mesmo já não podia viver em seu
país? Iria fazer revolução armada na França ou no Brasil? E a vida das
pessoas que ele matou, quem paga por ela? Com a palavra o
ex-presidente Lula e os ministros do STF, que lhe garantiram a
impunidade.

Resumo da ópera: o cara matou quatro pessoas inocentes, foi condenado
à prisão perpétua, fugiu, entrou no Brasil ilegalmente mas, ainda
assim, obteve o apoio de nossas autoridades para aqui viver livre e
impune.

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