Só não escale Pezão para responder a perguntas que apenas ao senhor cabe responder. Não são poucas. E estão na boca das pessoas que ainda se preocupam com as parcerias públicas privadas entre os políticos, seus amigos e benfeitores. Sou do tempo em que os políticos escondiam amantes, tesoureiros de campanha e empresários do peito.
Amantes ainda são mantidas à sombra — embora algumas delas, de um tempo para cá, tenham protagonizado barulhentos scândalos. Outras morrem sem abrir o bico. Tesoureiros? Esses se expõem ao sol. São reconhecidos em toda parte. E fingem que abdicaram de cometer antigos pecados. Quanto a empresários do peito... Liberou geral.
Por que o senhor viajou a Porto Seguro, acompanhado de parentes, em jatinho cedido por Eike Batista, dono de muitos negócios que dependem do interesse ou da boa vontade do governo do Rio de Janeiro? Foi o senhor que pediu o jatinho emprestado? Foi Eike que ofereceu? Se ele ofereceu, como soube que o senhor precisava de um?
Há voos comerciais diários para Porto Seguro. Por que não embarcou em um deles pagando do próprio bolso a sua e as passagens de familiares? O jato de Eike decolou com o senhor do Aeroporto Santos Dumont às 17h da sexta-feira, dia 17. O voo 3917 da TAM decolou antes — às 10h15m. Nele, o senhor teria chegado ao seu destino às 14h16m.
Não considera indecoroso viajar à custa de um empresário que em 2010 doou para sua campanha R$ 750 mil? Um empresário beneficiado por isenções concedidas por seu governo? Foi por isso que sua assessoria, no primeiro momento, negou que o senhor tivesse voado para Porto Seguro? Foi por isso que o senhor voltou em jatinho alugado?
Se a autoridade máxima de um estado pede ou aceita favores de empresários, não será compreensível que seus secretários também aceitem, igualmente os subsecretários, chefes de gabinetes, chefes de repartições — e assim por diante? Que diferença existe entre um agrado feito com dinheiro e outro com gasolina e conforto?
O que o levou a Porto Seguro foi a comemoração de mais um aniversário do empresário Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta Construções, cujos contratos abocanhados para obras durante seu governo valem em torno de R$ 1 bilhão. Somente no ano passado, a Delta ganhou 18 contratos — 13 deles sem licitação. Em momento algum o senhor imaginou que não pegaria bem comparecer a um evento promovido por quem tanto lhe deve? Um homem público não deveria saber distinguir entre prestadores de serviços ao Estado e amigos pessoais? A mistura do público com o privado não acabaria por causar sérios danos à sua imagem?
Quem acreditará que Cabral, amigo de Cavendish, nada tem a ver com Cabral, governador do Rio e cliente de Cavendish? E onde mesmo seria a festa de aniversário do empresário? No Jacumã Ocean Resort, de propriedade do piloto Marcelo Mattoso de Almeida — um ex-doleiro acusado de fraude cambial há 15 anos.
Marcelo foi dono da empresa First Class, acusada de ter cometido crime ambiental na Praia do Iguaçu, na Ilha Grande, em Angra dos Reis. Sinto muito, governador, mas é com esse tipo de gente que o senhor anda? É a esse tipo de gente que o senhor não se constrange de ficar devendo favores?
Eike Batista disse que cedeu seu jatinho ao senhor com "satisfação" e "orgulho". E que é livre para selecionar suas amizades. Se quiser ser levado a sério, o homem público que deve seu mandato ao povo está proibido de desfrutar do mesmo grau de liberdade. Reflita com calma a respeito, Cabral. E não deixe uma só pergunta sem resposta.