Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 04, 2008

Míriam Leitão Viés de baixa


A queda da taxa de juros no Brasil virá mais cedo do que se imaginava. Não deve ocorrer na semana que vem, mas aquele ciclo de aperto não foi apenas interrompido, foi encerrado. No começo do ano que vem, o Banco Central vai derrubar a taxa. A queda da demanda vai reduzir o impacto do dólar nos preços e diminuir a pressão inflacionária, permitindo o corte dos juros.

O Boletim Focus reduziu a previsão de crescimento do ano que vem para 2,8%, mas elevou a inflação de 2009. A análise comum, feita até agora, é que o dólar elevaria a inflação, mas essa idéia parece desconsiderar que a queda da demanda vai diminuir a inflação.

A crise econômica no Brasil chegou de repente, por vários canais: os prejuízos com derivativos, a redução do crédito, a queda dos ACCs, e o reflexo direto da crise lá fora. O anúncio das 1.300 demissões da Vale é parte desse processo. Em outubro, a economia entrou em outro ritmo. O impacto da alta do dólar em alguns preços vai ser neutralizado pela queda dos preços das commodities e da demanda. Mesmo que o dólar tenha provocado a remarcação dos eletrônicos, as promoções natalinas e pós-natalinas, para atrair o consumidor, podem neutralizar o efeito. O dólar está subindo por motivos específicos, como ontem, por causa da saída da moeda, e a cotação tende a se estabilizar num nível mais baixo que agora.

Os últimos índices de inflação já mostraram redução do risco. Até IGPs têm caído, mesmo com o dólar em alta. A queda da produção industrial de outubro foi mais forte do que a maioria dos economistas previa, e mais generalizada. Outros momentos de queda da produção industrial foram efeito de algum fato específico. Agora, ninguém acha que é um fato isolado. Mesmo os mais otimistas, que acham que a produção industrial cairá em novembro, não acham que outubro foi um ponto fora da curva. A maioria acredita que este é um momento em que a economia mudou de patamar: indo para um clima de menos produção, menos contratação, menos investimento.

O BNDES acha que o investimento vai cair de 18% para 8%, por causa da falta de crédito para a compra de máquinas e equipamentos. Alguns setores estão diretamente atingidos, como petróleo, mineração e siderurgia. Apesar de ser uma economia muito voltada para o mercado interno, há canais de ligação entre a economia internacional e a interna.

Veja o caso de mineração e siderurgia. A ArcelorMittal suspendeu encomendas de minério da Vale porque a Europa está em recessão. Aqui, reduziu a produção nas siderúrgicas, como Tubarão, que até desligou alto-forno. A China diminuiu as compras de minério porque está perto da negociação de preços e tem estoques. A Baosteel não recebeu licença ambiental no Espírito Santo e o projeto está em suspenso. A CSA adiou o início da produção. A Usiminas, que comprou por R$ 1 bi a usina J. Mendes, pensando em integrar a produção, está sem saber o que produzir, já que o mercado de minério de ferro está em redução. A Gerdau anunciou corte de produção. Grandes compradores de aço são a indústria automobilística, que está reduzindo produção, e a indústria imobiliária, que está cancelando lançamentos. A queda da demanda de um setor afeta outro, e vão se formando os círculos.

Há sinais das financiadoras de que, nos bens de consumo duráveis, as linhas branca e marrom ainda não estão com queda de vendas, porque o varejo tem feito promoções.

Um dos efeitos da crise é a redução da pressão inflacionária, que havia detonado o último ciclo de aperto monetário. Isso abre a possibilidade de queda da taxa de juros. Entre as várias vantagens que o Brasil tem em relação a outros países nesta crise está o enorme espaço que tem para redução de taxa de juros, liberação de compulsório e uso da política monetária para reduzir a contração na economia. Certamente, daqui para diante, é isso que o BC fará, assim que ocorrer a queda da taxa de inflação. Ela ainda está bem acima do centro da meta, que é 4,5%, mas ainda está na margem de flutuação.

A queda da produção industrial de outubro fez o Bradesco prever, ontem, que o PIB do último trimestre será negativo, se comparado ao trimestre anterior, “interrompendo uma seqüência de 12 trimestres de resultados positivos na margem”. Como foi dito ontem, aqui na coluna, outras consultorias já fizeram essa revisão, entre elas a MB Associados, que divulgou a previsão na segunda-feira. O Bradesco prevê que “o próximo movimento da taxa de juros será para baixo e já no primeiro quadrimestre de 2009”.

O Copom também foi surpreendido, como o mercado, pela forte queda da produção industrial de outubro, porque ele esperava uma “mera acomodação na margem” e o que houve foi queda forte e generalizada da produção industrial. Para novembro, a análise é de que a produção industrial continuará fraca e um indicador antecedente disso é a queda de 26% nos dados de emplacamento de veículos novos divulgados pela Fenabrave.

A crise na oferta de crédito, a queda da confiança do consumidor e o impacto nas empresas locais da crise internacional devem reduzir a demanda, e isso deve diminuir a pressão inflacionária, abrindo espaço para a queda da taxa de juros. Não se espera que ocorra já na reunião da semana que vem, mas deve ocorrer no começo do próximo ano.

Com Leonardo Zanelli

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